Economia

Para economistas, declaração de Lula cria ruído com mercado

Ex-presidente disse em entrevista que prioriza trabalho ao invés de inflação baixa; para economistas, declaração destaca o dilema errado


	O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva falou sobre inflação com o jornal italiano La Republicca
 (Ricardo Stuckert/Instituto Lula)

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva falou sobre inflação com o jornal italiano La Republicca (Ricardo Stuckert/Instituto Lula)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 10 de março de 2014 às 18h42.

São Paulo - Em entrevista ao jornal italiano La Republicca publicada neste domingo, Lula disse que "a defesa do trabalho é mais importante que a inflação".

A declaração foi em reação a uma pergunta sobre a fragilidade econômica brasileira e ecoa outros discursos do ex-presidente.

No mês passado, ele já havia dito que os críticos do governo "querem o aumento do desemprego para baixar a inflação."

Para Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, a declaração é infeliz e mostra desconhecimento dos problemas que uma inflação alta pode gerar: "forçar emprego elevado com o tempo vai apenas acelerando ainda mais a inflação, algo mais do que demonstrado em economia e que vem lá dos anos 70."

No ano passado, foi Dilma quem levantou o assunto ao afirmar que “as vozes de sempre” queriam atitudes de combate à inflação que implicavam a redução do crescimento, mas que esse era “um receituário que quer matar o doente em vez de curar a doença”.

Depois, a presidente disse que teve sua fala manipulada por agentes do mercado e que "o combate à inflação é um valor em si mesmo e permanente" do governo.

Dilemas

Tony Volpon, chefe de pesquisa de mercados emergentes para as Américas do banco japonês Nomura, acredita que Lula evoca um falso dilema: "Acho que nosso ex-presidente está errado: no longo prazo, não há como defender que há uma troca entre inflação e emprego. Há uma discussão se há uma possível troca no curto prazo, mas a experiência brasileira recente mostra que não: temos hoje menos crescimento e mais inflação."

Apesar do crescimento fraco, a taxa de desemprego continua baixa, um fenômeno que pode estar relacionado com a menor procura por trabalho.


"A questão do emprego é mais complexa. Tivemos queda na oferta ao mesmo tempo que tivemos uma queda na demanda, como mostram os dados do IBGE. As razões são muitas, inclusive demográficas e comportamentais, mas nada disso tem a ver com uma suposta “troca” contra a inflação", diz Volpon.

André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, nota que esse tipo de declaração adiciona ruídos na comunicação do governo e sinaliza que a inflação vai continuar alta por períodos mais longos, o que torna o trabalho do Banco Central mais complexo.

Para ele, o perfil do crescimento brasileiro atual faz com que hoje o dilema seja outro:

"Em alguma medida, o que o ex-presidente Lula aponta são as contradições do momento. Ele tem razão no sentido de que é a ascensão das classes C e D que bate na nossa inflação: se você olhar para o IPCA, o quinto maior peso é o custo do empregado doméstico. O que o governo precisa fazer é dar sinais ao mercado para mostrar que esse processo de crescimento da renda pode se traduzir em mais investimento e não em mais inflação".

Nos últimos 12 meses até janeiro, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) ficou em 5,59% - acima do centro (4,5%) e abaixo do teto (6,5%) da meta. 

O último Boletim Focus divulgado hoje prevê que a inflação vai fechar 2014 em 6,01%. Economistas esperam que a Copa traga um choque de preços no meio do ano. Na próxima quarta-feira, o IBGE divulga os números referentes ao mês de fevereiro.

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