Economia

Como Jim O’Neill vê os Brics 20 após criar termo a países promissores

O ex-secretário do Tesouro do Reino Unido conversou nesta segunda-feira em live com André Esteves, sócio sênior do BTG Pactual

André Esteves e Jim O'Neill, ex-secretário do Tesouro do Reino Unido e criador do termo Brics (Montagem com fotos de Germano Lüders/Exame e Alessia Pierdomenico/Bloomberg/Getty Images)

André Esteves e Jim O'Neill, ex-secretário do Tesouro do Reino Unido e criador do termo Brics (Montagem com fotos de Germano Lüders/Exame e Alessia Pierdomenico/Bloomberg/Getty Images)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 6 de julho de 2020 às 14h35.

Última atualização em 6 de julho de 2020 às 16h18.

Há quase vinte anos, um conjunto de países que chamava a atenção pelo seu potencial de crescimento fez com que o ex-secretário do Tesouro do Reino Unido, Jim O’Neill, na época trabalhando para o Goldman Sachs, criasse o termo Bric (posteriormente Brics, com a entrada da África do Sul), para reunir Brasil, Rússia, Índia e China. A expectativa era que essas potências emergentes formassem com os Estados Unidos as cinco maiores economias do mundo no século XXI.

Hoje, questionado sobre como vê esse grupo, o economista diz que aconteceu basicamente o que era dito: um grande aumento na relevância da China. "O país asiático contribuiu mais para o PIB mundial do que os EUA na última década", disse nesta segunda-feira, 6, em entrevista com André Esteves, sócio sênior do banco de investimentos BTG Pactual (parte do grupo que controla a Exame).

"E em algum momento dos próximos anos, a Índia vai começar a ameaçar a Alemanha como a quarta maior economia do mundo", diz.

Assim como as economias desenvolvidas, as emergentes terão de se recuperar dos impactos sociais e econômicos da pandemia, mas, segundo O’Neill, apesar de terem maior dificuldade, em 20 ou 30 anos, é razoável dizer que o grupo será maior do que o G7: "É mais fácil assumir que, após os impactos da pandemia, não vai haver mais Brics", disse.

Há impasses importantes, porém, para esse avanço, como "os desafios relacionados com a governança global precisarão ser trabalhados", diz O’Neill.

No caso do Brasil, apesar de haver conflitos frequentes envolvendo o presidente Jair Bolsonaro, a impressão de O’Neill é que o país tem mostrado certo foco na criação de uma estrutura mais adequada ao gasto público e que se perseguir nesse caminho de ajuste fiscal após a crise do coronavírus, tem o potencial para crescer 4 ou 5%:

"Mas o Brasil tem que fazer o que precisa para deixar de ser vítima dos preços da commodities. E o país tem capacidade para fazer isso melhor do que a Rússia, que tem uma demografia muito mais difícil", diz.

De uma forma geral, o economista está otimista com as chances de a economia mundial sair da crise mais cedo do que as pessoas acreditam no curto prazo, mas, no longo, o mundo pode ter de lidar com importantes desafios sociais e econômicos:

"Essa ideia de que o governo pode gastar muito dinheiro, comprovada pelo cenário atual e algo que os brasileiros descobriram nos últimos 15 anos que pode não ser uma boa ideia, apesar de ser bem popular, é uma preocupação. Parece almoço grátis, mas certamente não será o caso. E as consequências no longo prazo a gente simplesmente não sabe quais serão", diz.

O’Neill também faz uma reflexão sobre como a economia do dia a dia vai refletir alguns impactos da crise, por ter causado um choque não só de demanda, mas também de oferta. "Recentemente fiz minha primeira refeição em um café depois de quatro meses e percebi que os preços estavam mais altos. Talvez a gente comece a pagar mais pelo mesmo, considerando que agora há custos extras também com as exigências sanitárias, por exemplo", diz.

Nesse ambiente, o papel dos Bancos Centrais também precisa ser melhor discutido, segundo o economista: "Alguns acreditam que a gente pode aproveitar os benefícios dos juntos negativos para sempre. Eu não acho provável que isso aconteça, mas me preocupa", diz.

Apesar das instituições terem tido papel importante no combate à crise, diz ele, a ação delas é limitada, com visão muito estreita e modelos definidos para suas metas e mandatos, "talvez tenha chegado o tempo de substituir as metas de inflação que, antes da pandemia, tinha uma função indireta de evitar desigualdades sociais, evitando que isso afetasse todo o modelo econômico".

O economista diz que, em vários aspectos, o sistema capitalista não consegue lidar com situações de crise como a que vivemos. Um deles é relacionado ao avanço de vacinas e antibióticos: "normalmente as empresas farmacêuticas não estão muito preocupadas com vacina, porque são produtos que precisam ser vendidos a um preço baixo. Em crises, os governos investem muito dinheiro em empresas de vacina para que façam algo", diz.

Uma forma de melhorar essa dinâmica, segundo ele, seria investir em pesquisas antes que as crises aconteçam, tanto no desenvolvimento de vacinas como no de antibióticos. "Se não fizermos algo contra a crescente resistência dos tratamentos a antibióticos e contra seus usos exagerados, tanto na agricultura como por seres humanos, podemos ter em 2050 milhões de pessoas morrendo. Perderíamos 100 trilhões de dólares em produção", alerta.

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