Economia

Por que avanço da Ômicron preocupa Bancos Centrais

O aumento de casos de covid-19 está tendo impactos menos severos sobre os gastos e a criação de empregos

Máscara (Ricardo Wolffenbuttel/Governo de SC/Agência Brasil)

Máscara (Ricardo Wolffenbuttel/Governo de SC/Agência Brasil)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 19 de dezembro de 2021 às 10h35.

A variante Ômicron está avançando rapidamente pelo mundo, fechando fronteiras e gerando novas restrições à atividade econômica. No entanto, os bancos centrais, em vez de afrouxar a política monetária para sustentar suas economias, como fizeram no início da pandemia, estão agindo para diminuir os estímulos e aumentar as taxas de juros.

Na semana passada, o Federal Reserve, o Banco da Inglaterra e o Banco Central Europeu agiram para apertar a política monetária em resposta às preocupações com a inflação. O movimento reflete um novo pensamento entre os formuladores de políticas sobre os efeitos econômicos da pandemia: funcionários do Banco Central temem que, em vez de simplesmente ameaçar reduzir o crescimento econômico, um aumento nos casos da covid-19 também possa prolongar a alta inflação.

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Quando a pandemia se espalhou pela primeira vez, no início de 2020, os governos bloquearam suas economias. Os gastos do consumidor caíram drasticamente, os empregadores demitiram trabalhadores e os preços recuaram. Em poucos meses, o surgimento do comércio eletrônico e do trabalho remoto permitiu que a economia de muitos países desenvolvidos se recuperasse rapidamente.

Com as vacinações em massa, essa recuperação continuou este ano. Mas agora, o aumento de casos está tendo impactos menos severos sobre os gastos e a criação de empregos. Em vez disso, eles ameaçam prolongar as interrupções na cadeia de suprimentos e manter a inflação elevada.

"O que vimos nos estágios iniciais da pandemia é que a demanda inicialmente caiu muito mais do que a oferta, então acabou sendo deflacionária, especialmente por causa de lockdowns", disse o economista-chefe para a América do Norte da Capital Economics, Paul Ashworth.

Hoje, com os governos relutantes em impor novas medidas restritivas, é o contrário, disse. "A oferta pode ser mais atingida do que a demanda e, portanto, se torna inflacionária ao invés de deflacionária neste momento", destacou Ashworth.

Os cientistas ainda estão estudando os efeitos do Ômicron. Até agora, a cepa parece se espalhar mais rápido do que as variantes anteriores e é capaz de escapar da imunidade de vacinas e infecções anteriores, por outro lado pode causar sintomas mais leves.

Em coletiva à imprensa, nos dias 14 a 15 de dezembro, o presidente do Fed, Jerome Powell, disse que onda após onda, "as pessoas estão aprendendo a conviver com isso. Quanto mais pessoas forem vacinadas, menor será o efeito econômico."

Economistas e investidores esperam que a Ômicron tenha algum ajuste negativo sobre o crescimento, especialmente em relação à viagens internacionais. Economistas da Pantheon Macroeconomics reduziram a previsão de crescimento dos EUA de 5% para 3% no primeiro trimestre. Os analistas veem a maior parte desse declínio sendo compensada nos trimestres subsequentes.

Apesar da redução do impacto do vírus sobre o crescimento, sua influência sobre a pressão inflacionária parece ter mudado, de baixo para cima. A covid-19 fez com que os consumidores gastassem menos em serviços pessoais, como parques de diversões, e mais em bens duráveis, como eletrodomésticos e móveis.

Fábricas e portos fechados na China dificultaram a chegada das importações aos EUA. E o medo de adoecer impediu que as pessoas saíssem de casa, resultando em escassez de mão de obra e aumento dos salários. Cerca de 3,2 milhões de adultos disseram no início de setembro - quando a onda Delta estava no auge - que não estavam trabalhando por medo de adoecer, de acordo com dados do censo.

Na sexta-feira, economistas do Goldman Sachs aumentaram a previsão de núcleo de inflação de 3,25% para 3,4% em junho de 2022, com base na perspectiva de fechamento de fábricas em virtude do avanço da Ômicron na Ásia e aumento da inflação imobiliária.

Os preços ao consumidor nos EUA subiram 6,8% em novembro em relação ao ano anterior, o maior salto em quase quatro décadas. Em resposta, as autoridades do Fed disseram que provavelmente encerrariam seu programa de estímulo à compra de títulos em março de 2022 e planejaram aumentos de três quartos de ponto percentual nas taxas de juros até o final do próximo ano.

Funcionários do Federal Reserve estão preocupados que a nova variante do Ômicron possa exercer uma pressão ainda maior sobre a inflação. "Não sabemos se a Ômicron agravará a escassez de mão-de-obra e produtos e se aumentará a pressão inflacionária", disse o membro do Fed, Christopher Waller.

A mudança no pensamento das autoridades já está ocorrendo há alguns meses. Powell disse ao Congresso em novembro que os temores em torno da Ômicron "poderiam reduzir a disposição das pessoas de trabalhar presencialmente, o que retardaria o progresso no mercado de trabalho e intensificaria as interrupções na cadeia de suprimentos."

Se for esse o caso, isso poderia levar o Fed a aumentar as taxas mais rapidamente do que o previsto, disse o economista sênior da Nomura Securities, Robert Dent, que espera quatro aumentos nas taxas ao longo do próximo ano. "Eles sabem que este é um fenômeno inflacionário e a inflação já estava alta antes, então isso reforça essa tendência de ser hawkish", disse ele.

No Reino Unido, onde a cepa da covid-19 elevou os registros de infecções diários para níveis recordes, o governo do primeiro-ministro Boris Johnson introduziu regras que exigem prova de vacinação para a entrada em boates e em outros locais, embora essas restrições sejam mais brandas do que durante picos anteriores.

O Banco da Inglaterra, respondendo à inflação elevada, aumentou uma taxa básica de juros na semana passada pela primeira vez desde o início da pandemia. "A experiência desde março de 2020 sugere que ondas sucessivas de covid parecem ter tido menos impacto sobre o PIB, embora haja incertezas sobre até que ponto será o caso desta vez", disseram os legisladores.

O Banco da Inglaterra já havia presumido que o recuo das infecções por covid-19 aliviaria a pressão de alta sobre os preços dos bens, reequilibrando os gastos dos consumidores com serviços. Com novas medidas de distanciamento social, "este reequilíbrio era mais provável de ser adiado e, portanto, as pressões sobre os preços globais podem persistir por mais tempo" disse a ata da reunião do banco.

"A estratégia atual de zero covid da China pode levar a novas interrupções nas fábricas e portos chineses, além de afetar os custos de envio", acrescentou a ata. Contra isso, a demanda geral, em particular por serviços, pode desacelerar, disse a ata deixando o impacto líquido sobre a inflação incerto.

O Banco Central Europeu também acredita que a influência da variante será muito menos severo do que durante a primeira onda em 2020. Na quinta-feira anunciou o fim de um programa de compras de títulos - o Programa de Compra de Emergência Pandêmica - que pretendia compensar algumas das consequências econômicas negativas da pandemia.

A presidente do BCE, Christine Lagarde, disse que estava observando de perto como o avanço da Ômicron afetaria o fornecimento. "O equilíbrio entre o impacto inflacionário ou deflacionário ainda é totalmente incerto."

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