Trator trabalha em uma plantação de trigo perto da cidade de Uruará, no Pará (Nacho Doce/Reuters)
Da Redação
Publicado em 7 de janeiro de 2014 às 15h51.
São Paulo - Moinhos brasileiros estão comprando dos Estados Unidos praticamente todo o trigo importado de que necessitam nesta época do ano, quando geralmente trariam o produto da Argentina, já que o governo do país vizinho ainda não liberou os embarques para exportações.
Essa situação eleva os custos das empresas e alonga os cronogramas de desembarque do produto importado (bastante usado em "blends" com o cereal nacional), o que atrapalha o planejamento das indústrias.
"A gente está revertendo com trigo americano. Não tem nenhuma previsão concreta de embarque de trigo argentino", disse a pessoa responsável por importações de um moinho de São Paulo, pedindo para não ser identificada.
Havia a expectativa de que, a partir de janeiro, o governo argentino --que regula fortemente o setor-- desse liberação para embarques. No entanto, isso ainda não aconteceu, disseram fontes de moinhos brasileiros.
"É incerto quando eles vão começar a liberar. Não temos informação concreta", disse o presidente do Moinho Pacífico, Lawrence Pih.
Em dezembro, uma fonte do mercado argentino disse que a exportação de 1,6 milhão de toneladas da nova safra já havia sido autorizada, mas ainda estavam pendentes as autorizações para o embarque.
A Argentina é tradicionalmente o principal fornecedor de trigo para o Brasil, mas de janeiro a novembro de 2013 os EUA já haviam passado à liderança.
Após uma safra frustrante na Argentina, o Brasil importou no período 3 milhões de toneladas de trigo dos EUA, segundo dados do Ministério da Agricultura, contra apenas 54 mil toneladas no mesmo período do ano passado.
"Cerca de 180 mil toneladas de trigo dos EUA foram compradas entre dezembro e início de janeiro", disse um operador de mercado de um moinho paulista.
Para Lawrence Pih, "está vindo mais dos EUA do que a gente imaginava. Hoje não tem alternativa, além de comprar o trigo americano." Dados detalhados das autoridades alfandegárias brasileiras sobre as importações de dezembro ainda não estavam disponíveis.
Relatórios semanais do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) apontam que em dezembro foram exportadas 236,3 mil toneladas de trigo para o Brasil.
Custos Maiores
O trigo norte-americano entra no Brasil pagando 10 por cento de Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul, uma taxação que não incide sobre o trigo argentino.
Fora isso, as distâncias são maiores, encarecendo o frete e exigindo uma programação maior --de cerca de 40 dias-- entre o fechamento da compra e a chegada do produto ao moinho.
"Não existe planejamento que aguente", disse o operador paulista.
Para o empresário Lawrence Pih, a decisão é "muito difícil" para os moinhos: as empresas correm podem agendar uma carga dos EUA, mais cara, e logo depois a Argentina autorizar embarques.
"Compra e corre o risco", disse ele.
Trigo Nacional
Enquanto isso, o Rio Grande do Sul acaba de colher uma safra abundante de trigo, ajudando a compensar perdas com geadas na colheita do Paraná.
Os preços no mercado gaúcho seguem uma trajetória de baixa, em meio a uma oferta abundante que não é absorvida no mercado nacional.
Os preços medidos em Passo Fundo pelo Cepea, por exemplo, estão em 603 reais por tonelada, 16 por cento abaixo do nível registrado no início de novembro.
"A gente teria interesse em comprar trigo gaúcho, mas não há volume suficiente da qualidade que precisamos", disse Pih, ressaltando que a produção de farinha é feita com uma mistura (blend) de trigo duro importado e de trigo nacional, geralmente mais mole.
O operador do moinho paulista, que pediu para não ter seu nome citado, afirmou que, com o trigo norte-americano, a sua indústria usa 70 por cento de produto importado e 30 por cento de trigo brasileiro.
"Se houvesse liberação, viria tudo da Argentina, o que inclusive ajudaria a aumentar o uso de trigo nacional", disse. Neste caso, a empresa poderia usar 60 por cento de trigo argentino e 40 por cento de trigo brasileiro.
O Cepea, que consulta com produtores e empresas, disse nesta terça-feira que colaboradores relatam que "é recorrente no setor a baixa liquidez".
"Mesmo no ano passado, com menor oferta nacional, ainda houve períodos sem compradores ativos e, consequentemente, com produtores sem opção para venda e sem caixa para pagamento de dívidas de custeio", disse a entidade, em relatório semanal.