O ministro da Economia, Paulo Guedes, durante audiência pública na Comissão Mista de Orçamento. Guedes fala sobre o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentarias (LDO) 2020. (Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
Ligia Tuon
Publicado em 14 de maio de 2019 às 14h56.
Última atualização em 14 de maio de 2019 às 19h56.
São Paulo — O ministro a Economia, Paulo Guedes, participou nesta terça-feira (14) de sessão na Comissão Mista de Orçamento (CMO) da Câmara, para justificar o pedido da União por um crédito suplementar de 248 bilhões de reais.
O pedido foi enviado à Casa em março, já que o Orçamento aprovado para o ano de 2019 não prevê receitas recorrentes suficientes para pagar pensionistas do INSS, idosos em situação de miséria e beneficiários do Bolsa Família já a partir de julho.
Guedes começou sua fala detalhando o valor solicitado. Do total, R$ 200 bilhões são para o INSS, R$ 30 bilhões para o Benefício de Prestação Continuada (BPC), R$ 6 bilhões para o Bolsa Família e quase R$ 10 bilhões para o Plano Safra.
São despesas correntes que o esgotamento fiscal não permite que sejam atendidas com receitas corretes, segundo ele. Na analogia do ministro: "Isso mostra o drama e o tamanho do buraco. O buraco da Previdência virou um buraco negro fiscal que ameaça engolir o Brasil".
Sem a aprovação do Congresso, o governo pode incorrer em crime de responsabilidade, passível de impeachment, porque a lei não permite que a União se endivide para pagar despesas correntes. "É como se endividar para pagar o almoço e o jantar", explicou Guedes aos deputados.
O governo ainda vai recorrer a outras fontes, do ponto de vista fiscal, segundo Guedes, como "devoluções de dívida do BNDES, cessão onerosa etc".
O ministro alertou ainda para o processo de endividamento acelerado no país, "correndo como bola de neve".
Se nenhuma reforma for aprovada, a expectativa dos economistas do governo é de que o déficit primário, previsto para ser de R$ 139 bilhões neste ano, caminhe para R$ 124 bilhões em 2020, R$ 68 bilhões em 2021 e R$ 31 bilhões em 2022.
"O número cai, por causa do teto que limita os gastos do governo", explica. Enquanto as despesas batem no teto, no entanto, as receitas sobem bem lentamente.
"Os indicadores fiscais têm piorado nos últimos seis anos. De 2010 a 2018, o país cresceu 0,6%, a renda per capta está crescendo, em média, menos de 1% ao ano há mais de 30 anos", diz Guedes.
Apesar de o governo ainda trabalhar oficialmente com a previsão de 2,2% de crescimento do PIB em 2019, Guedes disse na Câmara que a projeção "já caiu para 1,5%" e, com isso, "começam os planejamentos de contingenciamentos". O ministro confessou que sempre olhou para as estimativas de crescimento em torno de 2% "com ceticismo".
Segundo Guedes, a desaceleração do crescimento econômico reduz as receitas do governo e torna necessário o contingenciamento (bloqueio) de verbas do Orçamento. Ele esclareceu que o contingenciamento é temporário e não representa cortes definitivos e se disse confiante de que a aprovação das reformas melhorará o quadro fiscal.
O secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, que falou logo após Guedes, confirmou que o próximo Relatório Bimestral de Receitas e Despesas, que apresenta estimativas para a execução do Orçamento, trará novos contingenciamentos.
"Estamos revisando nossa projeção para o PIB com viés de baixa. A nova projeção para o PIB em 2019 será menor que 2%", anunciou Rodrigues Júnior.
Ele ponderou, contudo, que o governo tem ferramentas e ações para fazer a economia brasileira reagir de forma intensa e rápida, mencionando as reformas propostas, com destaque para a da Previdência.
O ministro da Economia disse antes que está absolutamente confiante de que as reformas propostas pelo governo de Jair Bolsonaro serão aprovadas. "Aprovando as reformas, o Brasil volta a crescer 2%, 3% e os pesadelos fiscais que bloqueiam investimentos vão desaparecer", acrescentou ele, mencionando estar confiante quanto à aprovação das reformas na Câmara e no Senado.
Guedes frisou ainda que, com o futuro fiscal do Brasil assegurado, será possível desentupir a linha de investimentos. "Com cinco, dez anos de equilíbrio garantido pelas reformas, teremos o retorno dos investimentos em infraestrutura, educação, saúde", afirmou o ministro.
