Brasil ainda patina em inovação e adoção de novas tecnologias (Germano Lüders/EXAME.com)
João Pedro Caleiro
Publicado em 4 de setembro de 2014 às 14h38.
São Paulo - Em competitividade, não é preciso apenas melhorar - e sim melhorar mais do que os outros. Se o mundo avança rapidamente, correr atrás do prejuízo não é suficiente.
É o efeito da rainha de Copas, de "Alice no País das Maravilhas", que precisa correr o tempo inteiro apenas para impedir que as cartas caiam sobre sua cabeça, segundo Hérica Righi, professora da Fundação Dom Cabral.
Ela foi uma das organizadoras dos dados do Brasil usados pelo ranking de competividade do Fórum Econômico Mundial, divulgado nesta semana.
O cenário para o Brasil é desanimador. O país chegou ao 48º lugar no ranking em 2011, mas caiu 8 posições em 2012 e mais uma no ranking deste ano, que usa dados de 2013.
Isso não significa que o país ficou efetivamente pior, e sim que outros países estão saindo na frente, o que aumenta o pessimismo local em um círculo vicioso.
O levantamento usa 100 indicadores, alguns objetivos e outros de percepção, obtidos por questionários com empresários locais e estrangeiros que atuam no país. Veja a situação do Brasil em cada um dos 12 pilares avaliados pelos últimos seis anos:
1. Melhorou recentemente: Educação Superior e Treinamento
Ano | Nota | No ranking |
---|---|---|
2008 | 4,1 | 58º |
2009 | 4,3 | 58º |
2010 | 4,4 | 57º |
2011 | 4,3 | 66º |
2012 | 4,2 | 72º |
2013 | 4,9 | 41º |
Para Hérica, essa melhora é resultado de melhora na qualidade, escolas de negócios mais responsivas às necessidades do mercado, crescimento da pós-graduação e programas governamentais de apoio e expansão do ensino superior como o ProUni e o Fies (Fundo de Financiamento Estudantil).
Ano | Nota | No ranking |
---|---|---|
2008 | 5,2 | 79º |
2009 | 5,5 | 87º |
2010 | 5,4 | 87º |
2011 | 5,4 | 88º |
2012 | 5,4 | 89º |
2013 | 5,7 | 77º |
A alta na expectativa de vida e a queda na mortalidade infantil e na malária ajudaram a puxar para cima a nota e a posição brasileira neste ranking, especialmente de um ano para cá, mas houve piora recente em itens como a prevalência de HIV na população.
3. Melhorou a nota, mas piorou no ranking:
- Infraestrutura
Ano | Nota | No ranking |
---|---|---|
2008 | 3,5 | 74º |
2009 | 4 | 62º |
2010 | 4 | 64º |
2011 | 4 | 70º |
2012 | 4 | 71º |
2013 | 4 | 76º |
Na infraestrutura, houve algumas (poucas) melhoras pontuais, mas o avanço maior de outros países fez o Brasil ficar mais para trás. A nota para qualidade das estradas e da infraestrutura portuária e aérea, por exemplo, estacionou de 4 anos para cá, enquanto países como a China subiram pelo menos uma posição por ano no ranking em cada um desses itens.
- Prontidão Tecnológica
Ano | Nota | No ranking |
---|---|---|
2008 | 4,1 | 46º |
2009 | 3,9 | 54º |
2010 | 4 | 54º |
2011 | 4,4 | 48º |
2012 | 4,1 | 55º |
2013 | 4,2 | 58º |
A mesma coisa aconteceu na prontidão tecnológica. A porcentagem de usuários de internet, por exemplo, foi de 40% a 51% em 4 anos, mas o país caiu de 61º para 64º no ranking geral. Enquanto isso, houve uma queda forte desde 2008 em itens como disponibilidade das últimas tecnologias (de 49º para 77º no ranking) e absorção da tecnologia pelas firmas (de 36º para 59º).
4. Ficou mais ou menos na mesma: Tamanho de Mercado
Ano | Nota | No ranking |
---|---|---|
2008 | 5,6 | 10º |
2009 | 5,6 | 10º |
2010 | 5,6 | 10º |
2011 | 5,6 | 9º |
2012 | 5,7 | 9º |
2013 | 5,7 | 9º |
5. Chegou a melhorar, mas já piorou de novo:
- Instituições
Ano | Nota | No ranking |
---|---|---|
2008 | 3,5 | 93º |
2009 | 3,6 | 93º |
2010 | 3,7 | 77º |
2011 | 3,8 | 79º |
2012 | 3,7 | 80º |
2013 | 3,5 | 94º |
Na percepção de itens como ética no comportamento das empresas e defesa da propriedade intelectual, melhoras foram revertidas. Quedas importantes foram registradas na percepção do desvio de recursos públicos (de 121º a 135º) e transparência do processo decisório (de 96º para 128º). A confiança na polícia despencou de 64º para 83º no ranking só de 2012 para 2013.
