Carnes: no caso de Hong Kong e Catar, e também de outros destinos como Argélia e México, que mantêm barreiras generalizadas, a ABPA estima que uma solução seja encontrada em breve (Nacho Doce/Reuters)
Reuters
Publicado em 27 de março de 2017 às 17h00.
São Paulo - Os embargos temporários impostos por Hong Kong e Catar às carnes brasileiras são os principais problemas enfrentados neste momento por exportadores de aves e suínos do Brasil, disse nesta segunda-feira a associação que representa as indústrias, 10 dias após a deflagração da Operação Carne Fraca, da Polícia Federal.
"O que nos deixa ainda aflitos, e onde a gente espera que aconteça um entendimento em breve, é em Hong Kong e Catar. São dois grandes compradores", disse à Reuters o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal, Francisco Turra.
Hong Kong sozinho representou 1,6 bilhão de dólares em faturamento nas exportações de carnes do Brasil em 2016, segundo dados do governo federal.
Desde o anúncio da Polícia Federal, que encontrou irregularidades na liberação de produtos em alguns frigoríficos do país, com indícios de corrupção envolvendo fiscais agropecuários e funcionários das empresas, 35 países anunciaram algum tipo de medida preventiva.
Logo no início, restrições amplas impostas por China e Hong Kong, principais compradores das proteínas brasileiras, foram as que mais impactaram o setor, junto com cortes parciais pela União Europeia e outros importantes mercados como Japão e Arábia Saudita.
No fim de semana, os empresários comemoraram o recuo da China e do Egito, após fortes negociações feitas pelo governo brasileiro e por entidades do setor.
"Nesse momento estou bem mais aliviado. Está contando muito o fato do Brasil ter demonstrado historicamente uma boa condição sanitária. Nunca teve gripe aviária e pestes suínas", disse Turra, referindo-se às notícias mais recentes.
União Europeia, Japão, Arábia Saudita e Emirados Árabes são exemplos de países que proibiram a entrada de carnes apenas de unidades envolvidas na investigação da Polícia Federal, que representam uma pequena fração do total de abatedouros no país habilitados para exportar.
Apesar disso, os impactos foram sentidos pelo setor num primeiro momento.
As exportações de carnes do Brasil na quarta semana de março atingiram 50,5 milhões de dólares em média diária, com queda de 19 por cento em relação ao valor registrado, na média diária, até a terceira semana do mês (62,2 milhões de dólares), segundo dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços divulgados nesta segunda-feira.
No caso de Hong Kong e Catar, e também de outros destinos como Argélia e México, que mantêm barreiras generalizadas, a ABPA estima que uma solução seja encontrada em breve.
"A gente sabe, por nossos agentes lá fora e pelo nosso Ministério da Agricultura, que faltam poucos esclarecimentos", disse Turra, apostando que a comunicação entre autoridades, com garantias de qualidade dos produtos brasileiros, poderá reabrir o comércio com esses países.
Ao todo, segundo o Ministério da Agricultura, há 14 países com restrições mais amplas que os 21 abatedouros citados na Operação Carne Fraca.
A posição do Brasil como grande fornecedor global de carne de frango e bovina, e de um exportador relevante de carne suína, também faz com que os compradores avaliem com cuidado qualquer manutenção de embargo.
Turra lembrou que 37 por cento de todo o comércio global de carne de frango é dominado pelo Brasil, que é responsável, por exemplo, por quase metade de todo o consumo desse tipo de proteína no Oriente Médio.
"Isso tudo nos ajuda. Não tem alternativa tão fácil (à carne do Brasil)", disse o executivo.
A Coreia do Sul foi um bom exemplo, na avaliação do diretor técnico da consultoria IEG FNP, José Vicente Ferraz, lembrando que o país asiático reverteu suas restrições poucos dias depois de anunciá-las.
"Três ou quatro dias antes da operação, a Coreia do Sul tinha banido a importação dos Estados Unidos (de carne de frango, por problemas com gripe aviária). Não dá pra substituir esses dois. A Coreia do Sul resolveu voltar atrás, acredito, porque observou que o problema no Brasil era muito mais de corrupção do que de qualidade do produto", disse o analista.
Na opinião dos especialistas, neste cenário de dependência da oferta brasileira, há pouco espaço para os importadores realizarem grandes renegociações de preços.
"Momentaneamente o Brasil poderia (renegociar), pelo volume de produto que tem 'no mar' e no porto, aceitar preços mais baixos. Mas seria tão transitório, e não valeria a pena para os compradores barganharem. Há o interesse de um fornecimento permanente, e a nossa indústria não poderia aceitar preços mais baixos", disse Turra, argumentando que as fábricas brasileiras já operam com margens apertadas.
Ainda assim, a percepção é de que pode haver prejuízos --ainda difíceis de contabilizar-- para a reputação do produto brasileiro.
"Houve uma depreciação das marcas envolvidas e do conceito 'Brasil' de qualidade. Os nossos clientes internacionais estão pedindo esclarecimentos", ponderou Ferraz.