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João Pedro Caleiro
Publicado em 21 de abril de 2018 às 08h00.
Última atualização em 21 de abril de 2018 às 08h00.
São Paulo - O Brasil é um dos países mais desiguais do planeta e suas contas públicas estão em situação calamitosa, com previsão de fechar o ano com déficit de R$ 136 bilhões.
Não seria o caso de regulamentar o imposto sobre as grandes fortunas, previsto pelo artigo 153, VII, da Constituição Federal de 1988?
A questão foi levantada no debate "A difícil reforma tributária: desafios políticos, conceituais e práticos", realizada na última quinta-feira (19) na Fundação Fernando Henrique Cardoso em São Paulo.
Bernard Appy, secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda de 2003 a 2009 e atual diretor do Centro de Cidadania Fiscal, é contra:
"Imposto sobre grandes fortunas não funciona, essa é a experiência mundial. Os donos das grandes fortunas vão tirar domicílio do Brasil e não vamos conseguir arrecadar", diz ele.
Appy diz que um imposto desse tipo só funcionaria em nível mundial; a ideia é defendida pelo economista francês Thomas Piketty, especialista em desigualdade, mas é de difícil execução.
"É um imposto completamente ineficiente", disse Everardo Maciel, sócio-presidente da Logos Consultoria Fiscal e secretário da Receita Federal por 8 anos no governo FHC.
Ele disse que o imposto sobre fortunas (ISF) da França foi apelidado de "imposto inglês" por ter estimulado a migração de fortunas para o país vizinho.
Outro caso famoso foi do ator francês Gérard Dépardieu, que se tornou cidadão belga e mais recentemente, russo para escapar do fisco.
"Os que não pagam mais o ISF também deixaram de pagar o Imposto de Renda na França, o que provoca um empobrecimento dos recursos fiscais e, por consequência, do país", afirma o atual primeiro-ministro, Édouard Philippe.
Ele estimou que 10 mil pessoas com 35 bilhões de euros em ativos tenham deixado o país nos últimos 15 anos.
A abrangência do imposto de fortunas foi reduzida drasticamente pelo governo de Emmanuel Macron em outubro do ano passado, cumprindo uma promessa de campanha.
Em fevereiro daquele ano, o ministro Levy disse que “a taxação estática de grandes fortunas não arrecada muito e não tem muita vantagem. O principal instrumento de tributação é a renda”.
Um estudo feito pelo Senado a pedido da senadora Gleisi Hoffman calculou o efeito de uma alíquota de 1,5% sobre 221 mil contribuintes (o 0,2% mais rico da população) que detinham em 2013 mais de US$ 1 milhão, segundo o Credit Suisse.
Com isso, chegaria-se a uma arrecadação de R$ 10 bilhões, que cairia para algo em torno de R$ 6 bilhões por causa de fatores como transferência de ativos para o exterior e imóveis declarados abaixo do mercado.
A título de comparação, o gasto previsto com o programa Bolsa Família em 2017 gira em torno dos R$ 30 bilhões.
Atualmente, está em consulta pública um projeto de lei da senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) para regulamentar o imposto sobre grandes fortunas.
Seriam três novas faixas de arrecadação, entre 0,5% e 1%, sobre patrimônios líquidos acima de 8 mil vezes a faixa de isenção do IR.
A tributação das fortunas foi defendida recentemente por Ciro Gomes, que disputa a Presidência da República pela terceira vez, e pela organização não governamental britânica Oxfam.
Uma coisa é certa: da forma como está, a estrutura do sistema tributário brasileiro, além de complexa, pesa mais sobre os pobres.
“Isto, por si só, é um indício de que a estrutura do sistema tributário nacional é regressiva, onerando relativamente mais as famílias das classes de renda mais baixas do que as famílias das classes de renda mais altas e, consequentemente, ferindo a função distributiva do Estado”, apontam os economistas.