Economia

Após demissão de Levy, BNDES pode ganhar ênfase na privatização

Governo ainda quer que a troca no comando do banco reforce o discurso de "despetização" do BNDES

Joaquim Levy: presidente do BNDES pediu demissão após Bolsonaro dizer que ele estava com "a cabeça a prêmio" (José Cruz/Agência Brasil)

Joaquim Levy: presidente do BNDES pediu demissão após Bolsonaro dizer que ele estava com "a cabeça a prêmio" (José Cruz/Agência Brasil)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 17 de junho de 2019 às 12h08.

Última atualização em 17 de junho de 2019 às 14h57.

Brasília — A saída de Joaquim Levy da presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), depois de ter sua "cabeça colocada a prêmio" pelo presidente Jair Bolsonaro, abre espaço para uma reformulação no papel do banco pela equipe econômica, que já pensa em concentrar a gestão das privatizações na instituição. O governo ainda quer que a troca no comando do banco reforce o discurso de "despetização" do BNDES.

O novo presidente terá que colocar em prática a promessa de campanha de Bolsonaro de abrir o que chama de "caixa-preta" do banco e investigar a responsabilidade pelos financiamentos concedidos, nos governos do PT, a empreiteiras para obras no exterior, em países como Cuba e Venezuela.

Um dos nomes mais cotados para assumir a vaga é do secretário de Desestatização e Desinvestimento do Ministério da Economia, Salim Mattar. Dono da Localiza, Mattar foi chamado para tocar no governo o plano de privatizações - cuja meta é obter só neste ano US$ 20 bilhões -, mas tem enfrentado resistência de outros ministros. Nas últimas semanas Mattar manteve conversas com Bolsonaro.

Levy informou na manhã deste domingo, 16, que entregou seu pedido de desligamento do cargo ao ministro da Economia, Paulo Guedes. Também são cotados para presidir o BNDES o ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco, que assumiu neste ano a presidência do conselho do banco, Carlos Thadeu de Freiras, ex-diretor da instituição, e Solange Vieira, funcionário de carreira do BNDES e atual presidente da Superintendência de Seguros Privados (Susep).

Segundo fontes da equipe econômica, com a redução do tamanho do banco na concessão de crédito, o BNDES perdeu a relevância que tinha em governos anteriores para o fomento da economia e, poderia assim, assumir também outras funções, como a de gerir privatizações. Além de ter de devolver R$ 126 bilhões neste ano, o banco também pode perder os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) pela proposta do relator da reforma da Previdência, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP).

Alterações

O BNDES já tem papel auxiliar em privatizações do governo e foi, por exemplo, responsável por estruturar projetos de desestatização das distribuidoras do sistema Eletrobras. Para concentrar no banco todas as fases do processo de privatização e não apenas a estruturação de projetos, o governo precisaria de alterações legais, que teriam de ser aprovadas no Congresso.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que ficou "perplexo pela forma como o ministro tratou o Joaquim (Levy)". Para ele, o ex-ministro era um quadro de qualidade que ajudaria a garantir as reformas que o País precisa neste momento.

No sábado, 15, Bolsonaro disse estar "por aqui" com o economista e ameaçou demiti-lo caso ele não suspendesse a nomeação de Marcos Barbosa Pinto - que já tinha trabalhado no banco como assessor em 2005 e 2006, no governo PT - para a diretoria de Mercado de Capitais. Após as declarações, Pinto pediu demissão. Ainda no sábado, Guedes disse ao site G1 que entendia a "angústia" de Bolsonaro.

Bolsonaro e alguns de seus aliados mais próximos nunca engoliram a nomeação de Levy. Ele foi secretário de Fazenda no governo de Sérgio Cabral (MDB-RJ) e ministro da Fazenda no primeiro ano do segundo mandato da ex-presidente Dilma Rousseff. O economista também foi secretário do Tesouro no governo Luiz Inácio Lula da Silva e integrou a equipe econômica do governo Fernando Henrique Cardoso.

Além de não abrir a "caixa-preta" do BNDES e colocar resistência à devolução dos recursos aos cofres do Tesouro neste ano, Levy foi contrário a colocar em prática um plano de demissão voluntária para enxugar o tamanho do BNDES. Na avaliação de fontes da equipe econômica, foi "dominado" pelo "espírito corporativo" dos funcionários do banco.

Ao pedir demissão neste domingo, em mensagem enviada a Guedes, o economista agradeceu a lealdade, dedicação e determinação de sua diretoria e aos inúmeros funcionários do BNDES.

Levy é a primeira baixa na equipe de Guedes. Na semana passada, o presidente demitiu três nomes importantes do alto escalão: os generais Franklimberg Ribeiro de Feitas (da presidência da Funai), Juarez Aparecido de Paulo Cunha (da presidência dos Correios) e Carlos Alberto dos Santos Cruz (ministro Secretaria de Governo).

Procurado pela reportagem, Levy não se manifestou.

Ato

Na próxima quarta-feira, dia 19, véspera do aniversário de 67 anos da criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a Associação dos Funcionários do banco vai promover um ato "contra a antipatriótica desconstrução do BNDES", segundo nota divulgada anteontem pela entidade.

O ato foi marcado no dia 13 de junho, portanto antes da demissão do presidente do banco, Joaquim Levy, mas ganhou maior repercussão após o episódio. Segundo a associação, cinco ex-presidentes do BNDES foram convidados para o protesto: Dyogo de Oliveira, Paulo Rabello de Castro, Luciano Coutinho, Luiz Carlos Mendonça de Barros e André Franco Montoro Filho.

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