Economia

Poder de compra das famílias melhora, mas riscos seguem no radar

OPINIÃO| O ambiente econômico atual é fator positivo para ampliar o poder de comprar e favorece o maior dinamismo observado do consumo das famílias

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Isabela Tavares

Analista da Tendências Consultoria

Publicado em 30 de julho de 2024 às 13h28.

Última atualização em 30 de julho de 2024 às 13h43.

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O poder de compra das famílias tem exibido trajetória de crescimento em função do cenário de melhora da situação financeira das famílias e do mercado de trabalho aquecido. O ambiente econômico atual, marcado por maior qualidade na carteira do crédito, menores riscos de inadimplência, redução dos juros bancários e crescimento da massa de renda, é fator positivo para ampliar o poder de comprar e favorece o maior dinamismo observado do consumo das famílias. No entanto, fatores de riscos seguem no radar e limitam a aceleração do poder de compra no curto prazo, considerando a) inflação de alimentos pressionada e b) as incertezas do cenário doméstico.

De janeiro a maio de 2024, o Índice de Poder de Compra (IPC) da Tendências mostrou crescimento de 10,9% na variação anual em termos reais. Esse aumento ocorreu devido ao crescimento de 10,5% das concessões de crédito a pessoas físicas e ao aumento de 6,8% da massa de renda ampliada disponível, ambos na variação anual real. Por outro lado, o movimento mais positivo do índice foi contido pelo aumento nos preços de alimentos, que ocorre desde o último trimestre do ano passado e reduz a renda disponível das famílias, limitando o poder de compra. Em termos dessazonalizados, o IPC cresce, em média, 0,7% a.m. entre janeiro e maio deste ano, contra a média de 0,6% a.m. em 2023.

Neste ano, as condições financeiras para o crédito a pessoas físicas (PF) exibem níveis mais atrativos em comparação com 2023 e melhoram a situação financeira das pessoas. Esse cenário também atua positivamente para aliviar o risco de crédito ao sistema financeiro e possibilitar a ampliação da oferta em modalidades de melhor qualidade.

O comprometimento de renda, indicador que avalia o peso do serviço financeiro em relação à massa de rendimentos, atingiu 24,4% em maio, patamar 1,6 p.p. abaixo do mesmo período do ano passado e o menor nível desde junho de 2022. O recuo recente do comprometimento ocorre em função dos avanços da massa de rendimentos das famílias, da melhora na qualidade da carteira de crédito e da redução dos juros bancários a PF.

Em maio deste ano, os juros a PF atingiram 32,4% a.a., patamar 5,6 p.p. abaixo do de maio de 2023. Apesar das pressões recentes nos juros de mercado, que levam ao aumento do custo de captação dos bancos, os spreads bancários continuam em redução e ajudam no movimento de menores níveis dos juros aos tomadores finais.

O menor risco de crédito ao sistema financeiro é um dos principais fatores para a redução dos spreads. Segundo relatório de economia bancária do Banco Central, a inadimplência pesou, em 2023, 35,7% do spread bancário praticado pelos bancos. Dessa forma, as ações do sistema financeiro junto com o Banco Central e o governo, no sentido de ampliar a renegociação de dívidas, foram importantes para começar a reduzir a inadimplência e trazer alívio na provisão dos bancos, beneficiando os spreads.

Em maio, a inadimplência PF alcançou 3,7%, patamar 0,5 p.p. abaixo do de mai/23. Além das próprias dívidas em atrasos, os bancos avaliam o indicador de ativos problemáticos, incluindo a carteira de crédito classificada com maior risco ao sistema. Neste ano, os ativos problemáticos também mostram redução, atingindo 7,1% em maio, após 7,7% em maio de 2023.

A própria melhora na qualidade da carteira de crédito é favorável ao ambiente de menores riscos ao sistema e redução dos spreads. A participação da modalidade de cartão de crédito rotativo no saldo total da carteira PF passou de 4,0% em 2023 para 3,1% em 2024. Nesse mesmo sentido, houve ganhos em modalidades menos arriscadas, como aquisição de bens, cuja participação passou de 16,0% em 2023 para 16,7% nos cinco primeiros meses de 2023.

Para o restante de 2024, o cenário segue positivo ao crescimento do poder de compra das famílias. Para o ano, estima-se alta real de 8,0%, após crescer 5,8% em 2023. As condições financeiras devem mostrar novas reduções no decorrer do 2º semestre, acompanhando o mercado de trabalho aquecido, o que incentiva a quitação de dívidas e maiores avanços em modalidades de crédito de melhor qualidade, fatores que beneficiam a redução dos juros.

Para o mercado de trabalho, ainda que a perspectiva seja de desaceleração do aumento de vagas, os níveis devem seguir elevados e sem gerar pressões na taxa de desemprego. A renda real do trabalho também deve subir e aumentar a massa de renda das pessoas.

Para 2025, no entanto, o cenário é de menor ritmo de crescimento do poder de compra, com estimativa de alta real de 4,3%. A desaceleração da atividade econômica esperada deve manter o menor crescimento do mercado de trabalho que, por sua vez, deve levar ao ligeiro aumento do comprometimento de renda das famílias com dívidas bancárias. De toda forma, a expectativa é de que as condições financeiras apresentem redução gradual, beneficiando-se de uma hipotética retomada de queda da Selic, ainda que as elevadas incertezas com o cenário fiscal e com as decisões de política econômica permaneçam como fonte de preocupação, diante dos potenciais efeitos sobre a taxa de câmbio e a confiança dos agentes.

Isabela Tavares é economista da Tendências Consultoria.

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