A política de reajuste do salário mínimo só será definida perto do fim do ano e depende do avanço das reformas estruturais, principalmente a da Previdência, disse o ministro. Segundo ele, a LDO de 2020 apenas faz estimativas da correção pela inflação, sem estabelecer uma política definitiva sobre o tema.
Atualmente, o salário mínimo está em R$ 998. A proposta de LDO enviada ao Congresso prevê um salário mínimo de R$ 1.040 em 2020, sempre seguindo as expectativas de variação pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC)
O governo pode até conceder reajustes reais (acima da inflação), caso as reformas sejam aprovadas, e a economia volte a crescer com mais vigor.
"Não definimos a política de salário mínimo. Isso naturalmente passa pelas reformas. Podemos seguir, ano a ano, observando. Se a conjuntura for favorável e as reformas progredirem, obtemos fôlego para anunciarmos algo mais à frente e mais audacioso", declarou Guedes.
Guedes lembrou que cada R$ 1 de aumento no salário mínimo tem impacto de R$ 300 milhões no Orçamento da União. "É pouco para quem recebe, caro para quem paga e desastroso para o quadro fiscal. Por uma atitude de prudência, temos a possibilidade, até 31 de dezembro, de criar uma nova trajetória para o salário mínimo", explicou.
Até 2019, o mínimo era reajustado por uma fórmula que prevê o INPC do ano anterior mais o crescimento do PIB de dois anos antes. A partir do próximo ano, o governo pode definir uma nova política para os próximos quatro anos ou negociar o valor do salário mínimo com o Congresso Nacional ano a ano.
"Nós entramos em situação fiscal extraordinariamente difícil. Nos últimos dois anos, a política para o salário mínimo seguiu estritamente a manutenção do poder aquisitivo, pela correção pelo INPC. Por uma atitude de prudência, temos a possibilidade, até 31 de dezembro, de criar uma nova trajetória para o salário mínimo. Então achamos prudente observar", acrescentou Guedes.
Guedes concordou com a afirmação da senadora Kátia Abreu de que há espaço para reduzir os juros no Brasil, mas ponderou que, como o Banco Central é independente, não poderia comentar sobre o tema.
"O Banco Central fica doido para que ocorra o ajuste fiscal para permitir juro mais baixo e estimular economia. Como o BC é independente, não falo sobre juros", disse ele, durante audiência da CMO.
Guedes enfatizou, contudo, que a culpa dos juros não caírem mais no Brasil não é tanto do Banco Central. "Na hora que dermos horizonte fiscal equacionado, o juros descem naturalmente", acrescentou.
Questionado sobre a cobrança de impostos nos setores de saúde e educação, o ministro da Economia afirmou que há situações paradoxais no Brasil e que é preciso olhar esse tema no Brasil. Como exemplo, Guedes citou o fato de a classe média estudar em escolas isentas e pessoas de menor condição social frequentarem instituições que pagam impostos.
"Não pode haver favorecimento a famílias que tenham condições. Os mais favorecidos se tratam no (Albert) Einstein, que é isento. A classe média frequenta escolas como FGV e Ibre, que são isentas, enquanto a filha da doméstica estuda em escola que paga imposto.
O ministro da Economia chamou atenção ainda para a necessidade de remover "dos que têm mais". Não há recurso público, conforme ele, para fazer esse tipo de "favor".
Guedes disse ainda que houve desvio “enorme” do papel das empresas estatais e defendeu a privatização delas, ponderando que o presidente Jair Bolsonaro tem reticências com algumas. “Houve um desvio terrível. As estatais quebraram. Não foram só os Correios. Quebraram também os Postalis (fundo de pensão dos Correios). Cem mil carteiros estão sem receber suas aposentadorias”, afirmou.
O ministro mencionou a Petrobras e seu fundo de pensão, Petros, e também o Portus, fundo de pensão dos funcionários do Porto de Santos. “É um problema atrás do outro. A conta está chegando. São bilhões chegando.”
Ele, no entanto, lembrou que as decisões não dependem apenas dele, mas de ministros das pastas a que as empresas estão vinculadas e do presidente Jair Bolsonaro.
"Eu privatizaria. O presidente tem algumas reticências quanto a algumas, mas quem manda e tem voto é ele. Eu vou privatizando o possível. Quando ela se torna inviável, depois de dar prejuízo enorme para o país, depois de quebrar, deixar legado previdenciário terrível, aí é permitido. Até para salvar os aposentados [de fundos de pensão com problemas], pegar alguns recursos para salvar aposentadorias", disse.
