Economia

Coronavírus deixará países com dívida sem precedentes

Bancos centrais e governos liberaram pelo menos 15 trilhões de dólares em estímulos e gastos orçamentários para amortecer o golpe de uma recessão global

Moedas globais: aumento da dívida poderá custar à Alemanha e aos Estados Unidos sua classificação de crédito triplo A (Dado Ruvic/Reuters)

Moedas globais: aumento da dívida poderá custar à Alemanha e aos Estados Unidos sua classificação de crédito triplo A (Dado Ruvic/Reuters)

R

Reuters

Publicado em 14 de maio de 2020 às 14h31.

Doses imensas de gastos com estímulos estão oferecendo alívio em meio aos danos causados ​​pelo coronavírus, mas seu legado de enormes dívidas pode gerar crises futuras, prejudicando o crescimento econômico e piorando a pobreza, especialmente nos países em desenvolvimento.

Bancos centrais e governos do mundo inteiro liberaram pelo menos 15 trilhões de dólares em estímulos por meio de compras de títulos e gastos orçamentários para amortecer o golpe de uma recessão global que provavelmente será a pior desde a década de 1930.

Mas as medidas vão levar a ainda mais dívidas nos países que já lutam com as consequências da crise financeira de 2008 e 2009 -- a dívida global total aumentou em 87 trilhões de dólares desde 2007, e os governos, com 70 trilhões, foram responsáveis ​​pela maior parte desse aumento, segundo estimativas do Instituto de Finanças Internacionais (IIF).

Somente este ano, a relação entre a dívida global e o PIB pode subir 20 pontos percentuais, para 342%, disse o grupo, com base em contração econômica de 3% e uma duplicação nos empréstimos pedidos pelos governo a partir de 2019.

Assumir esse tipo de dívida e sair impune é impossível: o maior prejuízo acontecerá em países altamente endividados, sejam os relativamente ricos, como a Itália, ou aqueles como a Zâmbia, que já estavam sob tensão antes do vírus e agora estão tropeçando em direção a um default.

Mas nem mesmo os mais ricos serão poupados. O aumento da dívida poderá custar à Alemanha e aos Estados Unidos sua classificação de crédito triplo A, enquanto os governos dependerão cada vez mais dos bancos centrais para controlar os custos dos empréstimos ou até mesmo financiar diretamente os gastos nos próximos anos.

"Historicamente, sempre que os países aumentam os níveis de dívida, as coisas mudam", disse Mike Kelly, chefe global de multi-ativos da PineBridge Investments. "Esta crise ... nos levou de volta à armadilha de crescimento lento que começamos a superar em 2016-2019."

O desafio para as autoridades nos próximos anos será encontrar uma maneira de "crescer nessa estrutura maciça de dívida/PIB em que nos encontramos quase da noite para o dia", previu ele.

Por enquanto, com a economia mundial encarando uma contração de 5% a 6% este ano, os empréstimos e gastos adicionais são uma salvação de emergência. O Fundo Monetário Internacional estima que os déficits públicos como uma porcentagem da renda nacional saltarão para quase 10% este ano, ante pouco menos de 4% em 2019.

Até a Alemanha, a potência europeia, está assumindo novas dívidas pela primeira vez desde 2013, enquanto os empréstimos do segundo trimestre do Tesouro dos EUA chegarão a quase 3 trilhões de dólares -- mais de cinco vezes seu recorde anterior.

Juros

Eventualmente, porém, a dívida pode atrapalhar o crescimento econômico se os países começarem a gastar cada vez mais sua renda anual com credores pagadores, uma posição que os países em desenvolvimento têm enfrentado repetidamente.

Taxas de juros baixas permitirão que alguns países convivam com dívidas mais altas. A dívida do Japão, por exemplo, excede 200% do PIB, mas o país imprime dinheiro para emitir dívida que o banco central depois compra.

"A capacidade de controlar as taxas de juros e manter os juros baixos é um parâmetro essencial para manter baixos os custos do serviço da dívida, e esperamos que isso continue", disse Eric Brard, chefe de renda fixa da Amundi.

A tendência também ganhará ritmo nos Estados Unidos e na Europa, com os bancos centrais absorvendo grande parte do excesso de dívida.

Mas, em alguns países, o crescimento médio do PIB avança bastante abaixo das taxas de juros há anos, o que significa que os índices de dívida estavam saltando incansavelmente mesmo antes do golpe do coronavírus.

Os bancos centrais de cerca de uma dúzia de economias emergentes iniciaram programas de flexibilização quantitativa. No entanto, sem grandes reservas de poupança doméstica, a maioria depende de investidores estrangeiros para cobrir déficits da balança de pagamentos e sustentar suas moedas.

Isso, junto com os riscos inflacionários, restringe quanto dinheiro eles podem imprimir para apoiar o crescimento. Os programas de compra de títulos no Brasil ou na África do Sul podem fazer as taxas de juros reais no final da curva de juros subirem acentuadamente, disse Manik Narain, chefe de estratégia de países emergentes do UBS.

O BofA calcula que a dívida pública pode atingir 77,2% do PIB até o final do ano no Brasil e 64,9% na África do Sul. Há uma década, esses níveis estava em torno de 61% e 35%, respectivamente, mostraram dados do FMI.

Acompanhe tudo sobre:CoronavírusDívidas de paísesRecessão

Mais de Economia

China e Brasil: Destaques da cooperação econômica que transformam mercados

'Não vamos destruir valor, vamos manter o foco em petróleo e gás', diz presidente da Petrobras

Governo estima R$ 820 milhões de investimentos em energia para áreas isoladas no Norte

Desemprego cai para 6,4% no 3º tri, menor taxa desde 2012, com queda em seis estados