EXAME.com (EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 18 de junho de 2010 às 14h51.
São Paulo - A recente decisão de reajustar em 7,72% as aposentadorias superiores a um salário mínimo deve ampliar o potencial destrutivo de uma conhecida "bomba-relógio" brasileira: o déficit da Previdência Social, que soma cerca de 50 bilhões de reais anuais. A medida, segundo o Ministério da Fazenda, custará aos cofres públicos 1,6 bilhão de reais só em 2010. Cálculos do Ministério do Planejamento dão conta de um 'rombo' de 30 bilhões de reais em cinco anos.
Dois projetos aprovados nesta quarta-feira em comissões da Câmara de Deputados podem contribuir para uma piora significativa deste quadro. A de Constituição e Justiça (CCJ) ratificou um projeto do senador Paulo Paim (PT-RS), que visa corrigir os benefícios dos 8,3 milhões de aposentados que ganham acima do piso da Previdência, que é o salário mínimo. A idéia é atrelar todos os vencimentos a esta referência de rendimento.
Isto porque, segundo as regras atuais, só o piso é reajustado quando o governo decide aumentar o mínimo. A proposta custará ao Tesouro cerca de 80 bilhões de reais, pois Paim quer estender a todos os beneficiários do INSS o ganho real do mínimo dos últimos anos - para que se tenha idéia, a elevação do mínimo, desde o plano Real, ultrapassou em 200 pontos porcentuais a inflação medida pelo IPCA.
Para completar, a Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público (CTASP) aprovou projeto que reajusta os salários do Judiciário, com impacto anual de 6,4 bilhões de reais. Ambas as medidas passarão a valer somente se ratificadas pelo Congresso e, depois, pela Presidência da República.
Os especialistas ouvidos por Veja.com concordam num ponto: o problema não é o impacto isolado dessas medidas, mas sim a sinalização de que o governo está caminhando no sentido contrário ao que é sustentável no longo prazo. "Se o governo concede reajustes acima da inflação aos aposentados, cria aposentadoria especial para um grupo ou para outro e toma outras medidas neste sentido, ele está gerando um aumento de gastos tão grande que, no futuro, implicará um ajuste e o corte de vários benefícios que concedeu", explica Marcelo Caetano, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), especialista em previdência social. O problema, acrescenta o especialista, é o efeito cumulativo destas medidas.
Envelhecimento da população
A gravidade do déficit da Previdência fica mais evidente a luz de outro problema: a trajetória demográfica. O povo brasileiro vê sua parcela de idosos se expandir espantosamente. Dados do IBGE apontam que, enquanto em 2008 as crianças de 0 a 14 anos correspondiam a 26,47% da população, o contingente com 65 anos ou mais representava 6,53%. Em 2050, o primeiro grupo representará 13,15%, ao passo que os idosos chegarão a 22,71%.
O quadro piora quando se constata que o Brasil já possui um gasto previdenciário muito alto para um país jovem. Um estudo comparativo realizado pelo Ipea relativo ao período 2001-2005 aponta que a despesa previdenciária total do país correspondia a 12,6% do PIB, bem próximo do verificado na Alemanha (12,8% do PIB). Os alemães, contudo, têm uma população de idosos proporcionalmente maior.
Seu "índice de dependência" - razão do número de pessoas com mais de 65 anos ante a população em idade ativa - era de 27,2%. Tal indicador para o Brasil era muito inferior, de 9,1%. Um país sul-americano com perfil demográfico semelhante ao nacional seria o México, cuja "dependência" dos mais velhos era de 8,2% no período estudado. Seu gasto com Previdência situava-se, entretanto, 10 pontos porcentuais abaixo do nacional. Com o acréscimo do número de velhos, as despesas com aposentadorias tende a subir, assim como as com saúde.
Os especialistas alertam que, se não forem implementadas mudanças urgentes no sistema, restará aos formadores de políticas públicas a pior das opções para resolver esta equação: mais impostos. "Temos hoje uma carga tributária pesadíssima (de 36% do Produto Interno Bruto) a sustentar todas as despesas do estado. Se os gastos com Previdência aumentarem ainda mais, imagina para onde vai essa conta", reflete Caetano.
Leia mais notícias sobre aposentadoria