Economia

Com surpresas negativas sobre o 4º tri, PIB de 2019 reforça retomada lenta

Apesar de o número não ter surpreendido, a leitura dos dados que compõem o PIB mostrou uma realidade pior do que a esperada em alguns setores

Infraestrutura: (Paulo Hoeper/Getty Images)

Infraestrutura: (Paulo Hoeper/Getty Images)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 4 de março de 2020 às 12h41.

Última atualização em 4 de março de 2020 às 17h18.

ibSão Paulo - O crescimento da economia brasileira desacelerou para 0,5% no quarto trimestre de 2019 ante alta de 0,6% registrada de julho a setembro, informou nesta quarta-feira (04) o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Com isso, o crescimento fechado no ano de 2019 ficou em 1,1%, abaixo do resultado do ano anterior, que foi de 1,3%. Isso levou o Produto Interno Bruto (PIB) a um total de R$ 7,2 trilhões.

O resultado veio em linha com as expectativas de economistas e reforça a retomada ainda modesta da economia, após as quedas fortes do PIB de 3,5% em 2015 e 3,3% em 2016.

“São três anos de resultados positivos, mas o PIB ainda não anulou a queda de 2015 e 2016 e está no mesmo patamar do terceiro trimestre de 2013”, diz Rebeca Palis, coordenadora das Contas Nacionais do IBGE, em nota.

Apesar de o número não ter surpreendido, a leitura dos dados que compõem o PIB mostrou uma realidade pior do que a esperada em alguns setores.

Decepções

A surpresa maior ficou em função da formação bruta de capital fixo (FBCF), ligada à taxa de investimento na economia. A FBCF caiu 3,3% de um trimestre para o outro. Em relação ao quarto trimestre de 2018, o número caiu 0,4%.

"Após surpreender positivamente no 2º e no 3º trimestres, quando subiu 2,6% e 1,3% respectivamente, a Formação Bruta praticamente devolveu todo o resultado, caindo 3,3% no 4º trimestre. Não fosse o crescimento dos gastos do governo em 0,4% e do setor externo em expansão teríamos um péssimo resultado", diz André Perfeito, economista-chefe da Necton.

O movimento teve forte ligação com o desempenho da construção civil, que, embora tenha tido alta de 1,6% no ano, recuou 2,5% de outubro a dezembro em comparação com o terceiro trimestre. Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV, lembra que o PIB da construção civil imobiliária representa quase a metade do investimento no país.

"A queda da construção civil na margem para mim não faz muito sentido, dado que todos os indicadores do setor mostravam crescimento mais forte", diz Matos.

Lucas Nobrega, economista do Banco Santander, lembra que o indicador que mede o ritmo do investimento no país é muito volátil, mas ainda assim o resultado acende um sinal de alerta.

"A construção vinha apresentando dados positivos. Foi uma surpresa esse dado negativo no trimestre, pois esperavámos manutenção de crescimento", diz. Para Nobrega, o dado pode ter relação com o desempenho de infraestrutura, que ainda avança de forma muito lenta, sobretudo pela falta de capacidade do governo federal de investir. "O programa de concessões e privatizações ainda corre num ritmo modesto", diz.

O Santander conta com a possibilidade de esse dado negativo da construção ser revertido neste ano. "Começa o ano lento, mas vai ganhando corpo ao longo de 2020 e deve ganhar velocidade em 2021", diz Nobrega.

Indústria não se recupera

A fraqueza da indústria, sobretudo a de transformação, no quarto trimestre mostra que o setor não recuperou suas perdas do período anterior.

O setor avançou 1,5% no quarto trimestre ante o mesmo período de 2018, puxado pelas indústrias extrativas (3,4%) que registraram aumento da extração de petróleo e gás natural, segundo o IBGE. Em relação ao terceiro trimestre, o avanço foi de 0,2%. No caso da indústria de transformação, houve estabilidade no ano.

"A indústria de transformação sofreu muito no ano passado com os impactos da crise econômica na Argentina", diz Matos. Segundo a economista, o "custo Argentina" tirou cerca de 0,5 ponto percentual do PIB de 2019. "E deve continuar atrapalhando neste ano junto ao momento de estresse no cenário externo por conta do avanço do surto de coronavírus no mundo", diz.

Nesse contexto, a indústria não tem só dificuldade para exportar, mas também para importar. "Alguns segmentos já estão sofrendo no curto prazo para importar peças, é meio um choque de oferta na produção. Deve continuar sendo um problema no início desse ano. Não sabemos até quando vai durar", diz Matos.

Resilientes

Resiliente neste cenário é o setor de serviços, que segue mostrando crescimento gradual graças, principalmente, ao consumo das famílias. Serviços foram de um crescimento de 0,3% no primeiro e no segundo trimestre de 2019 para 0,5% no terceiro e, agora, para 0,6% na margem.

Na comparação anual, o setor subiu 1,6%, com destaque para a expansão da atividade de informação e comunicação (4,6%) e atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados (3,0%). Na margem, o setor registrou alta de 0,6%.

O consumo das famílias cresceu 2,1% no ano e 0,5% no trimestre ante o período imediatamente anterior.

"Esperávamos um consumo melhor no quarto trimestre, mas o pico de inflação do fim do ano pode ter afetado um pouco o comportamento dos consumidores, porque indicadores mostravam que poderia subir mais", diz Matos, do Ibre. Para a economista, no entanto, o consumo vai continuar liderando o crescimento brasileiro neste ano.

Para Nobrega, do Santander, o Brasil segue na trajetória de recuperação cíclica e deve avançar mais em 2020 do que avançou no ano passado. "A menos que o coronavírus ganhe uma magnitude muito maior ou que aconteça outro fator imprevisto", diz.

Apesar disso, o economista diz que o crescimento do ano será menor do que o previsto hoje. O banco vê alta de 2% no PIB de 2020, mas diz que poderá rever esse número para baixo na próxima semana, "O ritmo de crescimento deve estar mais perto de 1,7%", diz.

 

 

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