Economia

Como o petróleo aprendeu a viver com um Oriente Médio em chamas

A súbita alta de preços com morte de general no Irã foi atenuado pelo uso de hedges. Quando a poeira baixou, a queda se acentuou

homem em refinaria de petróleo (Atef Hassan/Reuters)

homem em refinaria de petróleo (Atef Hassan/Reuters)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 15 de janeiro de 2020 às 18h14.

Última atualização em 15 de janeiro de 2020 às 18h44.

Um dramático ataque de drones dos Estados Unidos mata o general mais importante do Irã. Teerã promete retaliar, e os preços do petróleo dão um salto de quase 5%, enquanto traders correm para cobrir o risco de uma guerra no Oriente Médio. Então, a onda de vendas começa.

É um padrão de negociação que seria impensável há uma década, mas que se tornou cada vez mais comum.

A ameaça de conflito pairava sobre o coração do mercado global de petróleo na semana passada, mas as compras motivadas pelo pânico habitual de operadores e consumidores foi rapidamente correspondida por uma onda de empresas de gás de xisto dos EUA, que aproveitaram a oportunidade para fixar os preços da produção futura.

O repentino aumento dos preços foi atenuado e, quando a poeira baixou, a queda se acentuou.

Essas operações, conhecidas como hedge, combinadas com uma forte expansão de estoques de petróleo na Ásia e o aumento das exportações de petróleo dos EUA, são a receita para um mercado capaz de rapidamente evitar cortes de oferta que até recentemente eram considerados cenários de pesadelo.

“Quando os preços disparam em resposta a eventos geopolíticos, produtores tendem a apostar em mais hedges”, disse Ed Morse, chefe global de pesquisa de commodities do Citigroup, em Nova York.

“Quanto mais alto o preço, mais eles fazem hedge”, com isso, explica, qualquer aumento acaba tendo vida curta.

O petróleo WTI, a referência dos EUA, caiu para menos de US$ 60 o barril quando os últimos resquícios de ganhos devido ao impasse do presidente dos EUA, Donald Trump, com o Irã desapareceram.

Isso não refletiu apenas as menores tensões após a retaliação de Teerã pelo assassinato do general Qassem Soleimani não ter causado baixas para os EUA. Também foi uma demonstração de como a revolução do gás de xisto mudou a psicologia do mercado.

No mesmo dia em que os mísseis americanos mataram o líder militar mais importante do Irã perto do aeroporto de Bagdá, a Administração de Informação de Energia dos EUA anunciou exportação líquida recorde de 1,73 milhão de barris por dia.

É uma mudança histórica para um país que, há uma década, era um dos maiores importadores do mundo e transformou a maneira como o mercado responde a uma crise.

O boom do gás de xisto que desencadeou essa mudança foi liderado por uma infinidade de exploradoras independentes menos capazes de absorver o impacto financeiro das oscilações de preços do que gigantes como a Exxon Mobil ou Royal Dutch Shell.

Ao contrário da era dominada pelas grandes petroleiras, hoje qualquer rali do petróleo encontra um vendedor natural, já que empresas menores minimizam seus riscos por meio de hedge.

As cotações do petróleo estão no “ponto ideal” para muitas produtoras norte-americanas, escreveram analistas da RBC Capital Markets, como Michael Tran, em nota.

Muitas delas estavam esperando uma chance de fixar os preços do WTI para 2020 a US$ 60 o barril, um nível que foi atingido após o assassinato de Soleimani.

A Occidental Petroleum, uma das maiores perfuradoras na prolífica Bacia do Permiano no Texas e Novo México, revelou nesta semana que aumentou seu hedge de produção para 2020 de 300 mil para 350 mil barris por dia com a ajuda dos bancos de Wall Street.

“A atividade de hedge tem sido robusta nas últimas semanas”, afirmou a RBC. “Os volumes só vão aumentar porque o rali dos preços coincide com a melhora da liquidez” devido ao fim da temporada de festas.

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