Economia

O pacote da distração

Letícia Toledo Até semana passada, a derrapante economia do país era tida como a principal fraqueza do governo Temer – tanto é que aliados pressionaram pela saída de Henrique Meirelles do ministério da Fazenda. Mas, como costuma acontecer no Brasil de 2016, o jogo virou. Esta semana, Meirelles e sua equipe econômica viraram a tábua […]

HENRIQUE MEIRELLES E MICHEL TEMER: em que pese as condições em que se deu a transição, é inegável que muitas transformações na economia já foram feitas / Andressa Anholete / Getty Images (Andressa Anholete/Getty Images)

HENRIQUE MEIRELLES E MICHEL TEMER: em que pese as condições em que se deu a transição, é inegável que muitas transformações na economia já foram feitas / Andressa Anholete / Getty Images (Andressa Anholete/Getty Images)

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Letícia Toledo

Publicado em 12 de dezembro de 2016 às 16h07.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 17h59.

Letícia Toledo

Até semana passada, a derrapante economia do país era tida como a principal fraqueza do governo Temer – tanto é que aliados pressionaram pela saída de Henrique Meirelles do ministério da Fazenda. Mas, como costuma acontecer no Brasil de 2016, o jogo virou. Esta semana, Meirelles e sua equipe econômica viraram a tábua de salvação. Isso porque o vazamento da delação de Cláudio Melo Filho, ex-vice-presidente de Relações Institucionais da Odebrecht, na qual o nome do presidente foi citado 43 vezes, veio a relembrar que a penúria econômica é muito maior do que a política. Na mesma delação foram citados 50 políticos, entre eles o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha (o Primo), e o secretário de parcerias e investimentos, Moreira Franco (o Angorá). Nesta segunda, o presidente do Senado, Renan Calheiros (o Justiça da lista da Odebrecht), foi denunciado por corrupção e lavagem de dinheiro na Lava-Jato pela Procuradoria Geral da República. A ordem no governo agora é desviar o foco da política.

Vamos à economia, portanto. O governo deve anunciar na quarta-feira um pacote de medidas microeconômicas. Inicialmente previsto para janeiro, o pacote teve que ser adiantado às pressas. O problema é que o impacto do pacote deve ser pequeno e algumas medidas que resolvem pequenos problemas no curto prazo podem ser prejudiciais ao ajuste de longo prazo.

A principal polêmica gira em torno do Programa de Sustentação ao Emprego, que nada mais é do que uma nova versão – permanente e mais abrangente – do Programa de Proteção ao Emprego que foi lançado durante o governo de Dilma Rousseff em junho do ano passado e que teria fim em 2016. Até agora, o programa evitou que 63.300 trabalhadores – de empresas como do ramo metalúrgico e montadoras – perdessem seu emprego com um custo de 169,3 milhões de reais.O impacto é visto como baixo e o custo é alto. A taxa de desemprego (que em outubro chegou a a 11,8%, com 12 milhões de pessoas desocupadas ) como se sabe, não parou de avançar por causa do programa.

O programa reduz a jornada de trabalho e o salário dos funcionários das empresas participantes em até 30%, contando com o complemento pelo governo federal, correspondente a 15%. O problema é que os recursos utilizados para isso são do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que é deficitário e há anos necessita de aportes do Tesouro Nacional para cobrir despesas com seguro-desemprego e abono salarial. O programa que deve ser anunciado pelo governo Temer prevê investimento de 1,3 bilhão de reais para manutenção de 200.000 postos de trabalho em quatro anos. Mas e a eficácia? “Isso vem como um alívio para a companhia. Mas tem uma questão de fundo: a empresa só vai produzir se ela tiver demanda”, diz João Luiz Mascolo, professor do Insper.

Outra medida que está sendo analisada e deve ser anunciada é a autorização do saque de uma parcela do FGTS para que trabalhadores possam quitar empréstimos com bancos. O endividamento das famílias e empresas é tido como um dos principais complicadores da crise atual. Hoje, existem mais de 59 milhões de inadimplentes no país – quase 40% da população acima dos 18 anos. A proposta ajudaria as pessoas com dificuldades em pagar empréstimos que têm taxas de juros elevadas.

Junto a essa medida, o governo também quer diminuir o endividamento das empresas. Segundo a consultoria Economatica, a dívida líquida das companhias de capital aberto soma 940 bilhões de reais. Para isso, o governo estuda anunciar a liberação de recursos que os grandes bancos depositam obrigatoriamente no Banco Central – os chamados depósitos compulsórios. A ideia é utilizar esse dinheiro para refinanciar – a juros mais baixos – as dívidas mais caras de consumidores e empresas e abrir espaço para que tenham condições de tomar mais crédito e com isso fazer a economia girar. A liberação também não chega a ser uma medida nova: durante a gestão Dilma Rousseff, os bancos podiam fazer empréstimos para compra de veículos e descontavam o valor emprestado do compulsório. De novo, a pergunta: vai funcionar? “Mexer no FGTS não é a solução – o problema não é tomar crédito, falta demanda de crédito. Tanto família como empresas estão inseguros com tanta instabilidade política. Ninguém quer pegar crédito porque não sabe o que acontecerá amanhã”, diz Mauro Rochlin, professor da Fundação Getúlio Vargas.

No pacote econômico ainda deve vir uma série de ações, como simplificações tributárias, melhorias logísticas e facilitação de exportações e importações. Enfim, um juntadão. Serão adotadas medidas administrativas e também elaborados projetos de leis que serão enviados ao Congresso. Depender do Congresso, até aqui, não tem sido um problema. Mas analistas não consideram isso uma verdade imutável. “Um pacote de bondades como este teoricamente seria menos problemático – mas nesse cenário caótico, o governo Temer está perdendo aliados e é preciso de muita barganha para passar qualquer medida”, afirma o cientista político André César, da Hold Assessoria Legislativa

Acima de todas essas, uma questão não sai da cabeça de analistas: como fazer para que essas iniciativas anti-cíclicas não incorram nos mesmos erros das políticas de estímulo do governo Dilma? Em entrevista à EXAME Hoje na última semana o ministro da Fazenda, Henrique Meirellles, garantiu que essa é a preocupação número um. “Não vamos fazer pirotecnias”, disse. Economistas ouvidos concordam que o caminho, apesar de algumas semelhanças, é diferente. Não deveremos, portanto, caminhar para o precipício. Mas nada garante que será o início da tão sonhada retomada. As medidas que devem ser anunciadas esta semana, garantem economistas, não devem salvar a economia porque a crise do país é profunda e a recuperação tende a ser lenta. “Não acredito no poder dessas medidas porque o grande fator inibidor é a demanda fraca e as expectativas”, afirma Gerner Oliveira da Go Associados.

A esperança está em medidas como a aprovação da Pec do Teto deve acontecer nesta terça-feira. A agenda econômica ainda deve contar com a votação na comissão no Senado do Projeto de Lei da Câmara (PLC) 54/2016, que estabelece um plano de auxílio econômico aos estados e medidas de estímulo ao reequilíbrio fiscal. A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados deve votar na quarta-feira a admissibilidade da PEC da reforma da Previdência. Essas aprovações podem trazer um certo alívio para governo. O problema é que a delação de Melo Filho foi a primeira de77 executivos da Odebrecht. Se Temer e seu núcleo duro continuar sendo citado, não há pacote econômico que possa segurá-lo.

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