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Da Redação
Publicado em 18 de março de 2010 às 14h02.
Os esforços que estão sendo feitos hoje nos Estados Unidos e na Europa para colocar um limite máximo na remuneração dos presidentes e principais executivos de grandes empresas, assunto que ressuscitou com muito barulho no meio da crise financeira mundial, seriam um belo exemplo de colocação de tranca em porta arrombada se não fossem dois pormenores básicos. O primeiro é que qualquer tranca a ser posta já virá com defeito de fábrica. O segundo é que não está claro, sequer, se existe mesmo uma porta para ser trancada. A conclusão é que vai se discutir um bocado, mas o espaço através do qual dezenas de bilhões de dólares saíram nos últimos anos das empresas, dos investidores e dos clientes rumo ao bolso dos dirigentes continuará largamente aberto. Eles ganharam quando as empresas sob o seu comando deram lucro. Continuaram ganhando depois que as empresas começaram a gerar prejuízos. Ganham, até mesmo, após a sua falência ou o seu resgate - e, nesse caso, com dinheiro público. Não faltam vontade nem idéias, por parte de legisladores e governos sob a pressão de eleitores indignados, em suas tentativas de corrigir a situação. Mas todos se vêem bloqueados, na hora das ações concretas, pela constatação de que é muito mais fácil criar um salário mínimo do que um salário máximo.
A calamidade gerada a partir de Wall Street colocou diante dos olhos do público uma oferta ilimitada de histórias de horror. Stanley O'Neal, presidente do Merrill Lynch, recebeu 160 milhões de dólares em outubro do ano passado, quando foi demitido da empresa - que acabaria sendo vendida em setembro de 2008, no auge da crise, por um preço 70% inferior ao que tinha no início de 2007. Joseph Cassano, diretor da sucursal da megasseguradora americana AIG em Londres, ganhou 280 milhões de dólares nos últimos oito anos, após ter deixado um prejuízo de 25 bilhões de dólares em sua operação; ao ser demitido, passou a ganhar 1 milhão de dólares por mês como "consultor" da AIG, salva com dinheiro do Erário americano no meio da tempestade. A folha de pagamentos dos executivos da empresa, nos últimos sete anos, somou 3,5 bilhões de dólares. Richard Fuld, presidente do defunto Lehman Brothers - que foi a pique na maior falência da história, com débitos de 600 bilhões de dólares -, levou para casa, entre salários, bônus e ações, 485 milhões entre o ano 2000 e setembro passado. Nessa ocasião, ao requerer o pedido de falência, o Lehman separou 2,5 bilhões de dólares como compensação para os seus 10 000 empregados em Nova York; dessa bolada, pelo sistema de eqüidade vigente no setor, quem ganhava mais recebeu mais.
Casos de remunerações alucinantes como essas não são uma anomalia isolada nem se limitam à área financeira ou aos Estados Unidos - viraram a regra. Fora os beneficiados, ninguém está gostando disso. Nem o secretário americano do Tesouro, Henry Paulson, que até assumir o cargo, em meados de 2006, estava do outro lado da mesa - ganhou quase 40 milhões de dólares em 2005, seu último ano como presidente do Goldman Sachs, e na venda das ações que tinha na empresa, obrigatória para entrar no governo, levou mais 500 milhões. "O povo americano entende que um bom desempenho seja recompensado com uma boa remuneração", diz Paulson. "Mas ninguém entende que se dê remuneração por um fracasso." Como muitos outros, o secretário quer mudar as coisas, mas as possibilidades de que consiga são limitadas. Todas as sugestões feitas até agora para colocar um teto nas remunerações extremas têm em comum o defeito de deixarem brechas que a criatividade dos executivos aproveita para manter os seus ganhos na estratosfera. Nem mesmo o modesto passo que se conseguiu dar até agora, restringindo os "bônus de saída" para executivos demitidos e aumentando os impostos para remunerações acima de 500 000 dólares anuais - e isso só nas empresas que receberam ajuda do governo americano -, parece capaz de gerar algum efeito prático. Espera-se que os bancos simplesmente aumentem os salários e, com isso, absorvam o imposto extra.
Há tentativas, na Justiça, de fazer com que alguns executivos devolvam parte das somas que receberam. É possível, também, que os conselhos de administração das empresas se sintam mais constrangidos, durante estes dias de ira, em aprovar pacotes salariais extravagantes para os seus gestores. Mas a aposta é que, tão logo termine o barulho atual, a remuneração no setor venha a ter uma nova explosão - afinal, será preciso compensar o momento tão difícil que todos estão vivendo hoje.