Inflação: entender essa marca vai além de saber qual produto ficou mais caro na feira ou no supermercado (Reprodução)
Da Redação
Publicado em 21 de novembro de 2015 às 13h18.
Aconteceu o que já era imaginado e temido: a inflação rompeu a barreira dos 10% ao ano. Em novembro deste ano, chegou precisamente aos 10,28% em 12 meses – o maior registro para o período desde 2003.
A informação foi dada na divulgação do IPCA-15. Embora apelidado de prévia da inflação, o índice não é uma estimativa. É calculado com a mesma metodologia do IPCA (a popular inflação oficial).
A única diferença está nos dias em que é pesquisado: o IPCA-15 calcula a variação média dos preços entre os dias 15 do mês anterior e o do mês seguinte. Já o IPCA, pega todos os dias do mês em questão, do primeiro ao último.
Mas vamos ao que interessa: por que a inflação passou dos 10% ao ano?
Entender essa marca vai além de saber qual produto ficou mais caro na feira ou no supermercado – por exemplo, o tomate ficou 15,23% mais caro na média; o açúcar, 9,61%; e o arroz, 4,10%. Mas não houve nenhum choque de oferta (frustração de previsão natural da produção) de nenhum produto para explicar a situação geral da inflação.
Destacamos, assim, 6 das escolhas feitas pelo governo nos últimos anos, responsáveis diretas por fazer do Brasil um dos países mais caros de se viver atualmente.
Nos últimos anos o governo brasileiro tentou estimular a economia com políticas fiscal e monetária bem expansionistas. Ou seja, gastou muito e baixou os juros na marra. Mas a economia não bombou como se esperava.
O estímulo só gerou inflação mais alta mesmo. Parte dessa inflação elevada, plantada lá atrás, está sendo colhida agora. Por quê? Por que produtores fixam preço também baseados na inflação passada, o que gera persistência dessa taxa. Os economistas emprestam da física o termo inércia para explicar o efeito.
Os físicos dizem o seguinte: todo corpo físico, se está parado, prefere ficar assim. Mas se recebe um chutão, tende a continuar seguindo na direção para a qual foi empurrado.
Quanto mais forte o chute, mais difícil conter esse objeto, que se move sozinho para onde foi projetado. Ele precisa de obstáculos ainda mais poderosos para aquietar o faixo.
Na tentativa de segurar a inflação nos últimos anos, o governo deixou de reajustar alguns preços que ele controla, os tais preços administrados.
Dentre eles, estão combustíveis e energia. Mas as empresas prestadoras desses serviços chegaram num ponto insustentável. Estavam perdendo dinheiro para fornecer seus serviços e se endividando enormemente.
Daí não teve jeito: o governo foi obrigado a soltar a corda; os preços administrados estão caminhando, de uma vez só, para onde deveriam ter ido vagarosamente nos últimos anos.
De acordo com o IPCA-15 de novembro, para se ter ideia, em 12 meses, os combustíveis ficaram nada menos que 22% mais caros na média; e o preço da energia elétrica residencial subiu quase 53%.
O real perdeu muito valor frente ao dólar neste ano – em janeiro, o dólar custava perto de 2,70 reais; hoje, beira os 4 reais por dólar. E quando o real se desvaloriza, os preços dos produtos e insumos importados se elevam.
Isso pressiona a média dos preços, impulsionando a inflação. Você vai entender melhor este efeito com apenas pouco mais de 2 minutinhos de Economia Animada:
O ajuste fiscal não sai das manchetes dos jornais. Mas parece estar grudado no papel, não entra em prática. Já estamos no final do ano, as lojas, vazias, já estão enfeitadas para o Natal, mas o governo mostra incapacidade de fazer vingar o pacote que faria o Brasil gastar menos dinheiro do que tem em caixa. Parte da oposição também tem sua parcela de responsabilidade aí: se não ajuda, só faz atrapalhar.
Cresceu assim a quase certeza de que o governo brasileiro não conseguirá, de novo, pagar suas contas em dia em 2015. Essa condição passa a mensagem de que um belo de um calote pode estar por vir.
Investidores, diante disso, não colocam um centavo sequer deles no Brasil. Isso implica reduzir a entrada desses dólares, portanto, no país.
Quando existe menos qualquer coisa no mercado, o que acontece? Essa qualquer coisa aí fica mais cara (veja noções sobre escassez). Com o dólar não é diferente e o aumento do preço dessa moeda (desvalorização do real) puxa para cima os preços de matérias-primas e de produtos integralmente importados. Enfim, o não ajuste fiscal colabora ainda mais para o item tratado anteriormente.
Sem ajuste fiscal, cresce também a chance de o governo precisar recorrer à impressão de moeda no futuro para se financiar. E impressão de moeda implica aumentar a inflação.
Por quê? Porque quando há mais dinheiro nas mãos das pessoas, pela simples impressão de novas notas, ele perde o seu valor. E se ele perde seu valor, consequentemente, quer dizer que os produtos estão mais caros.
Essa expectativa de mais inflação lá na frente faz com os produtores já façam reajustes de preços hoje. A situação é curiosa: por medo de os preços subirem no futuro, os comerciantes já remarcam seus preços no presente.
Qual o resultado dessa atitude? Exatamente o que eles temem: mais inflação. Esse processo, repetido várias vezes, faz a inflação se retroalimentar, num efeito dominó difícil de ser contido – algo semelhante ao primeiro item, inércia.
Este item merece poucas linhas: o desgaste do governo com sua base aliada e a apatia da oposição dificultam a aprovação de medidas de ajuste e potencializam todos os pontos discutidos acima.