Homens correm perto de grafite representando mulher usando máscara protetora, após o surto de coronavírus. Rio de Janeiro, 8 de junho de 2020. (Sergio Moraes/Reuters)
Ligia Tuon
Publicado em 9 de junho de 2020 às 18h26.
Última atualização em 9 de junho de 2020 às 20h02.
O desemprego tende a subir no mundo todo em razão dos efeitos da pandemia do coronavírus. Parte dessa realidade, porém, pode ser ofuscada nos dados devido a taxas menores de desocupação.
No Brasil, o desemprego que subiu a 12,6% no trimestre encerrado em abril pode estar mais perto da casa dos 16%, segundo cálculo do Itaú que considera constante desde fevereiro a participação no mercado de trabalho.
"Por conta da pandemia, muitas pessoas que perderam o emprego não estão procurando, pois não podem sair de casa. Nesse sentido, a taxa de desemprego ficou muito ruim de ser olhada sozinha, já que não dá a dimesão correta do que está acontecendo", diz Luka Barbosa, economista da instituição.
No Brasil, a taxa de desemprego considera a quantidade de desocupados na força de trabalho. Mas é considerado desempregado apenas o trabalhar que está efetivamente buscando uma vaga. Se ele desiste, não está mais enquadrado na força potencial, o que afeta também a taxa de desemprego.
Em momentos normais da economia, esses movimentos ocorrem o tempo todo sem causar confusões, mas numa situação atípica em que muitos não procuram por não poderem sair de casa, a realidade pode ficar distorcida, uma vez que não transmite o real grau de vulnerabilidade da população.
Para aproximar o dado da realidade, a instituição calculou a taxa de desemprego que seria verificada caso o nível de pessoas que procuravam emprego em fevereiro estivesse constante. E essa métrica bateu 16% em abril, vinda de 11,6% no fim do ano passado.
Em março, quando o distanciamento social começou a ser colocado em prática, a taxa de desemprego chegou até a cair levemente na comparação anual. "Apesar do resultado aparentemente positivo, teria sido consideravelmente pior, caso não tivesse também sido registrada a queda de 0,7 pp na taxa de participação em relação ao mesmo trimestre do ano anterior, a maior já ocorrida no período", disse o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) na ocasião.
"Olhar para os postos excluídos pode ser mais efetivo também", diz Barbosa. De fevereiro a abril, a taxa de participação no mercado de trabalho brasileiro caiu de 94 milhões para 89,8 milhões, ou seja, foram mais de 4 milhões de empregos destruídos em dois meses.
O cenário do mercado de trabalho brasileiro em abril mostrava 12,8 milhões de desempregados, 5 milhões de desalentados (desistiram de procurar), 4,7 milhões de subutilizados (pessoal que procurou, mas por algum motivo não pôde aceitar a vaga), 6,1 milhões de subocupados (que trabalham menos de 40 horas por semana, mas gostariam de trabalhar mais) e cerca de 37 milhões de informais.
Vale ressaltar que o nível de informalidade mostrou uma queda, de fevereiro para abril, de mais de 3 milhões de pessoas. No entanto, isso não significa uma migração para a formalidade, como em outros momentos recentes.
"Isso chegou a gerar um pouco de problema ao longo de 2018, quando tínhamos aumento fraco da população ocupada, mas, ao mesmo tempo, a taxa de desemprego caía", diz Daniel Duque, pesquisador da área de economia aplicada do FGV Ibre.
"Na época, esse fenômeno foi levado por um aumento dos desalentados, mascarando um pouco a situação do mercado de trabalho pontualmente, o que não chegou a ser um problema, era só um fenômeno do mercado que produzia uma estatística um pouco diferente do que imaginávamos", diz.
A boa notícia, segundo Luka, do Itaú, é que o cenário conflitante tende a se normalizar com rapidez após o fim das políticas de isolamento social. "À medida que a economia dos estados forem reabrindo, basta que muitos comecem a procurar para que os dados de desemprego voltem a fazer mais sentido."
Dentro destes 4 milhões de postos eliminados estão muito mais empregos informais do que formais, o que, segundo o economista. Eles podem ser impactados só de o trabalhador sair de casa para vender uma água de coco na praia ou dirigir um carro para alguém, por exemplo.
"Também não achamos que, no momento da reabertura da economia, o desemprego vá dar um salto muito grande, porque, a exemplo desses casos, muita gente que começará a procurar vai achar", diz.
O Itaú espera que o país chegue ao fim deste ano com uma taxa de desemprego de 14%. Já o Ibre é mais pessimista, com previsão de desemprego chegando a 18,7% e queda de 3% na força de trabalho.
A aparente desorientação dos dados sobre mercado de trabalho não acontece somente no Brasil. Os Estados Unidos surpreenderam no fim da semana passada pela redução acentuada na taxa de desemprego de abril para maio, de 14,7% para 13,3%. As expectativas do mercado apontavam para o lado totalmente oposto: 20%.
O Bureau of Labor Statistics (BLS), órgão responsável pela divulgação, chegou a dizer que a taxa de desemprego poderia ser cerca de 3 pontos percentuais acima do divulgado por uma questão de classificação e que iria investigar o assunto.