Interrogatório: a presidente do tribunal interrogou Lagarde sobre o total de 45 milhões de euros concedidos em 2008 ao empresário Bernard Tapie (Getty/Getty Images)
AFP
Publicado em 13 de dezembro de 2016 às 12h48.
A diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, passa nesta terça-feira por um interrogatório implacável, no segundo dia de seu julgamento por negligência que originou um importante desvio de dinheiro público em sua gestão como ministra da Economia na França.
A presidente do tribunal, Martine Ract Madoux, interrogou Lagarde sobre o total de 45 milhões de euros (48 milhões de dólares) concedidos em 2008 ao empresário Bernard Tapie por dano moral em uma arbitragem autorizada por Lagarde quando estava à frente do ministério Economia francês.
"O total por danos morais pela morte de uma criança é de 30.000 a 50.000 euros. Mas essa indenização (de Tapie) é algo colossal!", declarou, indignada, Martine Ract Madoux.
"Não correspondia à senhora consultar seus serviços para indagar as razões sobre esta indenização de 45 milhões?", questionou ainda.
"O que teria mudado em nível jurídico", perguntou Lagarde, na defensiva.
Ex-ministra da Economia da França (2007-2011) sempre afirmou ter "atuado de boa fé".
Se for considerada culpada, ela pode ser condenada a até um ano de prisão e a pagar multa de 15.000 euros (15.900 dólares).
Qualquer que seja a sentença, este caso pode arranhar a imagem desta advogada especializada em negócios que, após passar pelo ministério da Economia, tornou-se uma das mulheres do mundo.
Reconduzida este ano à frente do FMI, Lagarde disse que se licenciaria da instituição durante o julgamento.
A diretora-gerente do FMI é julgada por uma jurisdição excepcional, a Corte de Justiça da República (CJR), criada com o propósito de julgar os ministros e ex-ministros por delitos cometidos no exercícios de suas funções.
Desde que foi criada, em 1993, a CJR condenou três membros do governo. No início do mês, a Justiça francesa condenou o ex-ministro da Fazenda do presidente socialista François Hollande, Jérôme Cahuzac, por fraude fiscal e lavagem de dinheiro.
Lagarde é acusada de "negligência" na gestão de um caso que envolvendo Tapie, que achava ter sido prejudicado pelo banco público Crédit Lyonnais durante a venda da marca esportiva Adidas em 1994.
Agora com 73 anos, Tapie foi dono da empresa de artigos esportivos entre 1990 e 1993, mas perdeu o controle da mesma quando se declarou em falência.
Então, ele vendeu a empresa ao banco estatal Crédit Lyonnais por 315,5 milhões de euros em fevereiro de 1993. O banco voltou a vendê-la no ano seguinte por 701 milhões de euros, o que levou Tapie a afirmar que tinha sofrido um calote.
Para resolver a disputa judicial iniciada por Tapie contra o banco, Lagarde, que havia sido nomeada ministra da Economia em 2007, durante a presidência de Nicolas Sarkozy, optou por recorrer a uma arbitragem privada, contrariando o critério de um órgão consultivo.
Em 2008, os três juízes arbitrais concederam a Tapie uma indenização de 404 milhões de euros, procedentes de fundos públicos.
Mas a justiça civil anulou a sentença arbitral no início de 2015, por considerar que ocorreu uma fraude. Tapie foi condenado a devolver os 404 milhões de euros.
A justiça francesa acusa Lagarde por "negligência e precipitação" no caso, que "privou o Estado de uma oportunidade de evitar o desvio dos fundos".
Em sua alegação, ela afirma que o recurso da arbitragem foi preparado antes de sua entrada no governo e que não tinha relações pessoais com os personagens do caso.
De fato, Lagarde não atuou na escolha, muito polêmica, dos árbitros.
Seu julgamento se estenderá até 20 de dezembro.