Sede do Ministério da Economia, em Brasília (Adriano Machado/Reuters)
Alessandra Azevedo
Publicado em 1 de abril de 2021 às 17h35.
Última atualização em 1 de abril de 2021 às 19h00.
Insatisfeita com o Orçamento aprovado no último dia 26 pelo Congresso, a equipe econômica do governo sugere vetos ao texto para garantir que as despesas essenciais poderão ser pagas sem risco de estourar o teto de gastos. O texto que passou pelos parlamentares é considerado inexequível pelo Ministério da Economia, mas o governo ainda não decidiu a melhor forma de resolver o impasse.
Um dos maiores problemas é que 26,5 bilhões de reais que seriam usados para gastos como benefícios previdenciários, seguro-desemprego e abono salarial foram remanejados para bancar emendas parlamentares -- verbas que os deputados e senadores destinam para obras nos redutos eleitorais. Com isso, o pagamento das demais despesas fica ameaçado.
Ou seja, com o aval de aliados do governo, o Congresso aprovou um Orçamento que não tem como ser executado se não houver mudanças. O presidente Jair Bolsonaro já foi avisado pela equipe econômica que, se sancionar o texto sem resolver o problema, ele corre o risco de ser enquadrado por crime de responsabilidade, o que pode levar ao impeachment por descumprimento de lei fiscal.
Caso o governo não encontre uma forma de garantir o pagamento das despesas obrigatórias sem estourar o Orçamento, pode chegar a um ponto de paralisação da máquina pública. Isso porque seria preciso fazer cortes bilionários em despesas discricionárias, que incluem gastos para manter os serviços públicos funcionando, como com energia elétrica, água, materiais em geral, terceirizados e até investimentos em infraestrutura e bolsas de estudo.
Para contornar a situação, uma das ideias do Ministério da Economia é vetar parte do dinheiro que iria para emendas e enviar um projeto de lei depois (PLN), para redistribuir o dinheiro e garantir o pagamento das despesas obrigatórias, como benefícios do INSS, sem precisar cortar bilhões das discricionárias, que correspondem a uma fatia pequena do Orçamento, de cerca de 5%.
Reverter a destinação do dinheiro seria uma forma de redistribuir as verbas sem precisar enviar um novo Orçamento. O contingenciamento não pode ser feito em despesas obrigatórias, que precisam ser pagas por lei e correspondem a 95% dos gastos da União. E a previsão deste ano já está subestimada, porque o governo não atualizou os parâmetros de cálculo, como o valor do salário mínimo, usado de base para pagamentos, por exemplo, de auxílios e aposentadorias.
"Na prática, como as despesas obrigatórias tenderão a ficar acima do estimado, será preciso contingenciar as discricionárias, sob pena de não se cumprirem as regras fiscais vigentes", alerta a Instituição Fiscal Independente (IFI), em relatório. A diminuição na previsão de gastos com Previdência, abono e seguro desemprego levam a um cenário em que "as despesas discricionárias terão de ser contingenciadas a fim de se observar as metas fiscais".
Após conversas com o ministro Paulo Guedes e outras autoridades envolvidas nas negociações, o relator-geral do Orçamento, senador Marcio Bittar (MDB-AC), se dispôs a retirar 10 bilhões de reais das emendas de relator, as chamadas RP9, que têm a destinação indicada por ele. O valor, entretanto, ainda não é suficiente. Para manter as despesas discricionárias em um patamar eficiente, o valor estimado é de 80 bilhões de reais.
Pelos cálculos da IFI, seria preciso cortar 31,9 bilhões de reais das despesas aprovadas para que seja possível cumprir o teto de gastos, por conta das mudanças feitas no parecer, que omitiram despesas obrigatórias. O total previsto para emendas parlamentares é de 48,8 bilhões de reais. Os 26,5 bilhões que saíram de áreas como Previdência e abono é destinado aos ministérios do Desenvolvimento Regional e da Infraestrutura, responsáveis por obras.
Embora possam ser contingenciadas, as emendas não podem ser usadas como fonte para abertura de créditos suplementares por decreto. Por isso, "caso o Executivo tenha que recompor as dotações dos gastos obrigatórios cortados no texto, e dado que há pouco espaço no teto de gastos, eventual crédito suplementar somente poderá cancelar emendas parlamentares por meio de projeto de lei que solicite a alteração", diz a IFI.
Na última terça-feira, 30, Guedes fez um alerta sobre acordos políticos que podem engessar o Orçamento e pediu para que parlamentares tenham responsabilidade fiscal na hora de alocar recursos. "Nosso apelo final é justamente que os acordos políticos têm de caber nos orçamentos públicos", afirmou. Segundo ele, a "essência" da política é fazer alocação dos recursos, o que deve levar em consideração a capacidade de pagamento e a previsibilidade das despesas.
Os parlamentares, porém, não estão de acordo com o corte de mais emendas. Para representantes do governo no Congresso e, inclusive, na opinião do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), os 10 bilhões de reais sugeridos por Bittar são suficientes. Eles argumentam que não seria possível contingenciar mais emendas, porque isso poderia gerar defasagem, já que os parâmetros não foram atualizados.