Economia

Renúncias fiscais: somente 40% dos benefícios de R$ 545 bi podem ser cortados neste ano

Governo Lula e Congresso discutem corte de benefícios tributários, mas debate esbarra em espaço limitado e trabalho de grupos de interesse

André Martins
André Martins

Repórter de Brasil e Economia

Publicado em 12 de julho de 2025 às 08h01.

A crise entre o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Congresso, agora latente após a tarifa anunciada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem como grande mote o corte de gastos.

De um lado, a gestão petista defende aumentar impostos para "o andar de cima", enquanto os parlamentares, liderados pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos), defende corte de gastos.

Nesse cabo de guerra com os parlamentares, que resultou na derrubada do decreto do IOF e perda de R$ 30 bilhões de arrecadação para 2025 e 2026 e dificuldades para discutir uma Medida Provisória (MP) que aumenta impostos, o governo busca soluções para o buraco fiscal — enquanto renúncias e benefícios fiscais chegam a 20% da arrecadação federal.

No total, o Brasil deixará de arrecadar R$ 545 bilhões em renúncias fiscais em 2025[/grifar], estima o economista-chefe e sócio da Ryo Asset, Gabriel Leal de Barros, em levantamento feito a pedido da EXAME.

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A título de comparação, esse percentual é mais do que o Brasil precisa investir em infraestrutura para destravar o desenvolvimento do país.

Essa rubrica representa impostos ou contribuições que o próprio governo federal e Congresso voluntariamente escolheram, ao longo dos anos e gestões, deixar de arrecadar.

Em 2023, por exemplo, esse valor era de R$ 456 bilhões.

Barros afirma o grande problema das renúncias fiscais não tem prazo para acabar, o que, na sua opinião, é pouco racional e sem sentido econômico.

RELEMBRE: Um velho novo debate fiscal: quanto dá para cortar dos R$ 450 bilhões de subsídios federais?

"A lista do que deveria ser cortado é grande, mas a carência de análise de custo e benefício agudiza a cegueira e falta de racionalidade", diz Barros.

O economista cita a ausência de limite para a dedução de saúde, o regime especial da Zona Franca de Manaus (ZFM), o largo limite de faturamento do Simples, a própria cesta básica como alguns dos benefícios que deveriam ser avaliados do ponto de vista econômico, mas interditados no debate político.

Algumas renúncias são vedadas de serem reduzidas, como:

  • a Zona Franca de Manaus,
  • o Simples,
  • as renúncias em prol de entidades sem fins lucrativos,
  • os fundos constitucionais regionais,
  • a renúncia da cesta básica
  • e bolsas de estudo.

Elas representam, segundo Barros, R$ 315 bilhões ou 58% de toda a renúncia fiscal. Ou seja, o universo disponível para uma redução via Projeto de Lei (PL) é de R$ 230 bilhões.

Além desse montante, existem os benefícios financeiros, que envolvem desembolsos diretos da União, totalizaram R$ 73,1 bilhões. Os benefícios creditícios, relacionados à alocação de recursos em fundos e programas, somaram R$ 61,1 bilhões.

Projeto em discussão

Em meio a esses números, a previsão da Câmara é votar um Projeto de Lei Complementar (PLP) que obriga o governo federal a reduzir gradualmente os benefícios tributários, financeiros e creditícios em, no mínimo, 10% até o fim de 2026.

A proposta prevê a diminuição dos benefícios em, no mínimo, 5% em 2025 e 5% em 2026. Os percentuais de redução poderão ser diferenciados por setor econômico, desde que o montante total alcance os percentuais mínimos estabelecidos.

O texto proíbe a concessão de novos benefícios federais de natureza tributária, financeira e creditícia, assim como a prorrogação dos já existentes.

A proposta teve a urgência aprovada na última semana. Haddad disse enviará ao Congresso o projeto do governo de cortes após o recesso parlamentar. A proposta, segundo Haddad, preservará os benefícios protegidos pela Constituição.

Segundo cálculos da Warren, um corte de 10% pode representar R$ 28 bilhões em arrecadação no próximo ano. O chefe da Fazenda afirmou na semana passada que o corte pode ser menor, com uma arrecadação estimada em R$ 15 bilhões.

Vespeiro

O corte de benefícios é visto como um "vespeiro", uma vez que fortes lobbies atuam no Congresso para manutenção dos benefícios.

Um exemplo foi a desoneração da folha de pagamento. A extensão até 2027 da desoneração que beneficia os 17 setores que mais empregam foi vetada pelo governo, que teve seu veto derrubado pelo Congresso.

O mecanismo garante aos setores alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% sobre a folha de salários.

O Executivo tentou, via medida provisória, barrar o benefício, mas as ações foram devolvidas pelos parlamentares após negociações.

A regra atual é que a reoneração ocorrerá de maneira gradativa até 2027 sobre a folha de pagamento. Não houve, como determina a legislação, a apresentação de uma compensação para a medida.

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