Economia

Desigualdade de renda para de cair e pobreza cresce no Brasil, diz Oxfam

De acordo com relatório da Oxfam Brasil, em 2017, o percentual da população que está abaixo da linha da pobreza chegou a 11,18%, índice de 2012

No comparativo global, de acordo com o relatório, em matéria de desigualdade de renda o Brasil caiu em 2017, da posição de 10º para 9º país mais desigual do planeta (Victor Moriyama/Getty Images)

No comparativo global, de acordo com o relatório, em matéria de desigualdade de renda o Brasil caiu em 2017, da posição de 10º para 9º país mais desigual do planeta (Victor Moriyama/Getty Images)

CC

Clara Cerioni

Publicado em 26 de novembro de 2018 às 18h38.

São Paulo – A recessão econômica pela qual o Brasil passa trouxe prejuízos sociais conquistados nos últimos tempos. No ano passado, o percentual da população que está abaixo da linha da pobreza chegou a 11,18% retrocedendo para o mesmo patamar de cinco anos atrás. Atualmente, há no país 15 milhões de pessoas miseráveis.

Essa foi uma das conclusões do relatório “País estagnado: um retrato da desigualdade brasileira” feito pela Oxfam Brasil, uma organização não governamental de combate à pobreza. O estudo analisa o período entre 2016 e 2017.

De acordo com o relatório, a desigualdade na renda habitual do trabalho (que considera somente o salário principal dos trabalhadores) estava em queda desde 2002 e se estagnou entre o ano retrasado e o ano passado. Além disso, a proporção de pobres voltou aos mesmos níveis de 2012.

A organização usou dois bancos de dados para chegar a esses resultados: o FGV Social e o relatório do Banco Mundial, que avalia a pobreza nos países.

Segundo o coordenador da Oxfam e autor do relatório, Rafael George, a recessão econômica e a estrutura das políticas públicas se apresentam como fatores determinantes para essa realidade.

“Há duas explicações para a piora nos indicadores de pobreza do Brasil. A primeira foi a recessão econômica que duplicou o número de desempregados em três anos e a segunda é de cunho estrutural. Não há políticas públicas eficientes em educação e saúde que promovam mobilidade social no Brasil”, explica.

Segundo o especialista, o desemprego atinge com mais intensidade pessoas com trabalhos intermitentes e com renda menor. Nessa realidade, quem não tem emprego fixo também não tem reservas para se manter enquanto procura outra oportunidade.

O pesquisador alerta ainda para os insuficientes avanços na educação do país. “A mobilidade social não é permanente porque avançamos pouco em iniciativas relacionadas à educação. A escolaridade no Brasil avança de maneira lenta. Existe a necessidade de expandir as políticas ligadas à educação para que o país consiga reverter esse quadro”.

Queda no ranking

O crescimento do número de pessoas abaixo da linha da pobreza no Brasil teve como consequência o aumento da desigualdade social.

No ranking do Programa das Nações Unidas (Pnud), que avalia o desempenho do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 189 países, o Brasil caiu da 10ª posição para 9ª no quesito pobreza. Apesar desse resultado negativo, o país permanece na 79ª posição do ranking geral.

O indicador com maior impacto negativo no IDH brasileiro foi o de renda, por conta de seu recuo recente, sobretudo nas menores faixas.

De acordo com o relatório, o Brasil é, sob critérios do Banco Mundial, um "Upper-middle Income Economy", um grupo de países onde a linha da pobreza ponderada pelo tamanho da economia é calculada em 5,5 dólares por pessoa/dia.

No Brasil, no entanto, esse índice atingiu apenas 1,9 dólares por pessoa/dia no ano passado. “Em resumo, 2017 foi um ano de péssimas notícias para a redução das desigualdades no país, com a aparente consolidação de um recuo histórico”, afirma George.

Reforma tributária

Para George da Oxfam, a melhora desses índices pode acontecer se o próximo governo trouxer novamente o tema desigualdade social para o debate.

Além disso, segundo o especialista, é necessário haver uma reforma tributária no país focada não no aumento da carga em serviços e produção, mas sim na renda e no patrimônio.

