Economia

Por que a Argentina enfrenta uma constante crise da dívida

Crises econômicas são território já conhecido dos argentinos, de muito antes de Macri chegar ao poder

Buenos Aires: o presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández, assume o comando em 10 de dezembro e promete ressuscitar a economia (Erica Canepa/Bloomberg)

Buenos Aires: o presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández, assume o comando em 10 de dezembro e promete ressuscitar a economia (Erica Canepa/Bloomberg)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 24 de novembro de 2019 às 08h00.

Última atualização em 24 de novembro de 2019 às 09h00.

Julian Díaz estava prestes a expandir sua rede de restaurantes em Buenos Aires, com planos de abrir duas unidades além das três já apreciadas por comensais gourmet sob seu comando.

No entanto, uma recessão - mais uma - interrompeu seu projeto. O empresário de 37 anos teve de despedir funcionários e colocou seus planos na geladeira até o fim do ano.

“A parte mais difícil é não saber o que vem a seguir, não ser capaz de pensar em como você vai se desenvolver”, diz Díaz. “No nível comercial, atinge seus resultados. Mas, no nível pessoal, apenas dá náuseas.”

É um território já conhecido dos argentinos: crise econômica desencadeada por crescentes déficits e dívidas, além de instabilidade política com fortes oscilações entre governos de direita e de esquerda. Nesse clima, como Díaz afirma, é difícil prever o futuro - um motivo pelo qual o país tem uma baixa pontuação no índice de investimentos da Bloomberg como impulsionador do desenvolvimento.

O presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández, assume o comando em 10 de dezembro e promete ressuscitar a economia. Ainda assim, Fernández enfrenta demandas da extrema esquerda de sua ampla coalizão para aumentar os gastos sociais, enquanto investidores querem que o novo presidente priorize as negociações da dívida.

Há uma ampla preocupação no mercado de que Fernández e sua vice, a ex-presidente Cristina Kirchner, reverterão a postura pró-mercado de Macri.

A atual recessão começou no ano passado. Embora uma forte seca e baixas nos mercados emergentes tenham contribuído, a causa principal foi um déficit orçamentário que os investidores hesitaram em financiar, enquanto o governo do presidente Mauricio Macri perdia credibilidade.

A segunda maior economia da América do Sul deverá encolher pelo segundo ano em 2019 e também em 2020. A inflação está acima de 50%, e o peso a caminho de registrar o pior desempenho dos mercados emergentes pelo quarto ano consecutivo.

Os problemas econômicos da Argentina começaram muito antes de Macri chegar ao poder. Desde 1950, a Argentina passou 33% do período em recessão, só perdendo para a República Democrática do Congo, segundo o Banco Mundial.

Foi desenvolvido um ciclo no qual os líderes gastam mais do que o governo arrecada em receita tributária, forçando-os a emitir títulos de dívida que os investidores acabam vendendo. Esse efeito dominó geralmente termina com inflação alta, recessão e, às vezes, uma crise da dívida. Em 2001, a Argentina deixou de pagar US$ 95 bilhões em títulos soberanos, um recorde na época. Os mercados de títulos parecem esperar outra crise em breve.

Politicamente, o país oscilou entre governos pró-mercado e os mais populistas. Isso trouxe reversões de políticas que tornam muito difícil o investimento a longo prazo. As leis tributárias foram modificadas 80 vezes desde 1988, enquanto as regras fiscais foram alteradas 14 vezes. Houve 61 presidentes de bancos centrais nos 84 anos da instituição.

O resultado é uma economia que não corresponde ao país, com vastos recursos naturais e população com alto nível de escolaridade. Macri é apenas o mais recente líder a naufragar, depois de prometer resgatar a Argentina. Agora, Fernández enfrenta o mesmo assustador desafio.

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