Henrique Meirelles e Michel Temer: medidas foram anunciadas sem notas técnicas, que podem fazer toda a diferença no plano (Reuters/Adriano Machado/Reuters)
Da Redação
Publicado em 25 de maio de 2016 às 10h15.
São Paulo - Economistas e analistas de mercado elogiaram a sinalização de que o governo em exercício pretende mexer na estrutura do gasto.
Ou seja: adotar instrumentos para combater o crescimento desenfreado da despesa no longo prazo e não apenas adotar paliativos para cobrir o buraco no curto prazo.
No entanto, estranharam que o anúncio não tenha sido acompanhado de uma nota técnica e aguardam os detalhes, que podem fazer toda a diferença na hora de o Congresso votar as medidas, muitas delas impopulares.
A proposta mais comemorada foi a intenção de atrelar o crescimento do gasto primário (que excluem gastos com juros) à inflação do ano anterior.
"É uma mudança de conceito", diz o economista José Roberto Mendonça de Barros, sócio da consultoria MB Associados. "A medida reverte a ideia que o gasto público sobe como resultado de qualquer pressão e, depois, um imposto vem atrás para cobrir o buraco."
Já há divergências, no entanto, na proposta de alterar as regras das chamadas vinculações (gastos que têm destino certo definido por lei).
Em sua maioria, estão atreladas a despesas consideradas de cunho social, como saúde e educação.
Para Raul Velloso, especialista em finanças públicas, mudanças nas vinculações são bem-vindas, porque engessam o Orçamento, e não representam corte de benefícios sociais.
"Se as medidas forem aprovadas, haverá crescimento real zero da despesa, então os gastos com saúde e educação também terão crescimento real zero - não haverá corte", diz Velloso.
A criação do teto, porém, pressupõe um arrocho nesses gastos e, diante disso, o economista Marcos Lisboa, presidente do Insper, pede cautela com a tesoura. Comemorou uma revisão nas vinculações, mas com a ressalva de que é preciso saber eleger prioridades nessa área.
"O Banco Mundial acaba de divulgar que saúde básica, educação básica e programas de transferências de renda, que fazem uma enorme diferença na vida das pessoas, correspondem a uma parcela mínima do gasto, entre 25% e 16%: nesse gasto não precisa mexer, mas, sim, no gasto de saúde e educação do andar de cima", diz Lisboa.
Amir Khair, ex-secretário de Finanças da Prefeitura de São Paulo, recebeu as medidas com cautela. "O pacote pune o social e é insuficiente para conter a elevação da dívida pública", diz.
Para Khair é preciso olhar o conjunto das medidas e incluir que o governo, apesar de ter suspendido a discussão neste momento, ainda vai voltar a negociar a Desvinculação de Receitas da União (DRU). O mecanismo autoriza o governo a usar livremente parte do dinheiro arrecadado.
"A desvinculação normalmente é de 20%, mas as negociações caminham para subir a 30% e já se fala em 50%. Como a fórmula pode ser adotada em Estados e municípios, teremos uma pancada em educação e, especialmente, em saúde: a população mais pobre, que depende dos serviços do Estado, vai ser penalizada."
Para Khair, o pacote é insuficiente porque não toca na questão dos juros da dívida. Uma de suas bandeiras mais antigas como analista de finanças públicas é que o governo foque nessa questão.
"Uma parte dos economistas acredita que os juros vão cair com a inflação, mas não vimos isso e 82% do déficit é juros", diz ele.
Permanecem, porém, dúvidas sobre a real probabilidade de avanço da agenda. Os especialistas destacam que as medidas ainda não foram detalhadas e as mais importantes dependem de aprovação no Congresso, como a reforma da Previdência, que responde por mais de 40% dos gastos primários (que excluem juros).
"Atendendo à pressão do mercado, o governo sinalizou que está disposto a fazer mudanças importantes, mas ainda precisa explicar como fará, pois não houve divulgação de nota técnica, e ainda tem uma situação política no Congresso não resolvida pela frente", diz o economista Fábio Klein da Tendências Consultoria.
Para o economista-chefe do Goldman Sachs para América Latina, Alberto Ramos, o aprofundamento do ajuste fiscal, com a saída de um déficit primário ao redor de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) para um patamar que coloque a dívida pública em trajetória de queda, será uma "jornada de vários anos" e um período no qual o Congresso e a sociedade terão de enfrentar escolhas difíceis.
Ele prevê que a volta do Brasil a um superávit primário pode demorar de dois a três anos. Já a volta para um superávit primário que estabilize a dinâmica da dívida pública, estimado ao redor de 2,5% do PIB, pode demorar entre quatro e cinco anos.
Segundo Ramos, além das medidas anunciadas, também será preciso lidar com um corte mais pronunciado de despesas ou aumentos de impostos, ou ambos, mesmo considerando que a carga tributária brasileira já é muito alta. Colaborou Altamiro Silva Junior
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.