“Se tivermos uma tributação maior em pessoas ricas, com renda de acima de 50 salários mínimos, em dividendos e em heranças, haveria um impacto enorme na questão da desigualdade. Só com uma reforma dessas conseguíamos saltar uns cinco anos nesse índice. Além disso, o novo governo tem que derrubar a lei do Teto dos Gastos, porque isso limita muito os investimentos em saúde e educação. Fazendo isso, cresceríamos em uma velocidade alta, em terceira marcha e na descida”, diz.

Para o diretor do FGV Social, Marcelo Neri, a pobreza no país vem crescendo desde 2014. Nos últimos três anos, 2014 a 2017, 6,3 milhões de pessoas estão na linha da miséria, aumento de 33% nesse indicador. Só em 2015, 3,6 milhões de brasileiros entraram na miséria.

“Isso é mais que do que a população do Paraguai quando se fala em novos miseráveis e aconteceu pela recessão econômica, com o aumento do desemprego”, diz.

Neri, no entanto, afirmou que se o Brasil crescer 2,5% ao ano o seu PIB até 2030, o índice de desigualdade social chegará ao nível de 2014, 8,2% da população.

“Não vamos sair do lugar, mesmo melhorando o PIB. É necessário uma política forte de combate à pobreza, criando uma rede de proteção social, com programas como o Bolsa Família, por exemplo, montados com dispositivo que incentive a melhora da produção”, afirma.

Segundo ele, o impacto no PIB de políticas públicas voltadas para a diminuição da desigualdade é maior do que medidas ligadas à reforma da Previdência.

“A cada 1 real investido em programas de redução da pobreza, 1,70 real é revertido ao PIB. Já a reforma da Previdência impacta em 0,72 centavos de real a cada 1 real investido”, acrescenta o diretor da FGV.

Desigualdade de raça

O relatório da Oxfam também aponta que a desigualdade de renda, quando se olha a questão de raça, disparou de 2016 para 2017.

Em 2016, negros ganhavam R$ 1.458,16 em média, o que corresponde a 57% dos rendimentos médios de brancos, equivalentes naquele ano a R$ 2.567,8166.

Já em 2017, os rendimentos médios de negros foram de R$ 1.545,30 enquanto os dos brancos alcançaram R$ 2.924,31, diminuindo a razão de rendimentos para 53%.

“Os negros ganham em média 50% dos salários dos brancos e isso se observa em quase todas faixas de renda. Desde 2011, tal razão não passa de 57%, numa longa estagnação de equiparação”, afirma George.

De acordo com o relatório, como resultado, desigualdades raciais são visíveis dentro de estratos específicos de renda. A média geral da renda da metade mais pobre da população era de R$ 749,31 em 2016, sendo que brancos pobres ganhavam em média R$ 882,23 e negros pobres R$ 634,6670.

Em 2017, a média geral para esse grupo era de R$ 804,35, de modo que brancos da metade mais pobre ganhavam R$ 965,19 enquanto negros dessa faixa recebiam R$ 658,1471.

“Nesse período, negros pobres ficaram ainda mais pobres, com redução de cerca de 2,5% de renda, enquanto brancos seguiram direção oposta, com incremento de quase 3% de renda.”

Além disso, pela primeira vez em 23 anos, a renda média das mulheres caiu em relação à dos homens, de uma proporção de 72% para 70%.

“Essa relação deu um grande passo para trás. Estava crescendo e no ano passado caiu dois pontos percentuais”, afirmou George. No ano passado, a renda média de mulheres foi de R$ 1.798,72, enquanto a de homens, de R$ 2.578,15.

Acompanhe tudo sobre:Banco MundialBolsa famíliaEducaçãoGovernoMulheresNegrosPobreza

Mais de Economia

Morre Ibrahim Eris, um dos idealizadores do Plano Collor, aos 80 anos

Febraban: para 72% da população, país está melhor ou igual a 2023

Petróleo lidera pauta de exportação do país no 3º trimestre

Brasil impulsiona corporate venturing para atrair investimentos e fortalecer startups