Operário manipula carne em um frigorífico da Marfrig em São Paulo: a rentabilidade do negócio encolheu (Paulo Whitaker/Reuters)
Da Redação
Publicado em 15 de junho de 2015 às 06h45.
São Paulo - O atual descompasso entre a capacidade de processamento e a oferta escassa de bois gordos tem levado frigoríficos em vários Estados a encerrar suas atividades, informou o presidente da Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo), Péricles Salazar.
"O plantel bovino diminuiu nos últimos anos, enquanto o número de unidades industriais cresceu", disse o dirigente ao Broadcast Agro, serviço em tempo real da Agência Estado.
"Em algum momento esse desajuste cobra o seu preço, pois há unidades em regiões nas quais a disponibilidade de bois é menor, e aí elas não aguentam", acrescentou.
A menor oferta de animais para o abate fez o preço da arroba em São Paulo disparar 25% entre janeiro e dezembro de 2014, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea).
Como os preços da carne no atacado não subiram em igual proporção, a rentabilidade do negócio encolheu. Assim, as empresas enfrentam dificuldades.
Segundo a Abrafrigo, pelo menos 26 indústrias frigoríficas fecharam as portas ou deram férias coletivas este ano. O número pode ser ainda maior, já que as empresas não repassam dados de suas operações à entidade.
Das unidades afetadas, ao menos 14 estão em Mato Grosso do Sul, que detém o quinto maior rebanho bovino do País, estimado em 20,1 milhões de cabeças pelo Ministério da Agricultura.
A Assocarnes, associação de frigoríficos do Estado, diz que só nos últimos três meses três plantas de médio porte, com capacidade para 500 bois por dia, fecharam, com a perda de 1.500 empregos diretos.
São elas a Fricap, em Naviraí; a Fribrasil Alimentos, em Caarapó, e a Beef Nobre, em Campo Grande.
"Os proprietários alegam que faltam animais para manter escalas e que não há condições de competir com os grandes grupos do setor", relatou o presidente da Assocarnes, João Alberto Dias.
Ele alertou, ainda, que há outras empresas em dificuldades, sem citá-las.
"Calculamos pelo nível de suas escalas. Se antes costumavam abater diariamente 500 bois, hoje esse número está em 150 a 200."
Situação parecida ocorre em Mato Grosso, que tem o maior rebanho bovino do País, com 28,4 milhões de cabeças. Ali, pelo menos sete fábricas foram afetadas pelo atual cenário de oferta escassa.
Em maio, a JBS encerrou temporariamente as operações em São José dos Quatro Marcos. No mês anterior, a Minerva Foods demitiu pelo menos 320 funcionários de sua fábrica em Mirassol d'Oeste.
Procurada pelo Broadcast Agro, a empresa afirmou que os desligamentos fazem parte do processo de integração da unidade, recém-adquirida da BRF, para garantir maior eficiência operacional. São também resultantes do "atual momento de mercado".
No início de junho, a JBS suspendeu abates em Ariquemes (RO), alegando "aumento da ociosidade na indústria nacional". Já a Marfrig decidiu transformar em um centro de armazenagem e distribuição uma de suas fábricas em Promissão (SP).
Além disso, paralisou, em janeiro, sua unidade em Rio Verde (GO).
Para a Abrafrigo, a queda na atividade industrial, somada à melhora na oferta de animais, deve promover ajuste no mercado do boi, mas a reversão do ciclo pecuário não deve ocorrer em breve.
"O processo de retenção de vacas para aumentar o rebanho e ganhos de produtividade com o melhoramento genético são processos lentos", explica o presidente da entidade, Péricles Salazar.
"A oferta de bois pode melhorar no ano que vem, mas ainda não acreditamos em queda de preços", afirma o analista da Scot Consultoria Hyberville Neto. O
consultor acrescenta que a desvalorização do boi, por si só, não garante que a situação da indústria vá melhorar, já que as empresas são muito suscetíveis a variações de juros e de preços de insumos.
"A possibilidade de mais plantas fecharem ou pelo menos suspenderem abates este ano não é tão remota", avalia.