Pedestres atravessam a ponte Zollbruecke em Magdeburgo, Alemanha, na quinta-feira, 28 de maio de 2020. (Krisztian Bocsi/Bloomberg)
Ligia Tuon
Publicado em 29 de maio de 2020 às 18h31.
Última atualização em 29 de maio de 2020 às 18h55.
Em uma sombria sexta-feira de março, com a evidente devastação causada pelo coronavírus, autoridades do governo da chanceler alemã Angela Merkel perceberam a necessidade de medidas extraordinárias para sustentar a maior economia da Europa.
Em velocidade vertiginosa, assessores do Ministério da Economia elaboraram um programa de resgate no valor de 600 bilhões de euros (US$ 660 bilhões) para evitar o colapso.
Com o aumento dos casos de coronavírus e restrições rigorosas sobre pessoas e empresas, houve pouco tempo para debate e nenhuma oposição significativa. No entanto, por trás da nervosa gestão da crise, havia uma estratégia mais profunda que já estava em elaboração há meses.
A estratégia já havia sido rejeitada como radical demais para o establishment político e empresarial quando proposta pela primeira vez no ano passado. Mas, com a crise como catalisador, o pacote foi aprovado no gabinete na segunda-feira seguinte e era lei no fim da semana. Coloca Merkel no comando da mais drástica reengenharia da economia alemã desde a reconstrução do pós-guerra.
Quando terminar, a chanceler terá implementado um tipo de capitalismo de estado na Alemanha, muito semelhante ao modelo da França e que até se informa sobre o sucesso da China. O plano dará às autoridades do governo de Berlim novos poderes para intervir na economia: escolherão entre vencedores e perdedores, semeando novas indústrias e preparando campeões nacionais. A compra de participações em empresas não é mais um tabu, e a política de orçamento equilibrado foi descartada para liberar todo o poder do balanço alemão.
Em outras palavras, o resgate histórico de 9 bilhões de euros (US$ 9,8 bilhões) desta semana para a Deutsche Lufthansa - incluindo a participação de 20% do governo e o direito de bloquear aquisições indesejadas - é apenas o começo. Mais do que apenas garantir as conexões aéreas da Alemanha com o mundo exterior, o acordo estabelece um marcador de como o governo Merkel pretende que a economia seja administrada na era pós-pandemia.
É uma oportunidade única para Merkel expiar erros passados. Mesmo antes da pandemia, a Alemanha tropeçava. A dependência de tecnologias intensivas em carbono, rede digital nacional irregular e burocracia revelaram falhas na gestão da chanceler da máquina de exportação do país.
Após a crise financeira, sua estratégia era simplesmente estabilizar o navio e sair do caminho. Mas o mundo mudou significativamente desde então.
(Com a colaboração de Christoph Rauwald e Richard Weiss).