Campos Neto: presidente do BC falou durante evento em Brasília (Raphael Ribeiro/ BCB/Flickr)
Estadão Conteúdo
Publicado em 5 de setembro de 2019 às 15h26.
Última atualização em 5 de setembro de 2019 às 15h59.
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou nesta quinta-feira, 5, que o crescimento da economia brasileira está "abaixo do que gostaríamos". "Estamos passando pelo pior momento. Vamos começar a crescer no segundo semestre, mais provavelmente no quarto trimestre", comentou, durante evento em Brasília.
Campos Neto disse ainda que tem ocorrido um movimento de revisão para baixo, do crescimento das principais economias do mundo. "As curvas de juros estão precificando queda de juros em todas as economias e isso tem se acentuado nas últimas semanas", comentou.
Sobre a inflação, ele reafirmou que, no Brasil, ela está sob controle, "bastante ancorada no curto, no médio e no longo prazo". Ele lembrou que, no meio deste ano, o Conselho Monetário Nacional (CMN) anunciou sua meta de inflação para o ano de 2022, de 3,5%, com margem de tolerância de 1,5 ponto porcentual.
Segundo Campos Neto, as estimativas do mercado financeiro demoraram apenas uma semana para convergir para esta meta, o que demonstra confiança no trabalho do BC.
Ao falar sobre a política monetária, Campos Neto repetiu ideia contida em comunicações recentes do BC: a de que a instituição deixou espaço para uma queda adicional da Selic (a taxa básica de juros), atualmente em 6,00% ao ano.
Em sua apresentação, ao tratar rapidamente do mercado de câmbio, Campos Neto também pontuou que a estratégia atual gira em torno de quanto o BC possui de posição cambial líquida.
Nas últimas semanas, em meio aos leilões de venda à vista de dólares ao mercado, o BC tem reafirmado que as operações não afetam a posição cambial líquida, apesar de alterar o nível das reservas internacionais.
Na quarta-feira, dados divulgados pelo BC mostraram que a posição cambial líquida da instituição atingiu US$ 329,951 bilhões. Esta posição traduz o que está disponível para que o BC faça frente a alguma necessidade de moeda estrangeira - como fornecer liquidez ao mercado em momentos de crise, por exemplo.
A posição leva em conta as reservas internacionais, o estoque de operações de linha do BC (venda de dólares com compromisso de recompra), a posição da instituição em swap cambial e os Direitos Especiais de Saque (DES) do Brasil no Fundo Monetário Internacional (FMI).
O presidente do Banco Central afirmou também que a finalidade do projeto de simplificação cambial, a ser apresentado pelo governo é permitir que o real seja uma moeda conversível. Segundo ele, o projeto de simplificação cambial está pronto e deve ser votado "em breve".
De acordo com Campos Neto, o projeto tratará de três vertentes principais para o câmbio: modernização, simplificação e segurança jurídica.
Campos Neto também tratou do projeto de autonomia do Banco Central, uma das bandeiras mais antigas da instituição. "Espero que projeto seja votado nas próximas semanas", afirmou. "Já temos projeto de autonomia pronto. Ele deve avançar em breve", acrescentou.
Campos Neto que o mercado de crédito brasileiro passou por um "choque grande" nos anos anteriores e que a recuperação está ocorrendo agora. "A ideia sempre foi reinventar o setor privado", disse.
Ele citou, em diversos momentos, a importância do crédito privado como substituto do crédito anteriormente fornecido por instituições estatais. "Queremos a troca do crédito público pelo privado", afirmou.
Campos Neto afirmou ainda que a instituição não está contente com a queda do custo de crédito ao consumidor final, na comparação com a baixa mais recente da Selic (a taxa básica de juros), atualmente em 6,00% ao ano.
Segundo ele, porém, o spread - diferença entre o custo de captação dos bancos e o que é efetivamente cobrado do cliente final - é mais alto no Brasil em função da baixa recuperação de crédito e do tempo maior de recuperação.
Ao tratar de modalidades específicas de crédito, Campos Neto reafirmou a importância do crédito imobiliário e do crédito voltado para a infraestrutura. No primeiro caso, ele lembrou lançamento recente feito pela Caixa Econômica Federal, de linha de crédito imobiliário indexada ao IPCA (o índice oficial de inflação).
De acordo com Campos Neto, a indexação ao IPCA - e não à TR - vai favorecer a securitização. "O mercado no Brasil é pouco securitizado. Criamos instrumentos, indexadores, mais fácies de serem securitizados. Queremos criar mecanismo para mercado poder securitizar", disse.
Em relação à infraestrutura, Campos Neto afirmou que o BC desenhou algumas medidas para que a oferta aumente. Uma delas é o mecanismo de proteção cambial, cujo projeto, conforme Campos Neto, está pronto.
Campos Neto pontuou ainda, em sua apresentação, que a educação financeira é a chave para combater alguns dos problemas na área de crédito. Segundo ele, uma das ideias discutidas é o lançamento de uma espécie de "programa de milhagem", em que pessoas que fizerem cursos de educação financeira ganharão descontos em produtos financeiros. Ele não deu, porém, mais detalhes sobre a iniciativa.
O presidente do Banco Central afirmou também que o Brasil tem atualmente um "volume de compulsório alto, em torno de R$ 400 bilhões". Segundo ele, a Assistência Financeira de Liquidez (AFL), que prevê a criação de duas novas linhas de crédito para as instituições financeiras, permitirá "reduzir bastante" os compulsórios.
Anunciadas no início de julho, estas linhas terão como garantia títulos e valores mobiliários emitidos por entidades privadas - e não apenas títulos públicos, como ocorre hoje nas operações de redesconto feitas pelo BC com os bancos.
De acordo com Campos Neto, existe atualmente um "estigma" no mercado bancário em relação ao uso do redesconto. Com as novas linhas, a intenção do BC é aumentar as possibilidades de acesso à liquidez pelos bancos.
No encerramento de sua apresentação, ele pontuou: "Estamos em um processo de se reinventar com o dinheiro privado."
O presidente do Banco Central participou na manhã desta quinta da conferência "Agenda do Brasil para Crescimento Econômico e Desenvolvimento", promovida pelo Council of the Americas (COA).
Após o evento desta quinta, Campos Neto foi instado por jornalistas a falar especificamente sobre o câmbio, mas o presidente do BC saiu sem dar entrevista.