Isso não significa que tudo piorou de um dia para o outro: "esses indicadores são os mais embasados na percepção, e como a pesquisa foi feita entre maio e julho de 2013, pegou esse clima de pessimismo. Além disso, a proximidade das eleições sempre deixa o cenário um pouco mais tenso e incerto", diz Hérica.
Ela nota que apesar disso, também não dá para ignorar este clima como mero mau humor, já que ele ajuda a determinar as decisões de investimento que são tomadas por estes executivos.
- Desenvolvimento Financeiro
Ano | Nota | No ranking |
---|---|---|
2008 | 4,5 | 51º |
2009 | 4,4 | 50º |
2010 | 4,5 | 43º |
2011 | 4,4 | 46º |
2012 | 4,4 | 50º |
2013 | 4,3 | 53º |
O desenvolvimento do setor financeiro é um dos poucos no qual o Brasil se sai relativamente bem em alguns itens: em "robustez dos bancos", somos o 13º lugar mundial. Nos últimos anos, no entanto, os empresários reportam queda na facilidade de acesso aos empréstimos e na disponibilidade de serviços financeiros, mas com melhora nos custos.
6. Piorou recentemente, mas nem tanto: Ambiente Macroeconômico
Ano | Nota | No ranking |
---|---|---|
2008 | 3,9 | 109º |
2009 | 4 | 111º |
2010 | 4,2 | 115º |
2011 | 4,7 | 62º |
2012 | 4,6 | 75º |
2013 | 4,5 | 85º |
Em 2010, o Brasil registrou seu maior crescimento em muito tempo enquanto o mundo ainda sofria os piores efeitos da crise financeira. Desde então, o cenário se reverteu, o que impactou as contas do governo e deixou ainda mais exposta a falta de competividade da economia brasileira. "Esse número é um reflexo de todos os outros, é mais consequência do que causa", diz Hérica.
7. Piorou recentemente:
- Inovação
Ano | Nota | No ranking |
---|---|---|
2008 | 3,5 | 43º |
2009 | 3,5 | 42º |
2010 | 3,5 | 44º |
2011 | 3,4 | 49º |
2012 | 3,4 | 55º |
2013 | 3,3 | 62º |
O Brasil teve uma queda brutal na disponibilidade de cientistas e engenheiros (de 60º para 114º no ranking em 6 anos) e quedas menores em temas como capacidade de inovação (28º para 44º) e gastos das empresas em pesquisa e desenvolvimento (29º para 43º).
"O empresariado ainda não acordou para a importância de investir em pesquisa e desenvolvimento, tentam correr atrás do que os outros fazem e não trazer coisas novas pro mercado. Optamos por ser seguidores, não líderes - e à medida que passam os anos, a defasagem aumenta, ainda mais agora que o conhecimento evolui cada vez mais rapidamente", diz Hérica.
- Sofisticação de Negócios
Ano | Nota | No ranking |
---|---|---|
2008 | 4,6 | 32º |
2009 | 4,5 | 31º |
2010 | 4,5 | 31º |
2011 | 4,5 | 33º |
2012 | 4,4 | 39º |
2013 | 4,3 | 47º |
Em sofisticação de negócios, chama atenção a queda na nota de uso de vantagens comparativas: "O Brasil é um dos países com mais recursos no mundo, mas a gente não os aproveita porque temos uma inserção pouco agressiva no mercado internacional", diz Hérica.
- Eficiência do mercado de bens
Ano | Nota | No ranking |
---|---|---|
2008 | 3,9 | 99º |
2009 | 3,7 | 114º |
2010 | 3,8 | 113º |
2011 | 3,9 | 104º |
2012 | 3,8 | 123º |
2013 | 3,8 | 123º |
O Brasil está entre os últimos lugares mundiais em quantidade de dias e procedimentos para abrir um negócio e o fardo de alfândega.
- Eficiência do Mercado de Trabalho
Ano | Nota | No ranking |
---|---|---|
2008 | 4,3 | 80º |
2009 | 4,1 | 96º |
2010 | 4,2 | 83º |
2011 | 4,4 | 69º |
2012 | 4,1 | 92º |
2013 | 3,8 | 109º |
No mercado de trabalho, houve uma piora forte na relação entre pagamento e produtividade, que está estacionada no país - um dos grandes temas em debate no momento. Como o índice mede a flexibilidade e não a robustez do emprego, o desemprego baixo pode ter um efeito negativo sobre a nota por deixar o mercado naturalmente mais rígido.
"Além disso, o Brasil deixou de ser tão interessante assim em relação a outros países, o que diminui a capacidade de atrair e reter talentos. A geração que está aí é nova e tem outra maneira de transitar nesse mercado, mas a legislação não mudou e não flexibilizou algumas questões, como ocorreu em outros lugares", diz Hérica.