Economia

Como os bancos centrais reagiram ao voto da Brexit

Na falta de espaço para cortar juros, bancos prometem liquidez em reação ao choque global causado pela decisão do Reino Unido de sair da União Europeia


	Nota de libra: moeda atingiu seu menor nível em mais de 3 décadas
 (Ben Stansall/AFP)

Nota de libra: moeda atingiu seu menor nível em mais de 3 décadas (Ben Stansall/AFP)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 24 de junho de 2016 às 18h31.

São Paulo - O voto do Reino Unido para sair da União Europeia é um golpe na economia e um choque para os mercados mundiais em um momento onde há pouco margem para absorvê-los.

O crescimento global previsto pelo Banco Mundial para 2016 é de apenas 2,4% e as taxas de juros são as mais baixas dos últimos 5 mil anos.

"A economia mundial está muito mais frágil do que o normal por causa de inabilidade quase em toda parte de reduzir substancialmente as taxas de juros. Normalmente, em resposta a quedas incipientes, os bancos centrais cortam 400 pontos-base ou mais. Hoje eles não têm esse tipo de espaço em nenhum lugar", diz o blog de Lawrence Summers, ex-secretário do Tesouro americano e ex-presidente de Harvard.

A Brexit fez o ouro avançar 4% e a libra atingir uma mínima de 31 anos; a expectativa é que os juros atualmente em 0,5% possam ir a zero.

O presidente do banco central britânico, Mark Carney, afirmou hoje que está pronto para fornecer 250 bilhões de libras em fundos adicionais para sustentar os mercados financeiros e que o banco vai avaliar se adotará respostas adicionais.

O Banco Central Europeu também garantiu que vai fornecer liquidez. Há alguns dias, a Reuters citou um oficial do banco: "haverá um comunicado afirmando que será feito o que for necessário para manter liquidez no mercado".

O uso da expressão "o que for necessário" ("whatever it takes") não parece acidental. Foi com exatamente essas palavras que o presidente do BCE, Mario Draghi, conseguiu conter o pânico do mercado no auge da crise do euro em 2012.

Assim como nos piores momentos do impasse com a Grécia, há um temor de que a incerteza vai fazer com que os investidores se voltem contra os núcleos mais frágeis da economia europeia.

O Ministério da Economia da Itália, por exemplo, se apressou em dizer hoje que o sistema bancário do país "permanece sólido" e que qualquer efeito da Brexit será limitado.

As principais bolsas europeias perderam mais de 960 bilhões de euros (US$ 1,08 trilhão) em valor de mercado no pregão desta sexta-feira. Londres caiu 3,15%, Frankfurt 6,82%, Paris 8,04%, e Milão 12,48%.

O Federal Reserve americano deve estar respirando aliviado por não ter subido os juros na sua última reunião; o risco de Brexit foi um dos fatores considerados na decisão, confirmou na época a presidente Janet Yellen.

O mercado já avalia que as altas de juros foram novamente adiadas, o que tira um pouco da pressão sobre as moedas dos emergentes. 

Hoje, o Fed reafirmou estar preparado para prover liquidez em dólares "através das linhas de swap que já existem com outros bancos centrais, enquanto for necessário" para controlar os mercados evitar que a economia americana seja muito afetada. 

No Japão, a promessa foi de responder conforme necessário aos movimentos cambiais "extremamente nervosos" que podem causar uma força excessiva do iene.

"Eu enfatizaria que esse é quase puramente um choque monetário - em termos reais, faz pouca diferença se o Reino Unido está dentro ou fora da UE, especialmente para lugares como Estados Unidos e Japão. E como é monetário, o efeito final depende INTEIRAMENTE em como os bancos centrais vão reagir. Vão mostrar imaginação e liderança ou vão continuar agindo como fizeram desde 2007? Não teremos que esperar muito por uma resposta. Obviamente, os mercados acreditam que os bancos centrais não vão estar prontos para a ocasião", diz Scott Summer, diretor do Programa de Política Monetária do Centro Mercatus da George Mason University, em seu blog.

Como falta espaço e/ou vontade para os bancos centrais reagirem de forma mais enérgica, os governos podem compensar relaxando um pouco as contas, algo que já era pedido por muita gente mesmo antes da Brexit.

"Essa não é a hora para austeridade. O maior uso da política fiscal deveria estar na agenda em quase todos os lugares", diz Lawrence Summers.

No Brasil, que também deve ser afetado, o chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Tulio Maciel, avaliou que a incerteza aumentou, mas acredita que os impactos são limitados no curto prazo.

O Itaú Unibanco afirma que ainda vê "espaço para flexibilização monetária em 2016, diante do recuo da inflação devido à fraqueza da atividade, dos avanços do lado fiscal e da política monetária global mais expansionista."

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