Economia

Entre a greve dos caminhoneiros e a eleição, como ficou a economia?

Dado foi positivo, mas sobre base fraca. Consumo das famílias e investimento se recuperam, mas aceleração depende de aprovação de reformas e cenário externo

 (EXAME/Montagem/Reprodução)

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João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 30 de novembro de 2018 às 12h45.

Última atualização em 30 de novembro de 2018 às 13h19.

São Paulo - A economia brasileira segue em retomada mas ainda não deslanchou: é o que mostram os números de crescimento do terceiro trimestre divulgados nesta sexta-feira (30) pelo IBGE.

A expansão do PIB (Produto Interno Bruto) de 0,8% em relação ao trimestre anterior veio em linha com as expectativas e foi a melhor do ano até agora, mas deve ser vista no contexto de uma base fraca no período anterior.

"O terceiro trimestre foi ensanduichado pela greve dos caminhoneiros em maio e as eleições em outubro, dois eventos turbulentos por si só com impactos relevantes no nível de atividade", diz a nota de Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados.

Um sinal disso é que os dois setores com melhor resultado trimestrais entre os serviços estão entre os que foram mais afetados pela greve: transporte, armazenagem e correio (2,6%) e Comércio (1,1%).

"Tem que ter cautela. De forma geral, é melhor somar os dois resultados e dividir, o que dá cerca de 0,5% por trimestre. O ano a ano está mais fraco", diz Silvia Matos, coordenadora técnica do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (IBRE/FGV).

Ela aponta que enquanto o consumo do governo está relativamente estagnado, o que é natural diante das restrições orçamentárias, há uma boa notícia: a recuperação do consumo das famílias, que responde por 64% do PIB e desde a saída da recessão teve resultado positivo em todos os trimestres.

O desemprego está em queda, ainda que lenta, e outro dado positivo foi o crescimento de 6,6% do investimento na base trimestral e de 7,8% na base anual.

"Isso tudo tem a ver com um ambiente de maior confiança, relacionado ao fato do governo Temer entregar contas públicas mais equilibradas. A queda dos juros também tem impacto tanto sobre o consumo quanto sobre o investimento", diz Vinícius Müller, professor do Insper.

No entanto, vale notar que o investimento foi auxiliado por uma mudança de metodologia que passou a contabilizar plataformas de petróleo nessa rubrica e não mais como importação.

O Ibre/FGV calcula que sem a mudança, o crescimento do investimento teria sido cerca de metade do divulgado, e a perspectiva histórica também mostra que ainda há muito a ser recuperado.

Uma nota de Alberto Ramos, chefe de pesquisa macroeconômica do Goldman Sachs para América Latina, aponta que o investimento ainda está 25% abaixo do seu pico em meados de 2013, enquanto o consumo privado ainda está quase 5% abaixo do seu pico no início de 2014.

A construção civil, que responde por pouco mais de metade do investimento, terá mais um ano de queda. Apesar de ter um peso relativamente pequeno no PIB, ela tem efeitos multiplicadores importantes.

Dos 3 milhões de empregos com carteira assinada destruídos ao longo da recessão de 2014-2016, cerca de 1 milhão foram do setor de construção, aponta nota de Bráulio Borges, economista-chefe da LCA Consultores.

Cenário externo e futuro

Apesar de também ter um peso menor no resultado final, a agropecuária teve o melhor resultado trimestral: 0,7%, auxiliada por itens como café e algodão e alta das exportações.

"As disputas de guerra comercial, especialmente entre Estados Unidos e China, abrem espaços para que outros países assumam posições mais favoráveis. Como somos grandes exportadores de matérias primas e temos capacidade produtiva, isso acaba batendo no nosso resultado", aponta Vinicius.

Daqui pra frente, a avaliação dos economistas é que o ciclo econômico segue relativamente positivo, mas com desafios importantes.

As eleições presidenciais foram vencidas pelo candidato preferido pelo mercado financeiro no segundo turno e a equipe anunciada pelo futuro superministro Paulo Guedes é de orientação fortemente liberal.

No entanto, não se sabe até onde vai a capacidade política do governo para aprovar reformas prioritárias, especialmente a da Previdência.

"Hoje, o mais improvável são os dois extremos, ou seja, de aprovação de uma boa reforma ou a aprovação de nenhuma reforma, sendo esta última mais provável do que a primeira", diz a nota de Vale.

Já o cenário externo também é desafiador. A indústria de transformação, que ajudou a puxar a retomada, sofre com a queda das exportações para a Argentina, mercado importante para veículos, por exemplo.

Além disso, segue o temor de desaceleração em mercados como China e Europa e aperto monetário nos Estados Unidos, apesar dos últimos sinais do Federal Reserve terem sido de mais acomodação, o que acalmou os mercados financeiros.

"Passou a melhora nos desenvolvidos e a onda otimista para os emergentes, e não vai ter saída e dinheiro fáceis sem mudanças. Já estabilizamos a macroeconomia, mas precisamos completar a parte fiscal, que é uma perna manca", diz Silvia.

O IBRE/FGV, que acertou o dado trimestral, revisou sua expectativa de crescimento para 2018 de 1,5% para 1,4%. A previsão para 2019 é de um crescimento de 2,4%.

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