Economia

Em meio à guerra comercial, Brasil não sacia apetite chinês por soja

Estoques brasileiros de soja em queda podem criar um problema para a China, o maior consumidor da commodity do mundo

Porto em Shanghai: após Trump intensificar a disputa comercial na semana passada, o gigante asiático decidiu suspender as compras de produtos agrícolas dos EUA (Qilai Shen/Bloomberg)

Porto em Shanghai: após Trump intensificar a disputa comercial na semana passada, o gigante asiático decidiu suspender as compras de produtos agrícolas dos EUA (Qilai Shen/Bloomberg)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 11 de agosto de 2019 às 08h00.

Última atualização em 11 de agosto de 2019 às 08h00.

A China provavelmente não vai poder contar apenas com o Brasil para atender sua demanda por soja, já que o país asiático deixou de importar a oleaginosa dos Estados Unidos em meio à guerra comercial.

Quando Donald Trump deu início à disputa de tarifas no ano passado, o Brasil havia acabado de registrar uma supersafra, o que permitiu ao maior exportador de soja do mundo atender quase que exclusivamente à voraz demanda da China. Mas, depois dos volumes recordes exportados e de problemas climáticos no período de cultivo, os estoques brasileiros estão em queda e a próxima safra está a meses de distância.

Isso poderia criar um problema para a China, o maior consumidor de soja do mundo. Depois que Trump intensificou a disputa comercial na semana passada, o gigante asiático decidiu suspender as compras de produtos agrícolas dos EUA. A Argentina pode ser uma opção, mas os agricultores atualmente estão estocando grãos antes das próximas eleições.

Já há evidências de um aperto na oferta. Os estoques de soja do Brasil estão 80% abaixo do nível registrado no mesmo período do ano passado, e as exportações do país caíram 8% até julho. Para a China, as exportações mostram queda de 11%. Os prêmios dos preços para embarques do país estão em alta.

A partir de setembro, o Brasil terá apenas cerca de 15,7 milhões de toneladas de soja a serem embarcadas até o início da colheita em janeiro, segundo Daniele Siqueira, analista da consultoria AgRural. A previsão tem como base a oferta total disponível, dados de exportações até julho e o volume necessário para atender o consumo doméstico.

Esse número ficaria aquém da demanda típica da China no período. O país importou cerca de 7 milhões de toneladas por mês de outubro a dezembro nos últimos três anos, em média, disse Vinicius Ito, vice-presidente de derivativos da R.J. O’Brien and Associates, citando dados oficiais chineses.

Os preços no Brasil já estão em alta em meio às perspectivas de oferta apertada. O prêmio pago pelos embarques de soja em setembro acumula alta de cerca de 32% este mês. Os preços de referência no mercado de futuros em Chicago mostram queda de 1,7% no período.

Os prêmios devem ser ajustados, já que há apenas o Brasil no jogo no momento, disse Ito em entrevista por telefone, de Nova York.

Os prêmios ainda estão bem abaixo dos recordes alcançados no ano passado, diante da leve queda da demanda da China. A propagação da peste suína africana no país dizima plantéis de suínos do país, o que reduz o volume de soja usado como ração.

Enquanto isso, a peste suína alimenta expectativas de que as importações de carne da China continuarão a aumentar para compensar a menor oferta. Isso tem levado frigoríficos brasileiros a elevar a produção, o que também pode acelerar o consumo de soja no mercado interno, diminuindo o volume para exportação.

Esses fatores reforçam a perspectiva de maior demanda por soja da Argentina, onde a produção voltou a subir depois da seca que afetou a safra no ano passado.

Mas importadores terão dificuldade em conseguir aumentar as compras de agricultores argentinos, que acumulam estoques antes das eleições presidenciais, cujas primárias começam em 11 de agosto. Os produtores usam a safra, que é cotada em dólares, como hedge contra a volatilidade relacionada às eleições e à possibilidade de uma reviravolta no cenário político.

Os agricultores da Argentina continuarão acumulando colheitas antes das eleições e com a perspectiva de aumento dos prêmios na América do Sul, devido à forte demanda chinesa, disse Ito.

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