Paulo Guedes diz que, sem imposto, não há desoneração da folha (Adriano Machado/Reuters)
Alessandra Azevedo
Publicado em 29 de outubro de 2020 às 15h34.
Última atualização em 29 de outubro de 2020 às 15h41.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, voltou a defender a criação de um novo imposto, nos moldes da antiga Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), nesta quinta-feira, 29, em audiência pública remota no Congresso. Mas, logo em seguida, declarou que "o imposto está morto", assim como a desoneração da folha de todos os setores da economia, que seria bancada pelo novo tributo. Para abrir mão da receita da contribuição previdenciária patronal, é preciso cobrar sobre transações digitais, defende o chefe da equipe econômica.
Durante a audiência, Guedes fez questão de afastar comparações com a CPMF e assegurou que não defende aumento de carga tributária. A ideia é apenas substituir cobranças, garantiu. “Nós somos liberais-democratas, nós não queremos aumentar impostos. Já chegaram a 36% do PIB [produto interno bruto], é alto demais”, reconheceu. A criação de um novo tributo é vista como opção “só se for para substituir oito outros impostos e só se for por uma causa muito nobre: desoneração, para criar emprego e renda para os brasileiros”, defendeu.
Guedes apontou a chegada do Pix, sistema de pagamentos instantâneos criado pelo Banco Central, que começa a funcionar em 16 de novembro, como evidência da necessidade de modernizar o sistema e cobrar sobre transações digitais. “Há um futuro digital chegando. O Brasil é a terceira ou a quarta maior economia digital do mundo. Nós vamos ter de ter o imposto digital mesmo”, ressaltou. Isso não significa, segundo ele, aumento de carga. “Nós vamos diminuir os outros [impostos], simplificar os outros, desonerar a mão de obra. Nós estamos indo para um futuro melhor”, reforçou.
A arrecadação seria usada para cobrir a desoneração da folha, assunto que ainda está indefinido no Congresso. Câmara e Senado têm sessões marcadas na próxima quarta-feira, 3 de novembro, para votar vetos do presidente Jair Bolsonaro a projetos sancionados — entre eles, o que trata da desoneração. O Executivo vetou a parte que estenderia para 2021 o benefício a 17 setores da economia. Cabe aos parlamentares a decisão de manter o veto ou derrubá-lo. Guedes defende a manutenção e, no lugar, a aprovação de um programa de desoneração permanente, para todos os setores da economia.
“Com a criação desse imposto alternativo, nós desoneraríamos a todos e para sempre e por mais tempo. Esse era o nosso tratamento recomendado”, disse Guedes. “Por que só 17 e por um ano? Só porque eles têm um lobby forte em Brasília? Eu prefiro desonerar todos para sempre em vez de só alguns por um ano”, defendeu. O problema é que a única contrapartida sugerida por ele é a criação do novo imposto sobre transações digitais, que tem muita resistência no Congresso e entre a opinião pública.
Pouco depois, Guedes disse que deve parar de falar sobre o assunto. “O imposto está morto, ele não existe. Enquanto não tiver o dinheiro, não posso aprovar a desoneração. Não tem imposto nenhum, não tem desoneração", disse. “Quem sabe eu tenho que parar de falar desse imposto, mesmo. Inclusive, estamos em véspera de eleição, e quero declarar o seguinte: considere esse imposto morto, extinto”, continuou, lembrando que, quando a ideia surgiu pela primeira vez, o então secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, foi exonerado. "Agora estamos em plena campanha eleitoral e ninguém quer discutir esse troço. O Ministro da Economia vai falar disso? Esquece. Esse imposto não existe", reafirmou.
Guedes disse que, quando o Ministério da Economia sugeriu o veto ao dispositivo da desoneração e sugeriu tributar transações digitais, ele recebeu tantas críticas que abriu mão de discutir o assunto naquele momento. “Tanto lobby foi feito, tanta coisa foi criticada, tanta interdição aconteceu que eu cheguei até, de uma forma simplesmente pacificadora, principalmente em véspera de eleições, eu cheguei a dizer: ‘Eu desisto desse imposto aí. Fica todo mundo calmo. Não tem mais imposto, não tem desoneração’”, contou.
O ministro criticou quem “apoia a desoneração sem fonte, sem dizer de onde vem o dinheiro”. Segundo ele, “esse privilégio é do Congresso”, já que o Ministério da Economia precisa indicar a origem dos recursos para bancar as medidas anunciadas. “Eu quero saber de onde é que vem o dinheiro. Esse mesmo Congresso que vai aprovar o Fundeb e que vai aprovar a desoneração, vai entregar a desindexação, a desvinculação e a desobrigação dos gastos, ou não? Vai deixar o dinheiro todo carimbado e vai empurrar essa conta para as futuras gerações?”, questionou.