Economia

Na Venezuela, vale a pena usar dinheiro como guardanapo

Dois bolívares valem cerca de um centavo do real: em um país com inflação em disparada e escassez de produtos básicos, vale a pena usar nota como guardanapo


	Moeda da Venezuela, o Bolivar
 (Meridith Kohut)

Moeda da Venezuela, o Bolivar (Meridith Kohut)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 19 de agosto de 2015 às 11h45.

São Paulo - Um homem segura uma empanada. Para não sujar a mão, uma cédula de 2 bolívares.

O título: "A economia na Venezuela é tão bagunçada que é mais barato usar dinheiro de verdade do que comprar guardanapos".

A foto, publicada há 2 dias na rede social Reddit, já rendeu mais de 1700 comentários e repercutiu em veículos internacionais como a CNN.

Além de uma certa falta de higiene, ela simboliza dois grandes problemas enfrentados pela Venezuela. 

Inflação

Um deles é a inflação, que foi de 68,5% em 2014 de acordo com o governo, que não divulgou dados para este ano.

De acordo com economistas ouvidos pela Reuters, a taxa já ultrapassou os 3 dígitos e pode fechar 2015 na casa dos 150%-200% - a mais alta desde que a medição começou há 60 anos, e provavelmente a maior do mundo.

O país tem três taxas de câmbio oficiais. A mais alta, do Sistema Marginal de Divisas (Simadi), beira os 200 dólares, mas a maioria dos venezuelanos já recorre ao mercado negro de câmbio.

E de acordo com o site Dolar Today, perseguido pelo governo, um dólar vale hoje 676 bolívares - mais que o dobro do que em maio e o triplo do que em janeiro.

Isso significa que para segurar sua empanada, o sujeito da foto está desperdiçando menos de um terço de centavo de dólar (ou pouco mais de um centavo de real).

Escassez

Só que além de inflação, a Venezuela também tem um problema de escassez. Desde 2003, um rígido controle cambial limita o nível de divisas disponíveis para as empresas quitarem suas obrigações.

A falta de dólares para financiar as importações, que já era grave, piorou muito com a queda do preço de petróleo, principal produto de exportação da Venezuela.

O resultado são filas quilométricas e prateleiras vazias de produtos básicos, como alimentos e papel sanitário (há hóteis que pedem para você trazer o seu).

Recentemente, o governo das ilhas caribenhas de Trinidad e Tobago sugeriu para a Venezuela uma troca de lenços de papel por petróleo, segundo a Bloomberg.

O índice de escassez parou de ser publicado oficialmente e especialistas falam do risco de uma crise alimentar. Saques e episódios de violência estão aumentando.

Consequências

Os venezuelanos tem recorrido às redes sociais para saber informações sobre fornecimento e promover uma espécie de escambo chamado de “trueque”.

Até a mania nacional do implante do seio foi afetada. Um pacote de camisinhas chega a sair por mais de 2 mil reais e um iPhone pode custar 145 mil reais. A escassez está ameaçando também a oferta de cerveja.

A cesta básica familiar na Venezuela aumentou 163,6% desde junho de 2014 e, com o custo atual, uma família necessita de quase oito salários mínimos para cobrir suas necessidades, de acordo com o Centro de Documentação e Análise para os Trabalhadores (Cendas).

Maduro se diz vítima de uma "guerra econômica" e responde com um controle ainda maior da economia. Sua aprovação está abaixo dos 25% e eleições parlamentares estão marcadas para dezembro.

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