Economia

Esnobada dos EUA ao Brasil na OCDE é parte de xadrez político maior

Decisão de não endossar adesão do Brasil neste momento ocorre em meio a uma disputa com europeus sobre gestão do secretário-geral Angel Gurría

Donald Trump; Jair Bolsonaro (Al Drago/Bloomberg)

Donald Trump; Jair Bolsonaro (Al Drago/Bloomberg)

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Reuters

Publicado em 10 de outubro de 2019 às 16h12.

Última atualização em 10 de outubro de 2019 às 16h28.

Brasília - Os Estados Unidos não mencionaram apoio ao ingresso do Brasil na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em carta enviada ao organismo no fim de agosto em que manifestaram respaldo às candidaturas da Argentina e da Romênia, informaram duas fontes com conhecimento do assunto.

Não houve sinalização de apoio mesmo após o governo do presidente norte-americano Donald Trump ter anunciado, em maio, apoio oficial à investida.

informação foi publicada mais cedo pela agência Bloomberg. Procurado, o Ministério da Economia disse que não comentaria o assunto.

Segundo uma das fontes, contudo, a carta não rejeita o endosso ao pedido brasileiro e se insere em um xadrez político maior que inclui a oposição dos EUA à gestão de Angel Gurría, secretário-geral da OCDE.

De acordo com fontes ouvidas pelo Estadão, a negativa foi dada a uma proposta apresentada por Gurría de discutir a inclusão de um bloco de seis novos países, que teria ainda nações europeias.

O governo dos Estados Unidos não compartilha a visão de Gurría para as regras da organização, pela avaliação de que os rumos pretendidos preconizam uma influência excessiva da Europa sobre a OCDE, sendo que norte-americanos e europeus já divergem em relação a uma série de padrões, ligados por exemplo à tecnologia, regulação e meio-ambiente.

De acordo com a fonte, enquanto os EUA miram a sucessão de Gurría --que deverá ocorrer em 2020--, a perspectiva é que não irão se manifestar formalmente sobre qualquer mudança mais no desenho para adesão de novos membros.

"A rusga dos dois principais polos de poder (na OCDE) --polo americano e polo europeu-- provavelmente só vai se resolver com a própria sucessão do Gurría no ano que vem", disse a fonte.

Argentina e Romênia requerem participação no que é considerado o clube dos países ricos, assim como Brasil e Bulgária. Com o ingresso de mais dois países europeus no grupo, norte-americanos avaliam que uma OCDE mais "europeizada" poderia ser uma barreira aos seus interesses.

O timing da carta, de acordo com a primeira fonte, também tem referência ao resultado das eleições primárias na Argentina.

No início de agosto, o mercado argentino sofreu forte abalo na esteira da esmagadora vitória do candidato de oposição Alberto Fernández nas eleições primárias, afetando severamente as chances de reeleição do presidente Mauricio Macri.

Fernández tem a ex-presidente Cristina Kirchner como sua companheira de chapa, enquanto Macri é defensor do livre mercado e é visto como aliado dos EUA.

Na carta, os americanos teriam favorecido o critério de cronologia, dando apoio aos argentinos, que começaram o processo de adesão primeiro e que já tinham respaldo de Trump há mais tempo.

O momento de envio também teria sido uma forma de sinalizar apoio ao governo Macri, segundo a fonte. As eleições na Argentina ocorrem no fim deste mês.

A solicitação formal do Brasil para se juntar à OCDE foi feita em maio de 2017, representando um esforço para fortalecer os laços com as nações desenvolvidas do Ocidente, depois que governos anteriores priorizaram as relações com países em desenvolvimento.

A OCDE aconselha seus 36 membros, na sua maioria países ricos, e é considerada uma influenciadora-chave na arquitetura econômica mundial. Dentre os emergentes que fazem parte do grupo, estão países como Turquia, México e Chile.

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