Lula: viés pessimista da Faria Lima, e contrário ao atual governo do PT, dizem essas fontes, também tem se traduzido em expectativas de inflação desancoradas para 2025, 2026 e 2027 (Leandro Fonseca/Exame)
Repórter especial de Macroeconomia
Publicado em 26 de novembro de 2024 às 16h45.
Última atualização em 26 de novembro de 2024 às 16h47.
Investidores estrangeiros que visitaram o Brasil nas últimas semanas se surpreenderam com o que classificaram como viés pessimista de agentes do mercado nacional que tem se traduzido em um mau humor e afetado negativamente os preços dos ativos.
Executivos de bancos, corretoras e hedge funds ouvidos pela EXAME têm se impressionado com a cotação do dólar — próxima a R$ 6,00 —, os juros futuros com a curva empinada e o mercado acionário andando de lado. Para eles, esse cenário não se comunica com o crescimento da economia e com os esforços do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em preparar um pacote de corte de gastos – amplamente defendido pelo mercado.
A avaliação majoritária ouvida pelos estrangeiros nas reuniões com brasileiros é de que um pacote de corte de gastos de R$ 70 bilhões já está precificado e não será suficiente para conter a trajetória de alta da dívida pública.
Com isso, as perspectivas para a economia brasileira, segundo os relatos colhidos pelos investidores de outros países, seriam ruins em 2025 e 2026. Uma mudança de humor só ocorreria em 2027, caso um candidato de oposição derrote o presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas próximas eleições.
O barulho local, afirmaram os estrangeiros, não se justifica diante das condições postas no mundo e da comparação com os demais mercados emergentes.
O Brasil, segundo investidores de outros países, tem estabilidade institucional e um sistema de freios e contrapesos que se provou eficiente. Além disso, tem relações diplomáticas com todos os países, um mercado consumidor representativo, dívida pública em moeda local e reservas internacionais robustas de mais de US$ 370 bilhões.
O único ponto de atenção, segundo os investidores, está no risco fiscal que está em debate pelo governo, pelo mercado e pela sociedade. “A surpresa é que um governo de esquerda pode fazer um ajuste de benefícios sociais. Nem os governos ditos liberais conseguiram essa proeza”, diz reservadamente um investidor baseado em Londres.
O viés pessimista da Faria Lima, e contrário ao atual governo do PT, dizem essas fontes, também tem se traduzido em expectativas de inflação desancoradas para 2025, 2026 e 2027. A avaliação generalizada ouvida pelos estrangeiros foi a de que o diretor de Política Monetária e futuro presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, não subirá os juros para reancorar as estimativas para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
“O local [investidor brasileiro] está pessimista pelo viés antipetista. E também tem a percepção incorreta de que Galípolo não fará o que tem que ser feito”, resume um investidor baseado em Nova York com negócios em mercados emergentes.
Esse mau humor predominante dos brasileiros só seria balanceado com um fluxo constante de dólares para o Brasil, afirmaram alguns executivos. Ou seja, se houvesse aumento dos investimentos estrangeiros no mercado nacional. Essa realidade depende, porém, de o país atingir o grau de investimento pelas agências de classificação de risco.
“O Brasil precisa desse dinheiro duradouro que depende do grau de investimentos e forma preços. O ‘humor’ do mercado brasileiro tem sido formado pelo local”, diz.
Nesse contexto de expectativas desancoradas, mau humor dos agentes econômicos locais e riscos fiscais, o mercado passou a projetar juros maiores e por mais tempo no Brasil. O Focus, do BC, já projeta que a Selic chegará a 13% em maio de 2025. Para chegar nesse percentual, o juro base terá que aumentar 1,75 ponto percentual nos próximos 6 meses.
E a esperada queda de juros seria menor do que a estimativa inicial. A mediana das expectativas para a Selic no fim de 2025 subiu de 12% para 12,25% do boletim divulgado na última segunda-feira, 25.
No fim das contas, esse mau humor pode mudar caso o governo apresente para o Congresso Nacional um pacote de corte de gastos que sinalize de forma contundente que a trajetória de crescimento da dívida pública será estabilizada. Além disso, será necessário convencer deputados e senadores a aprovar as propostas. Os legisladores têm papel central nesse debate.
Um pacote de corte de gastos crível e representativo pode ser o início de um ciclo virtuoso para a economia brasileira, que recebeu outlook positivo das agências de classificação de risco neste ano. Na prática, essa é uma das etapas necessárias para o Brasil voltar a receber o selo de bom pagador e atrair fluxos constantes de capital estrangeiro e fomentar um crescimento sustentado e sustentável nos próximos anos.