Economia

Em seis meses, reforma trabalhista ainda tem efeitos limitados

Legislação entrou em vigor novembro, mas não elevou qualidade dos empregos formais nem impediu avanço da informalidade no mercado de trabalho

Carteira de trabalho: governo ainda não regulamentou pontos importantes da reforma trabalhista, elevando a insegurança jurídica para as empresas, segundo especialistas (Renato Alves/Ministério do Trabalho/Divulgação)

Carteira de trabalho: governo ainda não regulamentou pontos importantes da reforma trabalhista, elevando a insegurança jurídica para as empresas, segundo especialistas (Renato Alves/Ministério do Trabalho/Divulgação)

R

Reuters

Publicado em 17 de maio de 2018 às 18h16.

São Paulo - Seis meses depois de entrar em vigor, a reforma trabalhista do governo Michel Temer não foi capaz de limitar o crescimento do mercado informal ou impedir a deterioração do emprego formal no país, quadro que adia a melhora do mercado de trabalho e da demanda interna, necessária para a recuperação econômica.

"Ainda tem taxa de desemprego muito alta e não vai cair muito rapidamente neste ano, especificamente porque ainda temos cenário de incerteza que faz com que os empresários fiquem mais contidos para contratar", avaliou o diretor de Macroeconomia do Ipea, José Ronaldo de Souza, referindo-se às eleições presidenciais de outubro.

Dados do Caged, do Ministério do Trabalho, mostram que os modelos de contratação parcial e intermitente, criados pela reforma trabalhista, representam fatia cada vez maior do saldo de novas vagas criadas mensalmente, atingindo 11,38 por cento de todas os postos com carteira de trabalho gerados em março.

Foram abertos 6.392 postos intermitentes e parciais em março, diante do total de 56.151 vagas no geral, segundo último dado disponível. A fatia mais que dobrou em relação ao início do ano, quando é possível fazer a primeira comparação com o saldo positivo no Caged.

De modo geral, esses empregos se concentram em funções de baixos salários, como digitador, professores, servente de obras, faxineiro, entre outros, segundo o ministério.

A nova legislação trabalhista entrou em vigor em meados de novembro passado, com mudanças em mais de 100 pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Prevê, entre outros pontos, que acordos entre empregados e empregadores se sobrepõem à legislação vigente, busca diminuir a ação da Justiça trabalhista nas negociações entre as partes, permite o trabalho intermitente e o fatiamento das férias em três períodos.

Na época, o governo defendeu que as mudanças gerariam mais empregos, num momento de alta taxa de desocupação, que permanece até agora e atinge mais de 13 milhões de pessoas, segundo a Pnad Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que contabiliza empregos formais e informais.

Insegurança jurídica

Segundo o IBGE, o lento avanço do emprego tem ocorrido em vagas informais, sem benefícios trabalhistas como férias e 13º salário, que cresceram 3,95 por cento no primeiro trimestre deste ano, ante queda de 1,22 por cento nos postos formais, que além de benefícios também pagam salários maiores.

Empregados com carteira assinada receberam, em média, uma remuneração 68 por cento maior que trabalhadores informais no primeiro trimestre deste ano, segundo o IBGE, ante 60 por cento no mesmo período de 2017.

A deterioração na qualidade dos empregos formais, segundo analistas ouvidos pela Reuters, afeta a demanda doméstica, componente que sustentou o crescimento da economia na década anterior à recessão de 2015-2016, uma vez que este trabalhador consome menos que empregados com carteira assinada e por tempo indeterminado pela falta de segurança sobre quanto tempo continuará na função e sua renda.

"A atividade econômica tem melhorado mas o mercado de trabalho tem reagido pouco ao crescimento de lado da economia", disse o professor de economia do Insper Sergio Firpo.

"A recessão tirou do emprego muita gente que agora está trabalhando por conta própria. Mas só está ali porque tem expectativa de crescimento da economia, senão tivesse não conseguiria vender nada. O setor informal só tem aumentado porque a economia tem perspectiva de melhora."

O governo ainda não regulamentou pontos importantes da reforma, elevando a insegurança jurídica para as empresas, na avaliação dos especialistas ouvidos pela Reuters.

Também pesa para o trabalhador informal ou temporário não possuir o mesmo acesso a crédito, em especial para bens de maior valor, além de dispor de menos renda disponível para consumo, uma vez que custeia do próprio bolso despesas com saúde e alimentação, que eventualmente seriam arcadas em conjunto com empregadores.

O cenário básico de economistas ouvidos pela Reuters para o mercado de trabalho prevê leve melhora neste ano, impulsionada por vagas informais e suave elevação da massa salarial, mas com a taxa de desemprego pressionada e acima dos dois dígitos até o fim de 2019, a depender do compromisso do futuro ocupante do Planalto com as contas públicas e reformas.

Geradora de empregos de salários mais altos, a indústria não deve mostrar recuperação nas contratações este ano, em especial por grande folga na capacidade instalada ao mesmo tempo em que há incerteza sobre quem será eleito em outubro.

"Precisa de um novo governo que esteja comprometido com projeto sério de equilíbrio fiscal", disse o gerente de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria, Flavio Castelo Branco. "Se tiver bons indicativos, o setor privado vai reagir positivamente."

Acompanhe tudo sobre:CLTEmpregosInformalidadeLegislaçãoReforma trabalhista

Mais de Economia

Haddad: pacote de corte de gastos será divulgado após reunião de segunda com Lula

“Estamos estudando outra forma de financiar o mercado imobiliário”, diz diretor do Banco Central

Reunião de Lula e Haddad será com atacado e varejo e não deve tratar de pacote de corte de gastos

Arrecadação federal soma R$ 248 bilhões em outubro e bate recorde para o mês