Economia

“Precisamos vacinar para reabrir economia”, diz CEO da BGC Liquidez

Para o presidente da corretora, Erminio Lucci, a sociedade civil e o governo federal finalmente perceberam que vacinar é melhor para a saúde e para a economia

Erminio Lucci, presidente do BGC Liquidez: "Chegamos a um nível de desgoverno e risco político que está não só afetando a crise sanitária mas também travando a pauta econômica" (BGC LIquidez/Divulgação)

Erminio Lucci, presidente do BGC Liquidez: "Chegamos a um nível de desgoverno e risco político que está não só afetando a crise sanitária mas também travando a pauta econômica" (BGC LIquidez/Divulgação)

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Carolina Ingizza

Publicado em 31 de março de 2021 às 13h10.

Última atualização em 31 de março de 2021 às 14h42.

Dois meses após começar a vacinação contra o coronavírus, o Brasil só imunizou cerca de 8% da população com a primeira dose da vacina. O ritmo lento da imunização se contrasta com a velocidade de disseminação da doença no país. Só na terça-feira, 30, o Ministério da Saúde informou que morreram 3.780 pessoas em 24 horas, o pior registro diário de mortes até então.

A crise sanitária descontrolada se reflete na economia. Para o presidente da corretora BGC Liquidez, Erminio Lucci, está claro que a falta de gestão da pandemia e coordenação entre os três níveis de governo (federal, estadual e municipal) travam a pauta econômica, os investimentos, os empregos e a imagem do Brasil no exterior.

Em entrevista à EXAME, o executivo disse que acredita que a única saída possível para o momento pelo qual o país passa é a vacina. "Ficou claro para a sociedade civil que é mais barato e lógico gastar dinheiro em vacinas do que com o auxílio emergencial", diz.

Enquanto o número de doses de vacina disponibilizadas não aumenta, Lucci é defensor das medidas de restrição de circulação de pessoas. "Se olharmos o exemplo de Araraquara, cidade do interior de São Paulo, o lockdown foi um instrumento efetivo para evitar o colapso da saúde", afirma o presidente da BGC.

Confira abaixo os principais trechos da entrevista:

Como o Brasil está lidando com a pandemia e a agenda econômica?

Observo com certo alívio a movimentação da sociedade civil organizada, da ponta mais alta do PIB — quem emprega, quem investe. Chegamos a um nível de desgoverno e risco político que está não só afetando a crise sanitária, mas também travando a pauta econômica, os investimentos, os empregos, a competitividade e a imagem do Brasil no exterior. As pessoas com bom senso sentaram-se com os líderes do Congresso e indicaram que alguma coisa precisava ser feita. O caminho é estancar a crise sanitária e mudar os rumos de para onde está caminhando a economia. Acho que demorou mais do que deveria, mas a sociedade se organizou e articulou, deixando a política de lado e se preocupando com a estabilização da crise. 

Como a gestão da pandemia se reflete na economia brasileira?

Os impactos dessa má gestão da crise da saúde se refletem nos preços dos ativos, do câmbio e dos juros. A parte fiscal e o desemprego não param de piorar. Ficou claro para a sociedade civil que é mais barato e lógico você gastar dinheiro em vacinas do que com auxílio emergencial. Além disso, com isso você evita uma piora fiscal, que demora mais tempo para se recuperar. Temos um primeiro semestre de PIB comprometido. Faltou capacidade do governo federal de entender que era mais fácil e racional em termos de vida e economia vacinar do que usar o fiscal para eventualmente ser o pilar de estabilidade da população. Enquanto na saúde vemos o número de mortes subir e o esgotamento da capacidade de atendimento, na parte econômica vemos uma exaustão fiscal, desemprego, baixo crescimento econômico e um cenário de estagflação. Estamos muito pior do que entramos na crise. 

Diante desse cenário econômico e sanitário, o que dá para ser feito?

Vacinar as pessoas para conseguir reabrir a economia, não prolongando por muito tempo o auxílio emergencial para não comprometer o fiscal. No caso dos Estados Unidos, por exemplo, que vai vacinar até maio 200 milhões de pessoas, o mercado aumentou em 2% a projeção de crescimento. Dado aos erros que já foram cometidos, vejo que o caminho é comprar o máximo possível de vacinas e de insumos para o Butantan e a Fiocruz.  O Congresso permitiu que os próprios estados comprem diretamente a vacina, o que deve ajudar. Estamos vendo também o desenvolvimento de testes de vacinas nacionais. Além disso, há uma pressão no legislativo para que se flexibilize a lei e permita que a iniciativa privada importe diretamente a vacina para imunizar sua força de trabalho sem ter que doar as doses para o SUS. 

O senhor defende a adoção de medidas de restrição de circulação de pessoas?

Hoje, na velocidade em que está a vacinação, o lockdown faz parte de uma estratégia para evitar um colapso total do sistema de saúde do Brasil. Se olharmos o exemplo de Araraquara, cidade do interior de São Paulo, o lockdown foi um instrumento efetivo para evitar o colapso da saúde. Não existe muita opção, entre salvar vidas ou empregos, é melhor salvar vidas. Os empregos podem ser recuperados no futuro, as vidas não. O desafio é que o brasileiro não entende e não gosta de cumprir regras, o que dificulta a implementação dessas medidas.

Como o senhor enxerga a recente alta da taxa Selic e os impactos na inflação e na atividade econômica?

Com as projeções de inflação na casa de 5% e 6% em 2021, o Banco Central precisava cumprir seu mandato e ajustar a Selic para tentar colocar a inflação dentro da meta. Acredito que a taxa deva continuar a subir, mas ainda dentro de níveis civilizados em comparação com nosso histórico, abaixo dos dois dígitos. Se o BC conseguir reancorar as expectativas de inflação em 2021 e 2022, os efeitos econômicos do ajuste não serão tão grandes. O efeito da expectativa inflacionária dentro da meta é mais benéfico que um possível efeito negativo na atividade econômica.

O que está claro é que no primeiro semestre o crescimento do PIB foi comprometido com a inflação e desemprego altos. Devemos ver ainda um pico na pandemia nas próximas duas a três semanas, mas nos próximos dois ou três meses, com pelo menos 30% da população vacinada, vamos começar a reabrir a economia e voltar a certa normalidade. O segundo semestre vai ser melhor, estamos passando pelo pior momento. O difícil é prever o quanto vamos crescer, isso depende da vacina, do estado da pandemia e da votação de reformas.

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