Economia

A maior economia da África ainda vive com a barbárie

Sequestro das estudantes coloca novamente a Nigéria no centro das atenções. Por que a maior economia da África ainda convive com tamanho atraso?

EXAME.com (EXAME.com)

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João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 22 de maio de 2014 às 11h32.

São Paulo - "Tragam de volta nossas garotas": a frase tem ecoado por todos os cantos da internet depois que mais de 200 estudantes foram sequestradas na Nigéria.

O grupo Boko Haram, responsável pelo ataque, defende a imposição da sharia (lei islâmica). A tradução do seu nome é, literalmente, "a educação ocidental é proibida".

A questão que fica é: como a maior economia de um continente ainda convive com episódios de barbárie dignos de tempos medievais?

Destaques

Até pouco tempo atrás, a Nigéria tinha oficialmente o segundo maior PIB da África. O problema é que o país ainda media sua economia com critérios de 1990, quando a recomendação é que eles sejam atualizados pelo menos a cada 5 anos.

Uma revisão metodológica mostrou que a economia do país era na verdade 89% maior e muito mais diversificada. Pelos critérios novos, o petróleo responde por 14% e não mais 33% do PIB.

Depois da agricultura, o maior empregador do país é a indústria de cinema. Os 1 milhão de funcionários de Nollywood, como foi apelidada, produzem 50 filmes por semana que geram uma receita de US$ 590 milhões por ano.

Em um país de 170 milhões de habitantes, há mais de 120 milhões de linhas de telefone celular ativas. A economia cresceu a uma média de 7% anuais na última década (e isso de acordo com a metodologia antiga).

O governo também conseguiu avanços institucionais importantes. Sua ministra de finanças atual é a superstar Ngozi Okonjo-Iweala, uma das pessoas mais influentes do mundo de acordo com a TIME. Ela chamou a atenção por sua estratégia de sucesso para cancelar parte da dívida externa do país e arquitetou a (impopular) tentativa de retirar os subsídios ao petróleo. 

Problemas

Como é o costume entre movimentos radicais, o Boko Haram se alimenta de divisões étnicas, pobreza, desemprego e desigualdade. O problema é que a economia nigeriana não conseguiu traduzir seu crescimento em melhor qualidade de vida.

Para começo de conversa, a Nigéria é o país mais rico da África mas é também o mais populoso. Isso significa que seu PIB pode até ser maior que o da África do Sul, mas sua renda per capita ainda é três vezes menor. 

Os setores que mais se destacam, como o de petróleo e de telecomunicações, são justamente aqueles que exigem muito capital, mas pouco trabalho.

A mesma população jovem que coloca o país entre os mais bem posicionados para o futuro tem de conviver com taxas de desemprego acima de 30%. Os avanços em educação e saúde têm sido lentos, mesmo na comparação com outros países africanos.

O resultado: em 2004, 52% dos nigerianos viviam com menos de um dólar por dia. Em 2010, o número pulou para 64%.

Geografia

A Nigéria também é um país dividido. No estado de Lagos, centro econômico do país, a taxa de pobreza caiu de 44% para 23% no mesmo período. Enquanto isso, ela chega a 80% no estado de Jigawa. 

Não é por acaso que o Boko Haram floresceu no norte, mais atrasado economicamente e negligenciado pelo governo - que ainda tira 80% das suas receitas da produção de petróleo, concentrada no sul.

O enriquecimento nigeriano foi acompanhado de um aumento da desigualdade. Em 1980, os 20% mais ricos do país controlavam 41% da riqueza do país, taxa que foi para 54% em 2010. 

A Nigéria também não continua imune à corrupção e à falta de transparência. Os mercados não reagiram bem quando em fevereiro, o presidente do país, Goodluck Jonathan, suspendeu o presidente do banco central, Lamido Sanusi. Seu crime: a audácia de apontar que US$ 20 bilhões haviam sumido do balanço da estatal do petróleo.

Com o sequestro das garotas, o país se vê novamente no centro das atenções. A reação do governo e o desfecho do episódio vão mostrar se o país está comprometido com o futuro ou se vai ficar só na promessa.

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