Economia

O que esperar de Roberto Campos Neto, novo presidente do Banco Central

Uma pista é a trajetória de seu avô e mentor, o ícone do liberalismo econômico brasileiro nos anos 50 e 60 que assinou o decreto que criou o BC em 1964

O atual presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn (à esquerda) e o indicado para ser seu sucessor, Roberto Campos Neto (Adriano Machado/Reuters)

O atual presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn (à esquerda) e o indicado para ser seu sucessor, Roberto Campos Neto (Adriano Machado/Reuters)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 11 de fevereiro de 2019 às 13h23.

Última atualização em 11 de fevereiro de 2019 às 13h34.

O homem que ajudou a fundar o Banco Central do Brasil não viveu o suficiente para ver seu neto assumir como seu próximo presidente, mas seu legado parece ter sobrevivido.

Embora Roberto Campos Neto, cuja aprovação pelo Senado para o cargo esteja prevista para o final deste mês, não tenha deixado claro para onde pode levar a política monetária do país, pistas podem ser encontradas ao olhar para seu avô e homônimo, Roberto Campos.

“Campos Neto era muito próximo de seu avô, que era seu principal mentor”, disse Alexandre Aoude, ex-presidente da unidade do Deutsche Bank AG no Brasil, colega do indicado.

O avô, um polêmico economista, diplomata, escritor e político que gostava de enfeitar suas conversas com frases de efeito espirituosas, ajudou a moldar o liberalismo econômico do Brasil nos anos 1950 e 1960, e como ministro do planejamento assinou o decreto que criou o Banco Central em 1964.

O neto, que não quis dar entrevista para esta matéria, até agora tem sido reticente em divulgar suas opiniões publicamente.

Mas seu histórico - Campos Neto, de 49 anos, foi um dos principais executivos na tesouria das Américas no Banco Santander, banco no qual trabalhou por um total de 16 anos - não deixa dúvidas de que entende a linguagem dos mercados.

"Onde quer que ele fosse, ele ganhava dinheiro", disse Aoude, que é sócio-fundador da empresa de investimentos Vectis Partners, em São Paulo. "Como trader e chefe de tesouraria de bancos e gestor de fundos, ele tomou decisões certas a maior parte do tempo."

Trabalhando no exterior

Ao assumir seu primeiro emprego no setor público, Campos Neto vai para o Banco Central com um profundo conhecimento dos investidores internacionais.

Grande parte dessa experiência vem de seu trabalho como responsável pela tesouraria do Santander nas Americas, com escritórios nos EUA, México, Chile, Peru, Brasil e Argentina.

Campos Neto também era responsável pelo trading proprietário e market making local e internacional do banco, um trabalho que o levou a conhecer gestores de fundos e executivos de empresas que queriam investir no Brasil.

A experiência no exterior é outra característica compartilhada com seu avô, que serviu como embaixador do Brasil em Washington e Londres. Esses trabalhos lhe valeram o apelido de “Bob Fields” - uma tradução exata do inglês usada como uma maneira de criticar sua afinidade com o capital estrangeiro.

Embora mais tarde em sua vida o avô tenha sido um dos oponentes mais radicais do socialismo ou de qualquer tipo de intervencionismo estatal, em 1951 ele defendeu a criação do banco de desenvolvimento do país, onde mais tarde atuou como presidente.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, o admirava tanto que sugeriu que seu neto comandasse o Banco Central. O presidente Jair Bolsonaro, que deu a Guedes poderes amplos para administrar a economia, concordou.

Estilo de gestão

Colegas que trabalharam com Campos Neto durante seus 10 anos no Santander disseram que ele era um negociador habilidoso, com uma abordagem flexível que o ajudava a construir relacionamentos duradouros não apenas com seus superiores no banco, mas também com sua equipe e clientes.

Eles disseram que ele criava um ambiente calmo e relaxado enquanto servia como mentor para seus colegas, se diferenciando de outros executivos do banco com estilo de gestão que às vezes promovia a humilhação de subordinados. Nenhum dos colegas concordou em ser identificado.

Antes do Santander, Campos Neto negociava taxas de juros, derivativos, dívidas e ações no Banco Bozano Simonsen, que foi vendido ao Santander em 2000. Empregos anteriores incluíram a função de gestor de carteiras no fundo de hedge Claritas Investimentos e Participações.

Ele obteve bacharelado e mestrado em economia pela Universidade da Califórnia, em Los Angeles, com especialização em finanças. Ele também possui mestrado em matemática aplicada pelo California Institute of Technology.

Campos Neto, que nasceu no Rio de Janeiro, é um esportista ávido que gosta de musculação, jogar tênis e correr, de acordo com o Banco Central. Ele passa suas noites em casa com sua família, que hoje usa carros blindados depois de sofrer um assalto.

"Cara pragmático"

“O banqueiro central moderno tornou-se muito mais tecnologicamente sofisticado, e alguém como Campos traz habilidades únicas à equação, já que ele trabalhou em um banco muito grande, sabe como os mercados funcionam, entende o ambiente regulatório e tem contatos fantásticos pelo mundo”, disse Hari Hariharan, presidente e gestor do NWI Management.

"Ele é um cara pragmático", disse Hariharan, que trabalhou no Santander e conhece Campos há 16 anos.

Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central na década de 1990, disse que a "continuidade" das políticas de seu antecessor, Ilan Goldfajn, provavelmente caracterizará o mandato de Campos Neto.

Loyola, agora sócio da empresa de consultoria Tendências Consultoria Integrada, espera um “Banco Central comprometido com o regime de metas de inflação, preservando a credibilidade conquistada durante o tempo de Ilan”.

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