Nova York (Michael Nagle/Bloomberg)
Bloomberg
Publicado em 3 de outubro de 2020 às 08h00.
A melhor fase da recuperação econômica global já passou e a retomada, que começou em alta velocidade, agora entra em um período difícil.
Esse é o alerta de economistas de Wall Street quando olham para os meses finais de um ano traumático. Cerca de US$ 20 trilhões de estímulo de governos e bancos centrais levaram as economias globais de volta aos níveis pré-pandemia. Mas, por vários motivos, o último trecho deve ser o mais difícil.
Autoridades podem reduzir o suporte fiscal que tem sido fundamental para a recuperação, como já aconteceu nos Estados Unidos. Cortes de empregos temporários podem se tornar permanentes, uma preocupação agravada nesta semana quando gigantes corporativos como Walt Disney e Royal Dutch Shell anunciaram a demissão de dezenas de milhares de trabalhadores. E o próprio coronavírus se espalha mais rápido e obriga governos a recorrerem novamente aos confinamentos com a chegada do clima mais frio.
“Estamos deixando a fase de recuperação das paralisações”, disse Ethan Harris, responsável por pesquisa econômica global do Bank of America, em entrevista à Bloomberg Television. “Agora estamos mais na fase de moer para a frente.”
Todos esses riscos deixaram investidores menos otimistas em relação às primeiras semanas da crise de coronavírus. O índice S&P 500 caiu em setembro após cinco ganhos mensais consecutivos, e o indicador Stoxx 600 da Europa também reduziu a alta.
A boa notícia é que a economia mundial se mostrou mais resistente à crise de saúde global do que muitos temiam, graças à rápida resposta das políticas. Governos subsidiaram a renda e ajudaram empresas a sobreviver, enquanto bancos centrais cortaram as taxas de juros e asseguraram liquidez a mercados financeiros sob pressão.
Uma medida de sucesso: o Deutsche Bank, que em maio alertava para uma queda de 5,9% do PIB global neste ano, agora avalia que a retração será de 3,9%.
Mas o resultado ainda representaria a crise mais profunda das últimas gerações. E não está claro quanto mais governos estão dispostos a emitir e gastar para completar a recuperação.
O estímulo fiscal acrescentou 3,7 pontos percentuais de crescimento ao PIB global neste ano, de acordo com o JPMorgan Chase. Mas economistas do banco acreditam que as autoridades irão repetir os erros cometidos após a crise financeira de 2008, com o retorno prematuro à austeridade. Com isso, o impulso deste ano se transformaria em um entrave fiscal de 2,4 pontos percentuais em 2021.
Nos EUA, economistas têm cortado previsões de crescimento para o quarto trimestre, porque temem que os esforços para aprovar outro projeto de lei de gastos do coronavírus emperrem no Congresso, embora um acordo ainda seja possível antes da eleição presidencial de novembro.
Na Europa, onde o coronavírus levou líderes a superarem profundas divergências sobre a combinação de seus recursos orçamentários, o fundo de recuperação histórico de 1,8 trilhão de euros (US$ 2,1 trilhões) - visto como fundamental para países em dificuldades como Itália e Espanha - agora enfrenta possíveis atrasos.
Outros fatores que reduzem a esperança de uma recuperação em forma de V são a propagação acelerada do vírus e a ausência de uma vacina. Governos estão relutantes em retomar o lockdown total, cientes do forte impacto que isso pode causar nas empresas. Mas muitas partes da Europa, incluindo o Reino Unido, impuseram algumas restrições.
No entanto, alguns países observam dados animadores sobre a pandemia, especialmente a China, onde a Covid surgiu. A segunda maior economia do mundo conseguiu controlar o vírus e avançar na recuperação em ritmo mais rápido do que a maioria de seus pares, mesmo com o início de estabilização mostrado por vários indicadores.
--Com a colaboração de Catherine Bosley.