Economia

Por que o PIB do Brasil desacelerou no segundo trimestre?

Juros elevados e cenários político e internacional incertos freiam perspectivas para a economia do país

Fábrica de produtos de beleza: setor industrial teve leve alta, mas juros reduzem investimento e consumo (Leandro Fonseca/Exame)

Fábrica de produtos de beleza: setor industrial teve leve alta, mas juros reduzem investimento e consumo (Leandro Fonseca/Exame)

Rafael Balago
Rafael Balago

Repórter de macroeconomia

Publicado em 2 de setembro de 2025 às 12h26.

Última atualização em 2 de setembro de 2025 às 14h16.

Os dados do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil, divulgados nesta terça-feira, 2, mostram que o país está crescendo menos. A economia brasileira avançou 1,4% no primeiro trimestre, e de abril a junho cresceu 0,4% — em linha com as expectativas do mercado. 

“A gente sai daquele crescimento ao redor de 3% para um crescimento mais próximo de 2%”, diz Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados. “Investimento e consumo dão esse sinal mais forte de desaceleração agora, especialmente investimento. É um efeito de juros que está começando a aparecer.” 

A fala de Vale resume o diagnóstico do último dado da atividade econômica. O Banco Central fixou a taxa Selic, referência dos juros no país, em 15% ao ano, como estratégia para conter a inflação. Assim, o esfriamento da economia era um efeito esperado: com juros mais altos, fica mais difícil obter crédito para financiar o consumo e novos investimentos. 

Assim, a maioria dos analistas e entidades mantiveram suas previsões de crescimento anual para 2025. O Ministério da Fazenda espera alta de 2,5%. A Fiesp estima que o país cresça 2,4%, o Goldman Sachs, 2,3%, Santander, 2%, e o UBS, 1,9%. Em 2024, o Brasil cresceu 3,4%. 

Segundo semestre de esfriamento

Para Silvio Campos Neto, economista e sócio da Tendências Consultoria, o esfriamento se deve aos limites da economia brasileira e a problemas estruturais. 

“Após a saída da pandemia, o Brasil manteve um período de um crescimento acima até do esperado, do padrão dos anos anteriores", diz. "Ao mesmo tempo, havia diversas evidências de desequilíbrios que mostraram que esse ritmo de crescimento estava acima da nossa capacidade.”

Entre essas evidências, Campos Neto cita a inflação alta, o déficit externo, o mercado de trabalho apertado e a situação fiscal “insustentável”. A isso tudo, foi adicionado o aumento das taxas de juro, cujo objetivo é justamente esfriar o ritmo da economia, para trazer a inflação de volta à meta. 

Neste contexto, a expectativa é de um segundo semestre de baixa na economia.

"Para o terceiro trimestre, o ritmo de crescimento projetado para o PIB na margem é pouco inferior ao observado para o segundo trimestre", diz nota técnica do Ministério da Fazenda.

"Embora a desaceleração nas concessões de crédito venha se acentuando nos últimos meses, junto com o aumento nas taxas de juro bancárias e na inadimplência, o mercado de trabalho segue resiliente, podendo impulsionar a atividade junto ao pagamento dos precatórios e à recente expansão do crédito consignado ao trabalhador", afirma o comunicado.

No mercado, a visão é mais negativa.

“Reforçamos nosso cenário de baixo crescimento econômico ao longo do 2º semestre de 2025. O lado positivo inclui a resiliência do mercado de trabalho e o impulso fiscal do 3º trimestre de 2025, enquanto, do lado negativo, destacamos os efeitos contracionistas da política monetária e a deterioração das condições de crédito”, diz Gabriel Couto, economista do Santander.

“Mantemos a inalterada a estimativa para o crescimento do PIB em 2025 em 2,3% com crescimento praticamente nulo na segunda metade do ano”, diz uma análise do Banco Pine. 

Rafael Perez, economista da Suno Research, também avalia que a política monetária restritiva tende a impactar com mais força a atividade na segunda metade do ano. “O elevado endividamento das famílias, as incertezas fiscais e as turbulências externas podem adicionar riscos”, diz. 

Para ele, no entanto, a resiliência do mercado de trabalho e a expectativa de maior expansão dos gastos públicos no segundo semestre “devem suavizar um arrefecimento mais intenso da economia brasileira”.

O consumo das famílias teve alta menor, mas cresceu 0,5% no segundo trimestre, ante 1% no primeiro trimestre. “A combinação de taxa de desemprego em mínimas históricas, crescimento dos salários, avanço do mercado formal têm sido um pilar de sustentação para o consumo e mitigado os efeitos dos juros elevados”, diz Otávio Araújo, consultor sênior da Zero Markets Brasil

Para o Goldman Sachs, a atividade real da economia tende a se beneficiar das "transferências fiscais federais para famílias de baixa renda com alta propensão ao consumo, da expansão da renda real disponível do trabalho e da renda não trabalhista das famílias e dos novos programas de empréstimos com garantia da folha de pagamentos", segundo relatório do banco.

Há também expectativas de alento vindas do setor de serviços, que teve alta de 0,6% no trimestre. Perez avalia que a alta foi puxada pelas condições favoráveis do mercado de trabalho e da alta de demanda por serviços empresariais, como atividades financeiras, seguros e transporte.

“Por outro lado, segmentos mais dependentes do crédito, como o varejo [0,0%], já vêm mostrando perda de fôlego, sentindo os efeitos das taxas de juros elevadas”, diz o economista da Suno.

No agro, houve recuo de 0,1% frente ao trimestre anterior, mas os números seguem fortes. Houve alta de 10,1% na variação em relação ao segundo trimestre de 2025. 

Construção civil em São Paulo

Construção civil, em São Paulo: setor apresenta sinais de desaceleração nos últimos meses, segundo a Fiesp (Eduardo Frazão/Exame)

Baixa na indústria e investimentos 

O aperto no acesso ao crédito, afetado pela alta taxa de juros, colabora ainda para a redução do ritmo da construção civil e da indústria de transformação — e no limite para todos os setores que dependem de disponibilidade de capital. 

“A construção civil, mesmo sendo beneficiada pela ampliação de programas governamentais e pela diversificação de financiamento à infraestrutura pesada, vem apresentando sinais de desaceleração nos últimos meses”, diz análise da Fiesp.

A indústria cresceu 0,5% no segundo trimestre do ano, depois de ficar estagnada no começo do ano. A Fiesp aponta que a indústria sofre ainda com as consequências da piora do cenário externo, especialmente das tarifas impostas pelos Estados Unidos. “Estimamos potencial impacto negativo de 0,2 p.p. no PIB em 2025 decorrente do tarifaço”, afirma a entidade. 

O cenário incerto afeta ainda os investimentos.

A formação bruta de capital fixo recuou 2,2% no trimestre, destaca Perez, da Suno, um resultado que reflete os efeitos da política monetária restritiva. "As perspectivas de manutenção da Selic em 15% até o início do próximo ano, somadas a condições menos favoráveis para o crédito, devem continuar limitando os investimentos e dificultando a sustentação do crescimento do setor ao longo de 2025", diz.

“Neste cenário de incerteza que vem de Trump, dos juros e do cenário eleitoral conturbado no ano que vem, a primeira coisa que afetada é investimento”, diz Vale, da MB Associados.

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