Produção da Votorantim Cimentos: companhia foi uma das punidas pelo Cade (Marcelo Almeida/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 29 de maio de 2014 às 20h49.
São Paulo - As maiores produtoras de cimento do Brasil devem iniciar uma guerra judicial contra decisão da quarta-feira do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que as obrigou a pagar multa recorde bilionária e a vender parcela considerável de ativos, em um caso que consumiu oito anos de investigações.
Seja pelo tamanho da multa, seja pelas obrigações estruturais impostas ao mesmo tempo pelo Cade, a indústria brasileira de cimento considera que o Cade errou ao considerar que Votorantim Cimentos, Holcim, InterCement, Cimpor, Itabira e Itambé fizeram parte de um cartel que gerou prejuízos de 28 bilhões de reais aos consumidores do país.
O total de multas impostas pelo Cade alcançou o recorde de 3,1 bilhões de reais, com quase metade do total recaindo sobre a Votorantim Cimentos, líder do mercado nacional, com participação de 40 por cento. Além disso, as empresas terão que vender 20 por cento de sua capacidade de concreto em um prazo mantido sob sigilo pelo órgão de defesa da concorrência.
Entre as leis federais que amparam o Cade está a de número 12.529, de 2011. Em seus quase 130 artigos, destacam-se os de número 37 e 38: além de não especificarem precisamente o que é infração à ordem econômica, incluem o dispositivo que permite ao Cade praticar "qualquer outro ato ou providência necessários para a eliminação dos efeitos nocivos à ordem econômica".
"A lei é muito ampla, não está bem detalhada e isso, para os advogados, é um prato cheio", disse o advogado Bruno Leal Rodrigues, professor de Direito Econômico da FGV Rio de Janeiro, que não está envolvido no caso.
"A decisão foi bem draconiana. As multas são altas e as vendas de ativos são significativas... Nesse contexto, não há muita alternativa para as partes (que não buscar resolver o caso na Justiça)", afirmou Rodrigues.
A exemplo do famoso caso da compra da fabricante brasileira de chocolates Garoto pela Nestlé em fevereiro de 2002 e que segue até hoje tramitando na Justiça, a batalha das cimenteiras nos tribunais promete ser longa.
A tendência é cada empresa abrir processos individuais na Justiça Federal de primeira instância em Brasília para tentar buscar liminares que obriguem o Cade a esperar na execução das penas.
O vice-presidente da Itabira Agro Industrial, Sergio Maçães, afirmou à Reuters que espera que o processo que será aberto em defesa de sua companhia "será muito grande, e não será fácil, curto, de rito sumário, porque são muitos aspectos".
A Itabira foi condenada pelo Cade a pagar 411 milhões de reais e a vender 20 por cento de sua capacidade em concreto. Porém, segundo Maçães, a empresa não tem unidades concreteiras, nem participações em outras empresas do ramo.
"Não aceitamos, refutamos integralmente a decisão", afirmou o executivo.
Procuradas, a Votorantim Cimentos e a Camargo Corrêa, que controla InterCement e Cimpor, não se pronunciaram nesta quinta-feira. Na véspera, as empresas enviaram comunicados à imprensa prometendo recorrerem à Justiça e em que usaram expressões como "injustificada", "sem base legal" e também "penalidades descabidas" para qualificar a decisão do Cade.
De toda a forma, para recorrerem, as empresas terão que depositar o valor das multas em juízo se não obtiverem liminares que suspendam os efeitos da decisão do Cade, que pela lei pode até mesmo nomear interventores como forma de garantir o cumprimento das penas.
Segundo o professor da Direito Econômico da FGV Rio, casos antitruste geram questões altamente complexas para um judiciário que não está muito bem aparelhado para enfrentar discussões do tipo, diferentemente dos Estados Unidos, onde casos sobre concorrência são levados diretamente ao judiciário.
Assim, tendo em vista a discussão de mais de 10 anos do caso Nestlé-Garoto, a decisão do Cade sobre as cimenteiras não deve gerar no curto ou no médio prazos os esperados efeitos estruturantes de recuperação da concorrência.