Economia

Essa moda podia pegar

O governo acaba de reduzir impostos sobre a produção, contrariando a histórica obsessão das autoridades em avançar sobre o bolso do contribuinte. Imagine o salto do país se isso fosse a regra, e não a exceção

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Da Redação

Publicado em 18 de março de 2010 às 10h35.

O crescimento do PIB brasileiro em 2009 foi zero; ao mesmo tempo, há sinais de que a recuperação está ganhando velocidade. Por uma razão ou pela outra, o governo entendeu que seria conveniente dar um tônico na atividade produtiva, basicamente na forma de redução de impostos e de aumento no crédito. Vai mudar o movimento de translação da Terra? Não. Vai ajudar setores e empresas que estão precisando de estímulo? Vai. Seja porque é necessário melhorar as condições de quem está andando de lado, seja porque a aceleração da retomada vai exigir continuidade de investimentos, a fim de manter a cadeia produtiva em bom andamento e atender a uma demanda que se supõe crescente, a intervenção parece ter vindo no momento certo. Sempre se comenta, nessas horas, se os gestos amigáveis feitos pelo governo não estariam sendo motivados pelo ano eleitoral de 2010. Mas o centro da questão, francamente, não está aí. A pergunta que interessa é a seguinte: se não houvesse eleição alguma marcada para 2010, as medidas anunciadas continuariam sendo positivas? A resposta é sim, e isso encerra o problema.

A verdade é que, no meio da barragem de artilharia adversa que o setor privado tem de enfrentar todos os dias, do câmbio ruim para a competição ao custo irracional de tocar um negócio no Brasil, qualquer alívio é bem-vindo. No caso, o governo dobrou o montante das reduções de impostos que estavam previstas para 2010, de 2,3 bilhões para 5,5 bilhões de reais, e prorrogou prazos de concessão de crédito subsidiado do BNDES para investimentos. Além disso, colocou 80 bilhões de reais suplementares nos cofres do banco para que possa multiplicar seus empréstimos às empresas privadas. Imposto a menos, no Brasil, não pode estar errado nunca. Em meados de dezembro, o total de tributos federais, estaduais e municipais pagos pelo conjunto dos brasileiros em 2009 superou a marca de 1 trilhão de reais -- dos quais mais de 800 bilhões foram arrecadados pela União. Os 5,5 bilhões de reais que o governo deixará de arrastar para seu caixa no ano que vem não vão quebrar a administração pública, da mesma forma que os 40 bilhões "perdidos" com a falecida CPMF não tornaram visivelmente pior nada que já não estivesse ruim. Em compensação, podem animar de maneira concreta os negócios nas áreas beneficiadas. Conclusão: só há ganhos. A mesma observação vale para o crédito. Se há uma coisa da qual o Brasil não pode se queixar é de excesso de crédito. O que acontece é precisamente o contrário -- razão pela qual, entre outras, o país investe tão menos do que deveria em seu setor produtivo. O reforço de 80 bilhões de reais que o BNDES terá em seu caixa, na verdade, não vai alterar o ambiente de escassez de crédito no Brasil. Mas pode ser um impulso importante para empresas organizadas, com bons projetos e uma situação favorável de mercado.

A lógica -- e os resultados das experiências mais recentes -- indica que o país só ganharia com medidas como as que foram adotadas nesta reta final de 2009 e outras do mesmo tipo que vieram antes. Não são, como se diz, atos de "bondade". São atos que dão certo, como demonstram as reduções de impostos feitas nas indústrias de automóveis, eletroeletrônicos e computadores. É óbvio que se poderia ir muito mais adiante. Se, em vez de arrecadar (e gastar) mais de 1 trilhão de reais num ano, o governo arrecadasse (e gastasse) 950 bilhões, digamos, não deveria haver prejuízo algum para o serviço público -- pois é simplesmente impossível acreditar que dentro de uma massa de dinheiro com esse volume não haja espaço para remanejar despesa nenhuma, sobretudo quando se considera o extraordinário montante que o governo gasta onde não deve. E, no entanto, um movimento desses resultaria numa injeção de 50 bilhões de reais na economia produtiva -- quase dez vezes a "desoneração" decidida para 2010.

Não há o menor risco de que algo assim venha a acontecer. O jeito é aplaudir o tanto que já se fez -- e esperar por dias melhores.

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