O ministro defendeu principalmente a privatização de distribuidoras de energia e de saneamento, que não conseguem investir. "Muitas dessas empresas sofreram aparelhamento político, desgastes, saques. Na hora em que é privatizada, a gente pega ativos mal geridos e dinamiza investimento. Nos endividamos em bola de neve para carregar empresas que estão dando prejuízo, quebrando o Brasil e destruindo possibilidade de a própria oposição fazer as políticas sociais que gostaria de fazer", comentou.
O ministro disse que a reforma tributária a ser enviada ao Congresso após a aprovação da reforma da Previdência pretende rever as renúncias fiscais, por um lado, enquanto reduz tributos para toda a economia, por outro lado. "Ter R$ 300 bilhões de isenção nos machuca. De um lado, a renúncia de R$ 300 bilhões e, por outro, contenciosos [disputas na Justiça] de mais de R$ 1 trilhão. É um sintoma de que a sociedade brasileira está dividida entre quem tem lobby e a força política para conseguir isenção e os demais, que vão parar na Justiça porque os impostos são altos", disse.
De acordo com o ministro, se o Congresso aprovar a simplificação e a redução de alíquotas, não apenas as isenções serão muito menores como o volume de disputas judiciais diminuirá. "Se o imposto é mais razoável, ninguém vai para a Justiça, e ninguém vai fazer lobby para ser isento".
Guedes, disse que a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, tem a sugestão de destinar US$ 600 bilhões (algo em torno de R$ 2,5 bilhões) em multas da Petrobras para a educação.
"Preferencialmente, por recomendação da [procuradora-geral, Raquel] Dodge, e vai ser bem aceito lá fora, pode ser redirecionado para a educação. Algo que está sendo considerado também", declarou o ministro.
"A Petrobras está pagando uma multa importante pelo problema de corrupção, interrogação jurídica da SEC [Security Exchange Commission, dos Estados Unidos]. A tese da Dodge é de que a Petrobras foi vítima. Quem estava lá dentro perpetrou excessos e [a estatal] foi condenada a pagar US$ 600 milhões, quase R$ 3 bilhões, de multa. Pagam à União, que tem de redirecionar esse dinheiro".
Guedes reiterou que o contingenciamento de 30% do Orçamento discricionário (não obrigatório) da educação, na verdade, resulta num bloqueio de 3,6% da verba total para a área. Isso porque as verbas discricionárias equivalem a 12% do Orçamento. "Se formos fazer as contas, 30% de 12%, dá 3,6% do total", justificou.
O ministro disse que não participou da decisão de contingenciar as verbas da educação e que esse tipo de decisão cabe ao próprio Ministério da Educação e ao Palácio do Planalto. "Por mim, haveria apenas dez ministérios e todos com verbas bem menores", disse.
Em relação à renegociação do plano de carreira dos militares, o ministro disse que, quando as negociações ocorreram, a equipe econômica deixou claro que todo mundo tinha que contribuir com uma parcela de sacrifício. Guedes disse que o Ministério da Economia disse que o governo pediu que o projeto com os reajustes para a categoria fosse enviado posteriormente à proposta que reforma as aposentadorias e as pensões dos militares, mas que as Forças Armadas preferiram que as duas propostas fossem enviadas simultaneamente para evitar a impressão de que os militares estavam querendo se aproveitar da situação.
"Quando as negociações aconteceram, fomos claros de que todo mundo tem que entrar na Kombi [da reforma da Previdência]. Houve muita conversa sobre isso, de que todos devemos contribuir. A gente pediu para dividir a coisa em duas partes e enviar primeiro a reforma da Previdência dos militares e depois a reformulação de carreiras. Eles [os militares] disseram que era melhor encaminhar simultaneamente", disse.
Sobre os quase 13 milhões de desempregados, Guedes admitiu que esse é o principal desafio da economia brasileira, hoje. Ele reiterou que a criação de empregos depende da aprovação de reformas, principalmente a da Previdência, para reativar a economia.
"O desemprego hoje é o maior desafio. É o mais cruel fator de exclusão social. A inclusão no Orçamento dos menos favorecidos é fundamental, mas deve desembocar numa meta lá na frente de qualificação e de empregos. É o que dá dignidade e independência para a pessoa. Essa é nossa principal preocupação. Acontecendo as reformas, os juros descem, a economia cresce, os investimentos são retomados, e os empregos são criados", ressaltou.
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