Economia

Paulo Guedes está perto de deixar o governo — mas isso importa?

Ministro da Economia pode ser substituído pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, segundo o UOL. A Exame analisou a mudança

Paulo Guedes: Bolsonaro ficou insatisfeito com o debate público sobre o teto de gastos (Andre Borges/Bloomberg/Getty Images)

Paulo Guedes: Bolsonaro ficou insatisfeito com o debate público sobre o teto de gastos (Andre Borges/Bloomberg/Getty Images)

LA

Lucas Amorim

Publicado em 16 de agosto de 2020 às 13h40.

Última atualização em 17 de agosto de 2020 às 18h25.

A saída dos secretários especiais Salim Mattar e Paulo Uebel, há 6 dias, intensificou um antigo debate dentro do governo e na opinião pública: o ministro da Economia, Paulo Guedes, também estaria de saída?

O próprio Guedes vem deixando transparecer sua insatisfação com o que tem chamado de "os fura-teto" do governo. São pessoas próximas ao presidente Jair Bolsonaro que têm defendido cada vez mais abertamente que o governo fure o teto de gastos não só durante a pandemia do coronavírus, mas também em 2021. A lógica é lançar um grande pacote de infraestrutura e ainda manter algo do auxílio emergencial de 600 reais lançado durante a pandemia.

Guedes é abertamente contra as medidas, e tem aliados de peso neste debate, como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O ministro chegou a dizer que, caso Bolsonaro insistisse em ampliar os gastos, corria risco de impeachment, assim como a ex-presidente, Dilma Rousseff. Mas numa live transmitida na quinta-feira Bolsonaro admitiu que há o debate sobre furar o teto no governo, e ainda disse que não vê problema nisso.

Neste domingo, o colunista Josias de Souza, do UOL, afirmou que o relacionamento entre Guedes e Bolsonaro "trincou". "O presidente não perdoa o titular da pasta da Economia ter jogado no ventilador o debate interno sobre gastos públicos", afirma o colunista. Bolsonaro ainda teria se irritado com o uso do termo "impeachment" e "já não exclui a hipótese de substituir Guedes".

O que dá impulso para a possível mudança é a crescente popularidade de Bolsonaro. Segundo pesquisa DataFolha divulgada na sexta-feira, 37% dos brasileiros consideram o desempenho do presidente como "ótimo ou bom", ante 32% de junho. Ontem, outro recorte da pesquisa mostrou que 47% dos brasileiros acreditam que o presidente não tem culpa pelas mais de 100.000 mortes por coronavírus no país.

O maior aumento de popularidade vem do Norte e Nordeste, regiões que mais receberam auxílio emergencial do governo. Bolsonaro deve intensificar a agenda de viagens às regiões, segundo Josias de Souza. Nesta semana ele deve ir ao Rio Grande do Norte junto com Rogério Marinho, ministro do Desenvolvimento Regional, possível candidato ao governo do estado e um dos líderes dos "fura teto".

A popularidade recorde do governo mesmo depois de saídas na equipe econômica e da demissão de Sergio Moro da Justiça, segundo analistas, dá força para Bolsonaro levar adiante a possível demissão de Guedes. Segundo um analista político ouvido pela Exame, Guedes é carta fora do baralho. "Estão apenas procurando uma saída honrosa. Se é que existe uma", afirmou.

Ainda segundo Josias de Souza, o nome do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, é um dos mais cotados para substituir Guedes.

"A saída de Guedes deixou de ser tabu no governo porque ele viu como pode conseguir popularidade sem o ministro da Economia", diz Arthur Mota, economista da Exame Research. "Ainda acho que o mercado não reagiria bem com a saída dele. Em termos de sinalização é péssimo porque o discurso dele (mesmo com pouca efetividade prática em 18 meses) está muito alinhado com o que esperamos".

Uma dúvida, segundo Mota, é se um substituto de Guedes teria mais sucesso que o "posto Ipiranga" na apresentação e aprovação de reformas. Campos Neto ou qualquer outro que topasse a vaga passaria um sinal de topar o crescente alinhamento do governo com o Centrão e uma política mais permissiva ao aumento de gastos.

"O Guedes simboliza a seriedade fiscal. Mas é um sujeito difícil. Em uma situação normal, tirar ele para por o Campos Neto seria positivo. O problema é que sabemos que Bolsonaro está gostando de gastar dinheiro. Neste sentido, a substituição pode gerar marola", afirma Celso Toledo, economista da LCA Consultores.

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, afirma que a tendência parece de fato ser a de saída do ministro da Economia. "Pode ser que o Campos consiga ser mais construtivo com o Congresso. Mas continuará a pressão em cima de quem vier sobre o teto e como acomodar os desejos dos militares, centrão e do próprio Bolsonaro, que só pensa em reeleição".

Para os investidores, a possibilidade de troca na Economia deve ser um dos temas da próxima semana. Henrique Bredda, gestor do Alaska e um dos mais influentes gestores nas redes sociais, escreveu no Twitter que "quando Guedes sair, a chance é de queda brusca na bolsa, disparada no dólar e gritaria". "Mas depois vão descobrir que a Magalu continua vendendo e a Rumo transportando soja".

A impressão de que o Brasil seguirá o mesmo, com os mesmos problemas e as mesmas oportunidades, com ou sem o poderoso ministro da Economia, nunca foi tão forte. Enquanto a popularidade de Bolsonaro cresce, o Ibovespa, vale lembrar, andou de lado nos últimos 30 dias: fechou a sexta-feira em 101.353 pontos.

Acompanhe tudo sobre:IbovespaImpeachmentJair BolsonaroPaulo Guedes

Mais de Economia

Presidente do Banco Central: fim da jornada 6x1 prejudica trabalhador e aumenta informalidade

Ministro do Trabalho defende fim da jornada 6x1 e diz que governo 'tem simpatia' pela proposta

Queda estrutural de juros depende de ‘choques positivos’ na política fiscal, afirma Campos Neto

Redução da jornada de trabalho para 4x3 pode custar R$ 115 bilhões ao ano à indústria, diz estudo