Economia

Inflação além do esperado reforça visão de alta da Selic (e crise em 2022)

A desaceleração menor que o previsto no IPCA-15 vem junto às expectativas de que o Banco Central possa confirmar aumento de 1,5 ponto percentual na taxa de juros já em fevereiro

Banco Central: expectativa é que taxa Selic chegue a 10,75% em fevereiro (Ueslei Marcelino/Reuters)

Banco Central: expectativa é que taxa Selic chegue a 10,75% em fevereiro (Ueslei Marcelino/Reuters)

CR

Carolina Riveira

Publicado em 26 de janeiro de 2022 às 16h25.

A prévia da inflação oficial divulgada nesta quarta-feira, 26, não deixa dúvidas: o caminho será duro em 2022 para que a inflação fique dentro do teto da meta e na casa dos 5% que foram previstos nas estimativas de começo do ano.

O IPCA-15, que mede as variações de preços até meados de cada mês, ficou em 0,58% em janeiro e 10,20% no acumulado em 12 meses, desacelerando em relação a dezembro. Ainda assim, terminou pior do que as expectativas. A mediana das projeções do mercado previa uma alta mensal bem menor, de 0,44%. 

"Em suma, uma leitura bem desfavorável [no IPCA-15], com núcleos acima do esperado", escreveu o Banco Sanfra em relatório nesta quarta-feira.

A alta reforça as expectativas de que o Banco Central possa chegar a aumento de 1,5 ponto percentual na taxa Selic já em fevereiro, conforme chegou a pontuar ata no fim do ano.

A próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) está marcada para a semana que vem, em 1º e 2 de fevereiro, quando o comitê decidirá sobre a taxa.

A Selic começou 2021 em baixa histórica de 2,25% e está hoje em 9,25%, tendo sido progressivamente aumentada como resposta do Banco Central à inflação. Se a alta prevista para fevereiro for confirmada pelo Copom, a Selic chegaria, portanto, a 10,75%. 

O consenso do mercado até agora vê a Selic aumentando ainda mais nas próximas reuniões do Copom depois de fevereiro.

No último boletim Focus, a mediana dos analistas ouvidos projeta Selic em 11,75% no fim de 2022 e depois caindo para 8,0% em 2023.

Como a EXAME mostrou, as projeções do mercado apontam para uma alta que faça a Selic chegar aos 11,75% já em maio. Depois disso, as visões divergem: em uma perspectiva mais otimista, algumas casas de análise e bancos projetam que cortes possam ocorrer nas reuniões seguintes até o fim do ano, trazendo a taxa para mais perto dos 11% do que dos 12%.

Mas economistas têm pontuado que, em meio a componentes inflacionários como risco fiscal e político e cenário internacional desfavorável, o Banco Central age quase sozinho no combate à inflação, sem apoio do governo federal.

Desaceleração será suficiente?

A desaceleração dos preços tem ocorrido de fato nos últimos meses, sobretudo com ajuda de uma queda recente nos preços dos combustíveis no mercado internacional, além da própria alta de juros e economia estagnada.

O IPCA-15 mensal e o IPCA oficial (que diz respeito ao mês completo) estão em queda após um pico em outubro:

  • Outubro: IPCA-15 foi de 1,20% (e IPCA 1,25%)
  • Novembro: 1,17% (IPCA 0,95%)
  • Dezembro: 0,78% (IPCA 0,73%)
  • Janeiro: 0,58% (IPCA ainda não divulgado)

Como o acumulado em 12 meses é hoje de mais de 10%, para que a meta de inflação para este ano seja atingida, os preços precisam seguir desacelerando nos próximos meses.

E o resultado inflacionário de janeiro até agora reforça a leitura de que será ainda mais difícil do que o previsto cortar a inflação pela metade até o fim do ano.

No boletim Focus de segunda-feira, 24, a projeção para o fim de 2022 voltou a subir, com mediana para o IPCA agora em 5,15%. E mesmo essa projeção, que pode ainda ser revisada para cima, já passa do teto da meta do Banco Central (que é de 3,5%, com tolerância de 1,5 ponto percentual, ou seja, com um teto de 5,0%).

"O resultado de hoje segue indicando pressões inflacionárias elevadas e uma composição desfavorável para a inflação, com núcleos pressionados e inflação altamente disseminada", escreveu em nota a clientes sobre o IPCA-15 o economista Bruno Balassiano, do banco BTG Pactual (do mesmo grupo que controla a EXAME).

"A surpresa [com a alta do IPCA-15] dá viés altista à nossa projeção de 0,45% para o IPCA de janeiro", completa a nota.

Posto Ipiranga

Posto de gasolina: combustíveis devem seguir sendo dor de cabeça em 2022, com alta no mercado internacional  (Alexandre Battibugli/Exame)

Tempestade perfeita

Assim, para a economia como um todo, as perspectivas de 2022 são ruins. A queda esperada para a inflação, ainda que se confirme, virá invariavelmente ao lado da estagnação da atividade econômica, desemprego alto e renda da população encolhendo.

O Brasil tem uma das piores projeções de crescimento do PIB do mundo em relatório divulgado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) nesta semana. A alta projetada para o país é de somente 0,3% na visão do FMI, muito abaixo da média de 2,4% da América Latina. O crescimento brasileiro previsto perto de zero não é exclusividade do FMI, sendo acompanhado em projeções de bancos e casas de análise nacionais.

Além disso, o campeão de inflação em 2022 foram os combustíveis - que chegaram a subir na casa dos 40% no ano passado -, uma frente que desacelerou em janeiro no IPCA-15, mas seguirá dando dor de cabeça aos brasileiros.

Apesar de alguma queda no preço do barril de petróleo no mercado internacional no fim do ano, o barril do tipo Brent já está acima de 80 dólares e não se descarta que possa chegar a 100 dólares. Até mesmo a nova crise entre Ucrânia e Rússia no leste europeu, que impacta grandes produtores de petróleo na região, pode trazer problemas na oferta e aumento de preços globalmente.

O governo federal têm defendido uma redução de impostos como saída e pode apresentar ainda nesta semana uma Proposta de Emenda à Constituição que reduza tributos federais sobre os combustíveis. Mas a medida tem alto custo fiscal, leva o governo a abrir mão de receita que poderia ser usada para outros serviços à população e, mesmo assim, pode ter pouco impacto prático nos preços finais.

Outro desafio é que a inflação global vista na pandemia vem também dos choques de oferta, isto é, com gargalos na cadeia de suprimentos na indústria e a disrupção provocada pela crise do coronavírus. Já os aumentos na taxa de juros atuam sobretudo na frente da demanda - mas esta já está deprimida no Brasil com a crise e o desemprego, apontam economistas, tornando a tarefa da política monetária ainda mais complexa.

Ao contrário do que ocorre com outros países, que têm visto também um componente de inflação pela demanda (devido ao baixo desemprego, incentivos governamentais dos países ricos e retomada econômica), o Brasil corre o risco de combinar o pior dos dois mundos: estagnação na economia e juros elevados, mas com inflação ainda perigosamente alta.

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