Agricultores protestam contra acordo entre UE e Mercosul, em Bruxelas: país da América do Sul oferecem preços mais competitivos (Dursun Aydemir/Anadolu Agency/Getty Images)
AFP
Publicado em 20 de janeiro de 2020 às 14h59.
Última atualização em 20 de janeiro de 2020 às 15h05.
São Paulo — O governo da região belga da Valônia, que bloqueou por dias em 2016 a assinatura pela União Europeia (UE) do acordo comercial com o Canadá, é "totalmente" contrário ao do Mercosul, afirmou seu presidente na segunda-feira.
"Somos totalmente contrários a esse tratado. Para o governo da Valônia, é não", disse à rádio RTBF na Bélgica, Elio Di Rupo, presidente do governo regional da Valônia e ex-primeiro-ministro belga entre 2011 e 2014.
O político teme as consequências do acordo sobre a agricultura da Valônia e também exige que os países do Mercosul (Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai) apliquem as mesmas regras sanitárias da UE.
A aprovação da Valônia, bem como de outras regiões da Bélgica, é necessária para que o governo belga dê seu aval à assinatura do acordo pelo Conselho da UE, que reúne os países do bloco.
Os negociadores da UE e do Mercosul chegaram a um acordo político em junho, após 20 anos de negociações comerciais, que devem passar por uma revisão legal antes da assinatura formal.
No final de 2016, em um momento semelhante ao atual com o Mercosul, somente a Valônia bloqueou a aprovação da Bélgica do acordo com o Canadá, causando uma crise diplomática vários dias antes da reversão.
O parlamento regional deve votar nos próximos dias uma resolução, debatida na segunda-feira em uma comissão parlamentar, que insta o governo da Valônia a "comunicar oficialmente ao governo federal sua oposição ao acordo".
O tratado terá "um impacto negativo no respeito às metas climáticas do Acordo de Paris, ao meio ambiente, à saúde e ao desenvolvimento de um modelo agroalimentar sustentável na Valônia", acrescenta o texto.
A Comissão Europeia prevê que a assinatura formal do texto possa ser realizada no final de 2020, antes de o Parlamento Europeu ratificá-lo, embora deva primeiro convencer outros países mais reticentes, como Áustria, França ou Irlanda.
O relator no Parlamento Europeu do acordo entre a União Europeia (UE) e o Mercosul, o deputado Jordi Cañas, pediu que o pacto seja retirado do "debate nacional", alertando sobre sua importância para o bloco diante de rivais globais como a China ou os Estados Unidos.
"Todo mundo deveria agir com responsabilidade e tirar o debate do Mercosul do debate nacional", disse Cañas à AFP, lamentando as declarações de políticos europeus "respeitáveis" que usaram "o acordo de forma irresponsável para questões nacionais".
O eurodeputado liberal espanhol Cañas pediu, assim, um debate "racional" e não "ideológico", como ocorreu em seu parecer no final de dezembro, quando o Parlamento discutiu a adaptação do acordo do Mercosul ao Pacto Verde da nova Comissão Europeia sob propostas dos ecologistas.
"Qual era o objetivo? Demonizar o Mercosul", disse à AFP Cañas, lamentando que o debate sobre o Pacto Verde se concentre apenas no acordo com os países da América do Sul e não no "modelo de negócios que a Europa está colocando sobre a mesa em suas negociações".
O eurodeputado confia na aprovação do acordo no Parlamento Europeu, embora considere "um pouco apertado" sua adoção no início de 2021. Ele se comprometeu a desmascarar as tentativas de usar o acordo de forma "ideológica".
"Se a Europa quer ser um ator global, se quer defender o crescimento sustentável, se quer defender o respeito ao meio ambiente, se quer garantir que os mercados continuem prosperando, precisa apostar e o Mercosul é uma aposta segura", afirmou.
Cañas alertou que a UE, que "baseia sua riqueza e prosperidade nas exportações", enfrenta "novos concorrentes globais em qualidade e produtos como a China ou os Estados Unidos". "A Europa precisa buscar mercados alternativos e maduros, e assim é o Mercosul", explicou.