Macri: recente derrota do presidente argentino em primárias provocou onda de aversão ao risco impressionante até mesmo para os padrões de volatilidade do país (Ricardo Ceppi/Getty Images)
Ligia Tuon
Publicado em 27 de agosto de 2019 às 10h48.
Última atualização em 27 de agosto de 2019 às 10h56.
O empréstimo recorde do Fundo Monetário Internacional concedido para a Argentina no ano passado deveria ter virado a página de uma história conturbada. No entanto, parece ser mais um caso de déjà vu.
Menos de duas décadas atrás, a Argentina abandonou um programa do FMI, deixou de pagar suas dívidas e mergulhou em uma depressão econômica.
Representantes do FMI chegaram a Buenos Aires no fim de semana para avaliar o atual pacote de resgate de US$ 56 bilhões do país e decidir se vão continuar a liberar recursos, mas alguns dos mesmos sinais de alerta começam a piscar.
O presidente Mauricio Macri acaba de ser trucidado pela oposição nas eleições primárias, depois que seu programa apoiado pelo FMI - que tem como base a austeridade orçamentária e as taxas de juros mais altas do mundo - não conseguiu tirar a economia da recessão.
A derrota de Macri provocou uma onda de aversão ao risco impressionante até mesmo para os padrões de volatilidade da Argentina. O peso se desvalorizou 20% em uma semana, e os rendimentos dos títulos do governo subiram, elevando o risco implícito de default acima de 80%.
Os representantes do FMI, que chegaram à Argentina no sábado e imediatamente iniciaram reuniões com os formuladores de políticas, enfrentam uma escolha difícil, com ecos indesejados de duas décadas atrás: arriscar tornar a turbulência ainda pior segurando uma parcela de US$ 5,3 bilhões no próximo mês ou liberá-la, embora o futuro do programa pareça altamente incerto.
O FMI também terá que buscar detalhes dos planos econômicos do líder da oposição Alberto Fernández –– que provavelmente deve conduzir um governo menos favorável ao mercado.
Embora as eleições presidenciais ainda estejam a dois meses de distância, a desvantagem de 15 pontos de Macri levou analistas a considerá-lo carta fora do baralho.
"O FMI investiu muito - não apenas dinheiro, mas prestígio", disse Hector Torres, ex-diretor executivo do Fundo que representou os países sul-americanos.
"O fato de o acordo não ter um bom desempenho no momento é um constrangimento", disse. E a parcela de setembro será "uma decisão difícil".
Até este mês, a Argentina estava a caminho de cumprir a meta do FMI de equilibrar o orçamento deste ano (excluindo pagamentos de juros). O Fundo pode citar o desempenho no primeiro semestre como base para realizar o pagamento do próximo mês, de acordo com Priscila Robledo, economista para a América Latina da Continuum Economics, em Nova York.
No entanto, desde o resultado das primárias, o governo Macri começou a relaxar as políticas de austeridade, com o congelamento dos preços dos combustíveis e aumento dos subsídios. As medidas tentam proteger os argentinos de renda mais baixa da desvalorização do peso, que ameaça elevar a inflação para níveis ainda mais altos.
(Com a colaboração de Daniel Cancel e Sarah McGregor)