Economia

Quem é Yanis Varoufakis, o grego que precisa dobrar a Europa

Sem gravata e com a língua solta, ministro das Finanças do novo governo de esquerda da Grécia roda a Europa em busca de uma solução para o impasse da dívida


	O ministro das Finanças da Grécia, Yanis Varoufakis
 (Kostas Tsironis/Reuters)

O ministro das Finanças da Grécia, Yanis Varoufakis (Kostas Tsironis/Reuters)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 4 de fevereiro de 2015 às 13h26.

São Paulo - "Não há nada que eu abomine mais, caro leitor, do que que encontrar pessoas que vão rejeitar o que eu digo antes que eu diga ou, igualmente, que vão acreditar no que eu digo antes que eu diga".

A frase está na biografia em primeira pessoa do blog oficial de Yanis Varoufakis, 53 anos, novo ministro de Finanças da Grécia que está em turnê intensa de negociação esta semana.

Ele não é qualquer ministro em qualquer governo. Seu partido de esquerda, o Syriza, chegou ao poder no final de janeiro com uma plataforma de rejeição da austeridade e dos termos embutidos nos pacotes de resgate que mantiveram o país solvente desde a crise de 2010.

As ideias do Syriza seduziram uma população grega exausta após anos de depressão econômica e desemprego acima de 25%, mas assustam boa parte do establishment europeu, que teme a ascensão de partidos similares em países como Espanha.

Negociações

No final da semana passada, Varoufakis disse que não iria negociar com a troica - o trio Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional, que já injetou US$ 275 bilhões em fundos de resgate desde 2010.

Os mercados gregos desabaram e ele mudou o tom, e é por isso que esta semana é tão crucial. A primeira missão de Varoufakis é com o BCE, onde precisa conseguir do presidente Mario Draghi uma extensão de curto prazo da assistência de liquidez para os bancos gregos.

Mas sua nova proposta central é pedir não mais um corte da dívida, como dizia, e sim um "menu de troca de títulos": dessa forma, títulos gregos detidos pelo BCE e governos nacionais se tornariam títulos indexados ao crescimento ou bônus perpétuos.

De 2006 até 2014, a relação entre dívida e PIB da Grécia foi de 103% para inacreditáveis 177%. Os termos do resgate da troica exigem cortes, reformas e um superávit primário de 4,5% do PIB por ano, que o Syriza quer cortar para 1,5% para financiar medidas como aumento do salário mínimo em 40%, readmissão de funcionários demitidos e luz grátis para os mais pobres.

Economistas como Thomas Piketty e Paul Krugman dizem que é impossível para a Grécia seguir pagando suas dívidas e ao mesmo tempo voltar a crescer nas condições atuais. As dívidas não tem como perder valor relativo no atual cenário de deflação, que o BCE tenta combater com uma injeção maciça de dinheiro na economia.

Alemanha e outros críticos dizem que rasgar o que já foi acordado seria dar carta branca para a Grécia voltar para a dinâmica que culminou na crise atual. Eles lembram que a Grécia já voltou a crescer e que os problemas do país só poderiam ser resolvidos com grandes reformas para retomar a competitividade.

Perfil

Varoufakis é ariano, tem 53 anos e é notado por dispensar o terno e gravata mesmo em encontros formais. Quando era jovem, começou a estudar economia e largou em poucas semanas, desiludido com o que considerou uma formação míope e limitada.

Acabou se formando em matemática e voltou para o campo econômico a partir da pós; eventualmente, passou a dar aula de teoria econômica na Universidade de Atenas e em outras ao redor do mundo. Desde 2012, esteve como professor visitante na Universidade de Austin, no Texas.

Ele já se definiu como um "marxista libertário" cuja atuação econômica no cenário contemporâneo equivale a de "um teólogo ateu em um monastério da Idade Média".

Seu foco acadêmico é em teoria dos jogos, a análise de negociações estratégicas em que o resultado da escolha de um ator dependem da ação do outro. Em outras palavras: o estudo de como estar sempre à frente do seu adversário para ganhar concessões, habilidade que vem a calhar para sua missão atual. 

Há quem diga que suas declarações mais incendiárias - como equiparar o resgate grego a técnicas de tortura - são uma forma deliberada de passar uma imagem radical. Dessa forma, ele estaria fortalecendo suas credenciais internas com os gregos ao mesmo tempo em que desestabiliza seus adversários europeus, ganhando margem para depois recuar.

Para Peter Doyle, ex-conselheiro econômico da divisão europeia do FMI, a tese não faz sentido: "seria como dizer que a política de Ronald Reagan era baseada em sua experiência anterior como ator", diz ele para EXAME.

No caso de Varoufakis, pode ser mesmo apenas franqueza. Quando o Syriza foi eleito, ele prometeu "continuar blogando apesar de ser considerado irresponsável para um ministro das Finanças se deleitar com formas de comunicação tão grosseiras." No seu site e no Twitter, onde tem 197 mil seguidores, ele continua clarificando suas opiniões e corrigindo o que vê como erros a seu respeito na mídia.

A Alemanha já sinalizou por meios tortos que uma saída da Grécia do euro hoje já não seria tão grave assim. Para Varoufakis, a situação pode ser ilustrada com um trecho da música "Hotel California", dos Eagles: "you can check out any time you like, but you can never leave" [você pode fazer check out a qualquer hora, mas você não pode nunca ir embora].

Acompanhe tudo sobre:AlemanhaBCECâmbioCrise gregaEuroEuropaGréciaMoedasPaíses ricosPiigsSyrizaTeoria econômicaZona do Euro

Mais de Economia

Lula se reúne hoje com Haddad para receber redação final do pacote de corte de gastos

Economia argentina cai 0,3% em setembro, quarto mês seguido de retração

Governo anuncia bloqueio orçamentário de R$ 6 bilhões para cumprir meta fiscal

Black Friday: é melhor comprar pessoalmente ou online?