Economia

Ficou algo de Roberto Campos, homem forte da economia em 64?

Economista e político ajudou a criar o plano que estabilizou a economia brasileira depois do golpe. 50 anos depois, o que ficou das suas ideias?


	Roberto Campos, economista, político e autor brasileiro, em foto de 1992
 (Bia Parreiras/EXAME)

Roberto Campos, economista, político e autor brasileiro, em foto de 1992 (Bia Parreiras/EXAME)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 30 de março de 2014 às 21h17.

São Paulo – Poucos brasileiros no século XX acumularam um currículo como o do economista Roberto Campos.

Nos anos 50, ele ajudou a criar o BNDES e a formular o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek.

Em 1964, era o embaixador brasileiro nos Estados Unidos quando ocorreu o golpe militar (que apoiou).

Em seguida, se tornou Ministro do Planejamento do governo Castello Branco e implementou o Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG) junto com Otávio de Bulhões.

A estratégia de contenção de gastos, aumento de impostos e abertura ao capital estrangeiro atingiu seu objetivo de segurar a inflação e estabilizar a economia, mas foi aí que começou a ficar mais forte a rejeição de Campos à intervenção estatal:

“Eles não tinham confiança total no plano ortodoxo. Foi por isso que criaram os mecanismos de correção monetária, que não foram usados na época mas depois foram ressuscitados por Geisel e se tornaram a cocaína que levou o país para a hiperinflação. Foi um grande arrependimento dele” diz Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-ministro e ex-presidente do BNDES.

Campos foi seu primeiro patrão no Investbanco, primeiro banco de investimentos do país, criado após sua saída do governo em 1968.

Ele lembra que quando teve seu visto negado para ir participar de um curso do Citi nos Estados Unidos, foi chamado para a sala de Campos, que brincou: "Dr. Mendonça, quem diria, o senhor é um comunista!". Um contato direto com o cônsul resolveu o problema.

Liberal

Campos foi embaixador em Londres em 1974, eleito senador em 1983 e cumpriu dois mandatos como deputado federal pelo Rio de Janeiro entre 1991 e 1999 - quando entrou para a Academia Brasileira de Letras.

Apesar de sua ligação sempre próxima com o poder, Campos foi com o tempo tomando cada vez mais horror ao modelo desenvolvimentista. Era um crítico feroz do comunismo:

“O bem que o Estado pode fazer é limitado; o mal, infinito. O que ele nos pode dar é sempre menos do que nos pode tirar."


Seus críticos notam que a relação entre liberdade econômica e liberdade política, sempre martelada por Campos, foi convenientemente ignorada no momento do golpe.

Para Mendonça de Barros, a avaliação ignora o contexto da época, assim como é impossível querer analisar as ideias de Campos à luz do século XXI:

“Ele olhava o Brasil com muito pessimismo pela nossa incapacidade de competir com as grandes empresas internacionais. Mas na época dele, nossos termos de troca eram mesmo muito ruins. Hoje, o Brasil tem um futuro mesmo como exportador de matéria-prima.”

Atualidade

Ainda assim, debates sobre medidas como a abertura comercial não foram superados até hoje simplesmente porque algumas das ideias nunca foram propriamente testadas. Campos dizia que o liberalismo econômico não chegou a fracassar na América Latina, apenas “não deu o ar da sua graça.”.

Para Mendonça de Barros, saíram de moda tanto a ortodoxia quanto o estilo claro e incisivo de Campos:

“Minha critica maior é em relação a um liberalismo extremado que não acomodava uma politica de desenvolvimento. Uma Embraer, por exemplo, nunca aconteceria no país de Campos. O que fica é uma espécie de homem público que não existe mais hoje – até com a coragem de se assumir reacionário quando todo mundo se diz de esquerda.”

Roberto Campos morreu de enfarte em 2001, aos 84 anos de idade, casado e com três filhos. Não viu o país tomar o rumo que ele tanto esperava – mas dificilmente teria se surpreendido. Provavelmente diria novamente que “a burrice no Brasil tem um passado glorioso e um futuro promissor.”

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