Montadoras: como ocorre com os automóveis, o que tem ajudado a produção a reagir são as exportações (./Reprodução)
Estadão Conteúdo
Publicado em 14 de maio de 2017 às 11h56.
São Paulo -- No ano passado, as montadoras produziram 60,6 mil caminhões, o mais baixo volume em 17 anos. Em 2015 foram 74 mil e, no ano anterior, 140 mil. Nos primeiros quatro meses de 2017 saíram das linhas de montagem 21,6 mil unidades, o que representa uma recuperação de 6,5% em relação ao mesmo período de 2016. Ainda assim, as fábricas operam com apenas 20% da capacidade produtiva.
Assim como ocorre com os automóveis, o que tem ajudado a produção a reagir são as exportações. De janeiro a abril as vendas externas de caminhões aumentaram 43,3% em relação ao mesmo intervalo do ano passado, somando 8.313 unidades.
As vendas internas, no entanto, estão 24,1% inferiores no comparativo com os números de 2016, com 13,1 mil unidades.
"Pelo menos o telefone voltou a tocar e estamos recebendo novas consultas", diz o diretor da Mercedes-Benz, Luiz Carlos de Moraes, também vice-presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).
A previsão da entidade é que, somando caminhões e ônibus, deverão ser vendidos até dezembro 65,6 mil veículos dos dois segmentos, pouco acima dos 61,7 mil do ano passado.
Para a produção é esperada alta de 26%, para 100 mil unidades, das quais 34,4 mil devem ser exportadas. A Argentina ficará com pelo menos metade desses veículos para atender a demanda de sua economia que deve crescer 3% este ano.
Moraes espera que a recuperação das vendas comece a partir do segundo semestre. "Será uma retomada moderada", adianta. Entre os fatores que devem ajudar a reverter a queda atual ele cita a volta do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) nacional e a provação das reformas da Previdência e trabalhista, ambas apoiadas pela Anfavea.
"A reforma trabalhista vai trazer modernização nas relações entre empresas e trabalhadores, vai reforçar os acordos negociados e vai valorizar as ações dos sindicatos", afirma o presidente da Anfavea, Antonio Megale. "Haverá um impacto positivo nas decisões de investimentos futuros no País".
Cerca de 200 mil caminhões estão parados nas empresas de transporte de cargas do País. O número equivale a dois anos e meio de produção, levando-se em conta o que foi fabricado de 2014 a 2016.
A crise econômica que resultou na queda generalizada do consumo e a paralisação de obras por parte de construtoras envolvidas na Lava Jato, assim como da Petrobras, levou a uma ociosidade recorde de veículos que transportam alimentos, eletroeletrônicos, materiais de construção e veículos, entre outros itens.
Pesquisa realizada em janeiro pela Associação Nacional de Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística) constatou que mais da metade das transportadoras brasileiras tinham, em média, 10% de suas frotas paradas. Pelos cálculos do presidente da entidade, José Hélio Fernandes, havia no início do ano pelo menos 200 mil veículos encostados.
O número pode ter reduzido nesses últimos meses em razão da demanda por transporte de grãos, mas, ainda assim, a ociosidade é elevada, avalia Fernandes.
A TSA Cargo, com sede em Guarulhos e filiais em Santos e Campinas, no Estado de São Paulo, mantém quase 20% de sua frota de 180 veículos encostada em quatro pátios. A empresa atua principalmente no transporte de mercadorias importadas ou destinada à exportação. De 2013 para cá, o faturamento caiu à metade, para cerca de R$ 3,5 milhões.
"O setor está em colapso, na UTI, respirando com aparelhos", define Paulo Scremim, presidente do grupo criado há 25 anos. Dos 420 funcionários que tinha em 2013, quando a crise se aprofundou, a TSA mantém atualmente 270. "Tive de demitir pessoal qualificado, alguns deles estavam na empresa há 20 anos", informa o empresário. "Assim que ocorrer uma recuperação do mercado, vou recontratar o que for possível."
De acordo com o presidente do Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas de São Paulo (Setcesp), Tayguara Helou, além dos caminhões parados, aqueles que continuam operando circulam com pouca carga, impedindo assim que a operação seja superavitária. "O desdobramento disso será a falta de capacidade do setor em investir em renovação de frota, infraestrutura, treinamento de pessoal e melhoria da qualidade".
Helou ressalta ainda que, para não retornar de uma entrega com o caminhão vazio, empresas com frota própria (que não utilizam transportadoras) aceitam "qualquer preço" para transportar mercadorias e, com isso, puxam para baixo o preço do frete.
"Transportar carga mal remunerada é um perigo constante, pois a empresa perde a capacidade de fazer a manutenção nos veículos e de operar com pessoal mais qualificado", afirma.
Sócio da Braspress -, empresa de transporte de cargas fundada há 40 anos por seu pai e hoje com 93 filiais por todo o Brasil e frota de 2.350 veículos próprios e 1,6 mil terceirizados -, Helou afirma "nunca ter visto crise tão forte no setor". Para Fernandes, da NTC&Logística, somente quando a indústria aumentar a produção e o comércio reagir, "a roda voltará a rodar".
Para o sócio da consultoria PricewaterhouseCoopers, Marcelo Cioffi, mesmo que o mercado melhore ao longo dos próximos meses, "as transportadoras primeiro vão colocar os veículos que estão parados na rua, para depois renovar a frota".
A recuperação da produção, portanto, pode levar mais tempo já que transportadoras e empresas com frota própria detêm 65% da frota de caminhões que circulam pelo País. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) tem registrados 1,67 milhão de caminhões aptos a realizar fretes, segundo dados atualizados neste mês.
Roberto Cortes, presidente da fabricante de caminhões e ônibus MAN Latin América, cita o exemplo dos atacadistas que, segundo ele, tradicionalmente renovavam suas frotas a cada dois anos. "Ultimamente eles deixarem de ir às compras" por causa da redução da entrega de mercadorias em geral.
Na área de logística, a frota em uso normalmente tinha entre dois e três anos, mas agora a idade está na faixa dos seis anos o que, na opinião de Cortes, não é condizente com o negócio desse segmento. "Quando o nível de confiança melhorar e questão política se equalizar, esses clientes vão voltar, pois não é interessante para eles manter caminhões velhos", diz o executivo.