Economia

BM: economia global deve operar em plena capacidade em 2018

Diretor do Banco Mundial ressalta que momento é "solidário" aos mercados emergentes e às economias em desenvolvimento

AYHAN KOSE: "2018 caminha para ser o primeiro ano desde a crise financeira em que se espera que a economia global opere com toda ou quase toda sua capacidade" (foto/Divulgação)

AYHAN KOSE: "2018 caminha para ser o primeiro ano desde a crise financeira em que se espera que a economia global opere com toda ou quase toda sua capacidade" (foto/Divulgação)

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Flávia Furlan

Publicado em 8 de fevereiro de 2018 às 18h54.

Dez anos após a quebra do banco Lehman Brothers, marco da última grande crise econômica global, enfim, a economia do mundo deverá voltar a operar com sua plena capacidade financeira. É o que acredita Ayhan Kose, diretor do grupo de perspectivas de desenvolvimento econômico do Banco Mundial.

Para o especialista, o momento é especialmente favorável para as economias emergentes, mas a recuperação dos países mais desenvolvidos já chegou a um patamar de normalidade, especialmente quando se leva em conta a renda per capita. “Espera-se que o crescimento nas regiões com um número significativo de exportadores de mercadorias – América Latina, África Subsaariana e Oriente Médio – se fortaleça neste ano”, diz Kose. Leia, abaixo, a entrevista na íntegra.

A economia mundial passa por um período de “grande estabilidade” com baixo crescimento?

A economia global está em um período de recuperação sincronizada neste momento. Os fatores que comprovam esta retomada incluem o estímulo contínuo de políticas monetárias e os legados menores de crises nas economias desenvolvidas, somado a uma retomada da atividade dos exportadores de mercadorias à medida em que o impacto da queda dos preços da commodities se dissipa, além do crescimento robusto em toda a Ásia. Esta melhoria levou a uma aceleração que se autofortalece no investimento e comércio global em muitas economias, o que contribui para uma sensação de otimismo no mercado financeiro e uma confiança global elevada. Diante deste cenário, o Banco Mundial prevê que o crescimento global tenha uma média de aproximadamente 3% ao longo do período 2018-2020, o que é um desempenho robusto para os padrões pós-crise. A retomada generalizada é encorajadora, mas o crescimento potencial – à medida de quão depressa uma economia consegue se expandir quando seu trabalho e capital são plenamente empregados – tem desacelerado ao longo da última década. É necessário levar a cabo medidas políticas para promover um crescimento potencial de modo que se tenha crescimento sustentado no médio e longo prazos.

Quando isso começou e quanto tempo isso pode durar?

Esta retomada começou em meados de 2016 e ganhou ritmo ao longo de 2017. É difícil ter ideia de quanto tempo irá durar, mas o que nós sabemos é que o atual ritmo de expansão provavelmente está acima do que a economia global consegue manter no médio prazo. 2018 caminha para ser o primeiro ano desde a crise financeira em que se espera que a economia global opere com toda ou quase toda sua capacidade. A mudança é particularmente notável nas economias desenvolvidas, em que as diferenças de rendimento serão ultrapassadas em uma maioria de países neste ano, uma alta comparada a uma pequena fração nos anos anteriores. À medida que as diferenças de rendimento caem e o crescimento se mantém em um volume superior ao potencial, a inflação global pode crescer, e se espera que a política monetária se normalize nas economias avançadas. Um progresso assim pode acontecer sem sobressaltos, mas uma ressurgência da inflação mais rápido do que o previsto atualmente poderia pegar os mercados financeiros com a guarda baixa e causar uma contração abrupta das condições financeiras globais. Isso prejudicaria os devedores mais vulneráveis, inclusive nos mercados emergentes e nas economias em desenvolvimento.

Quais são os riscos políticos ou geopolíticos deste período?

Os riscos ao panorama mundial estão se tornando mais equilibrados, principalmente graças à possibilidade de um crescimento mais sólido do que o esperado nas economias avançadas, nos mercados emergentes e nas economias em desenvolvimento. No entanto, os riscos de recessão continuam a prevalecer. Uma alta súbita nos encargos financeiros de empréstimos, desencadeada por uma revisão da normalização no ritmo das políticas monetárias das economias avançadas ou preocupações crescentes sobre valorizações elevadas de ativos poderiam conduzir a estresse financeiro e interromper os fluxos de capital para mercados emergentes e economias em desenvolvimento. Restrições comerciais progressivas poderiam descarrilar o processo de recuperação dos negócios e desfazer conquistas de esforços passados de liberalização. A incerteza na política mundial continua elevada, e ainda pode reduzir a confiança e as atividades. Os riscos geopolíticos e as condições frágeis de segurança em algumas regiões também são uma fonte contínua de preocupação, além de poderem retardar a atividade tanto regional quanto global em casos de um agravamento severo. No longo prazo, uma desaceleração mais pronunciada no crescimento potencial da produção tanto nas economias avançadas quanto nos mercados emergentes e economias em desenvolvimento tornaria a economia global mais vulnerável a choques e pioraria as perspectivas de condições de vida melhores.

Como os países emergentes, em especial o Brasil, estão lidando com este período?

As condições econômicas mundiais hoje são solidárias aos mercados emergentes e economias em desenvolvimento. O comércio global tem crescido desde 2017, o que beneficiou a maioria das regiões em desenvolvimento por meio de um crescimento mais sólido das exportações. As condições financeiras mundiais até aqui têm se mantido favoráveis, e os preços de commodities têm se recuperado, proporcionando um clima mais propício para os exportadores de mercadorias. Neste contexto, espera-se que o crescimento nas regiões com um número significativo de exportadores de mercadorias – América Latina, África Subsaariana e Oriente Médio – se fortaleça neste ano, mas por enquanto ainda não será o bastante para dar continuidade ao processo de recuperação da renda per capita nos níveis das economias avançadas. No Brasil, o crescimento também está melhorando depois de dois anos de contração. Além das melhorias cíclicas recentes, o potencial de crescimento da maioria dos mercados emergentes e economias em desenvolvimento também tem caído ao longo da última década, o que reflete uma produtividade enfraquecida e um crescimento menor nos investimentos. Dados populacionais desfavoráveis também podem se tornar um obstáculo progressivo ao crescimento futuro para algumas destas economias. Isto enfatiza a importância de políticas fiscais responsáveis e da implementação mais rápida de reformas que favoreçam o crescimento.

Como a globalização está sendo afetada por este período?

O protecionismo comercial tem se tornado um ponto focal importante nas discussões recentes sobre política. Esta é uma fonte de preocupação importante. Uma espiral ascendente de políticas monetárias que favoreçam um país e prejudiquem seus vizinhos poderia causar um recuo no processo de liberalização comercial que tem contribuído em grande medida para intensificar o comércio nas últimas décadas. O comércio internacional é essencial para sustentar o crescimento, desenvolvimento e redução da pobreza. Enquanto as economias em desenvolvimento têm expandido a participação delas tanto no comércio quanto nos fluxos de investimento ao longo das últimas duas décadas, o número de pessoas vivendo em situação de pobreza extrema caiu pela metade. Devido à confiança destas economias em fluxos comerciais, um aumento das barreiras comerciais possivelmente impactaria significativamente nos países de baixa renda. Medidas que afetem negativamente os interesses econômicos destas nações diminuíram nos últimos anos, mas essa tendência pode se reverter, como foi visto no período imediatamente posterior à crise.

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